BOA-VIDA

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Para Quem Gosta de Artes e Conforto

Há muita energia conjugada na história do edifício que alberga The Artist, um novo hotel de charme no Porto. Situado na Rua da Firmeza, fica a dois passos da agitação da Baixa mas suficientemente recuado para não ouvirmos os martelinhos nem em noite de São João.

Já foi fábrica de chapéus e escola de artes decorativas. Inaugurado há um ano, é hoje uma elegante unidade hoteleira contemporânea, com uma decoração cosmopolita mas confortável, que tira partido da memória e da robustez do edifício original. As áreas dos quartos são ultra generosas, herdeiros das antigas salas de aula da escola industrial e artística Soares dos Reis. No Porto não há quem não guarde boas lembranças da Soares dos Reis e da qualidade dos seus artistas, técnicos e professores.

A reabilitação arquitectónica que fez nascer The Artist presta um tributo honesto à memória da escola que desde os anos 50 formou a elite artística e operária especializada portuense: os pintores e escultores que depois seguiam para Belas Artes, mas também os tipógrafos, caligrafistas, ceramistas, vidreiros, gravadores, desenhadores e designers de mobiliário que iam trabalhar para as fábricas da cidade, então em franco desenvolvimento industrial.

Não só as paredes marmóreas da entrada guardam algumas das pautas com as avaliações dos antigos alunos, como os espaços comuns, quartos e corredores estão pejados de obras de arte, recolhidas no espólio da escola. E a primeira impressão é de espanto: como é que “miúdos” que iam frequentar o equivalente hoje ao ensino secundário eram tão bons artistas?

O espaço do “bistrô”, onde são servidos os pequenos almoços e demais refeições, está impregnado dessa magia e bem estar que só a contemplação das obras de arte pode provocar no espírito dos seres humanos: os azuis aveludados e verdes suaves das paredes conjugam-se na perfeição com a alvura dos atoalhados e com a opulência das dezenas de trabalhos expostos, entre quadros, fotografias, baixo-relevos em alvenaria e madeira. Imaginamos um salão burguês parisiense do século XIX, e quase ficamos à espera que entrem os senhores de chapéu alto e as senhoras de vestido armado em seda que vinham às galerias comprar arte para embelezar as suas casas. Neste caso, porém, não são só os olhos que comem. O estômago também sai confortado. O pequeno almoço tem tudo o que é preciso: pães fresquíssimos, uns mimos doces que o chefe prepara todos os dias de forma diferente (a nós saíram-nos uns deliciosos queques de pêra canelados), fruta e sumos naturais. E tudo o que pedimos de mais personalizado vem com estilo: os ovos mexidos com um cebolinho irreverente, a omeleta numa forma original e na macieza certa. Ao almoço, o hotel quer abrir-se à cidade e oferece um menu composto por sopa, prato principal (peixe, carne ou vegetariano), bebida e café pelo preço muito justo de 10 euros e ainda com um suplemento de sobremesa por 2,50 euros. Ao jantar chegam as surpresas: há uma experiência de degustação de 5, 7 ou 9 sabores (com preços entre os 20 e os 30 euros, sem bebida). Vale a pena confiar no chefe, porque só podemos dizer o que não gostamos ou não podemos comer. Há um bar interior, onde apetece ficar a ler ou a convesar, porque a conjugação de cadeirões, sofás e iluminação quente criou um ambiente intimista muito “lá de casa”.

A esplanada aproveita o empedrado da entrada e é refrescada por uns toldos esvoaçantes que, conjugados com o mobiliário de exterior em vermelho e cinza claro, convidam a uma pausa e a uma bebida. O hotel orgulha-se da sua variada lista de cocktails e granizados, com e sem álcool. Os altos portões de ferro que conduzem ao interior são os originais do edifício anterior mas a impressão de alguma solenidade conventual que isso possa causar desfaz-se com os sorrisos dos alunos da Escola de Hotelaria e Turismo do Porto, que funciona paredes meias com o hotel e fornece uma reserva regular de hospitaleiros estagiários. A parceria com a escola de hotelaria contribui para a criatividade e juventude à solta: experimente, peça um desejo (de bebida ou comida) e verá como eles conseguem realizá-lo.

Não há grandes vistas dos quartos, a não ser o que se espera de uma localização histórica no Porto: telhados ocres e paredes de prédios revestidas a azulejos lisos, árvores abandonadas em velhos pátios, famílias alegres em passeio e muitos, muitos turistas com mapa na mão. O ambiente de museu retira-se um pouco nos quartos, que apenas guardam alguns posters e peças em cerâmica. O importante, aqui, é assegurar o conforto do sono. Camas grandes, lençóis e toalhas impecáveis e uma banheira larga para quem quiser afogar as dores das caminhadas na cidade num banho de imersão perfumado com os produtos de limpeza oferecidos pelo hotel.

Com três janelões em frente por onde entravam as estrelas do Porto, adormecemos a pensar que este The Artist é um poiso muito recomendável: distinto, quase sóbrio e tradicional mas, lá no fundo da sua história e das suas antigas pedras, a fervilhar de imaginação e talento, como um verdadeiro artista.

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