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"Este espectáculo tem luzes estroboscópicas"

Um aviso actualmente tão comum e que continua a meter-me medo. Não pelas luzes de discoteca na potencial solidão do escuro do teatro (ao público de teatro ainda se garante quase sempre esse pequeno momento a sós com um espectáculo, como se tudo aquilo fosse apenas para nós sentirmos, pensarmos. É só nosso aquele momento sem smartphones e whatsapps e com gente viva à nossa frente. Espera-se.)

Mete-me medo por tantas vezes as luzes estroboscópicas servirem para camuflar a falta de ideias.

Adiante, entremos.

Mal o aviso para desligar os telemóveis desaparece, já Albano Jerónimo entra com ar poético de performance profunda, agarra-se a um microfone e começa a dizer texto em tons e métrica estranha. Um jovem burguês entediado apresenta-se e tudo o que parece segurá-lo à vida é um amor inconfessável. Tudo o resto parece ser-lhe indiferente, desde a celebração do seu 25º aniversário, à idolatria que lhe tem Ida, às marchas dos comunistas pela paz. Só aquela obsessão parece salvá-lo da entropia.

A encenação de John Romão parece sustentar-se em momentos muito visuais que, por vezes, se sobrepõem ao texto ou não têm com ele ligação directa. Lembro-me imediatamente da cena em que os pais de Julian aparecem apenas para comer uma banana em conjunto e criando todo um ambiente de deboche que pode provocar-nos algum choque ou estranheza, uma aversão àquela realidade que, por contraposição à "anormalidade" de Julian, é aceite como natural. Toda a cena de Espinosa ou a grande cena confessional com as tais luzes estroboscópicas vivem também muito da imagética desviando a atenção do texto algumas vezes. O mesmo se passa na cena abstracta da projecção.

As interpretações parecem ser, na sua maioria, muito modelares. Como se os actores estivessem a querer passar a mensagem sem no entanto se fundirem com ela. Há sempre alguma distância, como se eles próprios estivessem ainda a experimentar o de fora para dentro ou a deixar propositadamente algum espaço em relação ao que estão a fazer. Não parecem, aqui na plateia fila M, emoções, mas sim a mostra da ideia de emoção. Faço-me entender? É como se alguém que não está a sofrer quisesse explicar-nos o que isso é.

O texto de Pasolini é arrepiante apesar de, ou antes, sobretudo pela sua simplicidade. É um texto sobre a natureza humana, o vício privado, o desejo insuportável. E é também uma peça política sobre o vício público disfarçado de uma data de outras coisas.

Pocilga de John Romão é um espectáculo visualmente muito interessante, com algumas cenas muito cinematográficas, uma saída possível para a palavra crua e incisiva de Pasolini.

Não nos esqueçamos que falamos da história de um rapaz que tem relações sexuais com porcos e que entrega o seu corpo irremediavelmente a essa paixão.

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