Convidamos-vos a ver Way Out – animação concebida por Yukai Du, que padece de um simbolismo vincado que não nos é minimamente estranho.
Nesta curta-metragem com cerca de três minutos, é explorado um universo que parece paralelo mas, não tão subtilmente, funciona como um espelho para a sociedade atual. Confrontamo-nos com seres despersonalizados que não merecem expressão facial e acabamos por nos identificar. Porquê? Porque é um retrato nosso, é a modernidade líquida.
É quase como se vivêssemos num constante estado de hipnose que nos deixa sedentos e com as pupilas dilatadas – enquanto, na verdade, estamos cegos. Yukai explora este estado de abstração em diferentes momentos do dia, onde todas as personagens perdem algo, às vezes óbvio, outras vezes não. Perde-se um comboio, perde-se uma refeição, perde-se crescimento interpessoal.
Os seres, que parecem todos idênticos, têm características aborrecidas: cores escuras, corpos voluptuosos e cabeças miúdas, formatadas. Estão presos a uma fantasia virtual e desconexa que os vai consumir à medida que o ritmo da ação se torna mais agitado musical e visualmente – os dispositivos móveis explodem ícones e conversas com caracteres disfarçados, preparando-se para estilhaçar a vida humana.
Após o desastre, resta um planeta de tecnologias cintilantes que enclausuram os seus outrora utilizadores – irónico, não? – remetendo-nos para a questão: seriam livres em primeiro lugar?
O artista atrás do pequeno filme afirma ter procurado inspiração na Professora Sherry Turkle, autora do livro Alone Together, que aborda as relações contemporâneas e o novo mundo virtual – focando-se no quão insensíveis nos podemos tornar.
Contudo, o debate da alienação social não é de agora. Zygmunt Bauman teorizou acerca da sociedade pós-moderna, caracterizando-a como líquida. Segundo o sociólogo polaco, as alterações sofridas na modernidade (valores, modos de vida) originaram um sentimento geral de fragilidade e efemeridade – proporcionando uma fraqueza identitária. A liquidez jaz, maioritariamente, nas relações. São estas que perdem consistência e põem em causa a noção de alteridade. Existimos tão bem sozinhos, não é? (Não, não é…).
Way Out tem a potencialidade artística e temática de preambular Her – Uma História de Amor, pressagiando um futuro ainda mais longínquo (será?) do que o de Jonze. Apesar de ser metafórica e provavelmente exagerada para alguns, esta curta-metragem é um retrato suficientemente credível do nosso universo tecnológico, onde estar-se conectado tem uma conotação muito pouco humana.