MÚSICA

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Fotografias: Valentina Ernö.

Há sempre qualquer coisa que quase me impede de ver os God is an Astronaut. Antes foi uma casa na estrada, ontem foi uma suspeita de bomba na ponte 25 de Abril que lançou o caos na cidade. E, ainda assim começou a horas, e eu quase não chegava.

“Commencing countdown, engines on.” Em Lisboa, coube aos Katabatic aquecer o público no Armazém F. E não é nada fácil aquecer gente às 9 horas de uma segunda-feira caótica. O trio tentou provar que “menos é mais” e passar para o ambiente a crueza de um rock instrumental denso e despretencioso, e em troca receberam uma casa cheia e quentinha de honesta atenção.

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Acho que na era da ubiqua internet não é preciso contar a história do post-rock para chegar aos God is an Astronaut. Está tudo lá, a viagem no silêncio e os sons espaciais, a gravidade e as suas ausências, as melodias que se vão trabalhando em velocidades, entre o condicionado asfalto da estrada nacional e a vertigem de warp speed. Percebemos que todo o silêncio do cosmos pode – e deve – ser ocupado com guitarras e baixos, sintetizadores e uma bateria de muitos cavalos-vapor. Os irmãos Kinsella perceberam isso há já alguns anos. Mas há algo mais ali, e ainda são algumas diferenças. E eu não esperava.

“Check ignition and may God's love be with you”. O que eu não sabia, por exemplo, (e só porque desta vez cheguei mesmo, e estava lá) é que ainda se pode fazer headbanging num concerto de post-rock (no início muito discretamente e com graciosidade, que isto é coisa séria e somos malta das IT). Que a transição post humana não foi feita, e que tudo aquilo ainda é e será puro rock. Que ainda há uma espécie de formato-canção que não foi feito para progredir em 20 minutos de 3 andamentos. Em vez disso, há um constante lift-off de um Cape Canaveral irlandês que dura 4 ou 5 minutos e desaparece no escuro, e começa outra vez depois dos aplausos. Um equilibrio de duas horas entre o passado esperado e reconhecivel (e quase cantável) do Fireflies and Empty Skies e o próximo álbum a sair já em Junho, e o próximo regresso a Lisboa. Não há mal nenhum nisso, pelo contrário. Estar num concerto, lá no meio, lá à frente, lá em baixo, é isso. Ver gente sinceramente entregue à música dos dois lados do palco. Ver os músicos a tirarem finalmente o cabelo dos olhos a meio do espectáculo e a olharem para nós ao ponto de nos reconhecerem.

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Percebi então que, debaixo de uma ansia, e ansiedade, de subir ao espaço e transcender as materialidades, ainda existem os astonautas a negociar o caminho e a aventura ligados à base por um precioso fio. São eles que ditam a distância entre o “down here” e o “out there”. São os homens mais ou menos tímidos – uns mais do que outros, como se viu em vários momentos, com guitarrista/teclista Jamie Dean a interagir despudoradamente com o público – a mediar a corrida ao espaço em precárias sintonias de mecânica e sofrimento, para depois voltarem à terra e a deixarem-se tocar com vaidade. Depois de andarem lá em cima a ver as estrelas, a divertirem-se na descida, num jogo orgulhoso entre a imortalidade e a própria vida.

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