Fotografia: João Bento.
1,25 milhões de denominações de espécies vegetais inventariadas fazem da Lista de Plantas publicada pelo Royal Botanic Gardens conjuntamente com Kew e Missouri Botanical Garden o estudo mais completo nesta área. Trabalho minucioso, de tempo longo e de máxima atenção a qualquer detalhe, que permite identificar cada combinação singular, e daí ser catalogada nova espécie. Mesmo partindo da premissa que cada concerto é capaz de convocar as imagens mais díspares em cada espectador, não posso deixar de pensar, que pelo menos mais de uma vez e a mais de uma pessoa, não tenha vindo à memória durante a actuação de Bruno Pernadas, na última sessão do CCBeat, a imagem de David Attenborough ou qualquer outro naturalista menos mediático. Não pela enorme nostalgia face à ausência das plantas que serviram de cenário para apresentação do último trabalho, no Teatro Maria Matos, não que tenha tido alguma conversa com o músico sobre se haverá paixão secreta por esta área ou qualquer espécie de plano de reorientação profissional, mas somente pelo facto da capacidade compositiva de Bruno Pernadas ser tão incrivelmente brilhante, no duplo sentido de ser muito acima da média e luminosa. E por acreditar que só um trabalho de meticulosa atenção, de compreensão quase absoluta dos diferentes códigos musicais – do jazz ao folk, do pop ao psicadelismo, da electrónica à experimentação, lhe poder conferir a segurança para cruzar todas essas linguagens, em cada tema e entre os diferentes temas, e tornar cada momento singular, sucessão de momentos irrequietos, sem com isso ser esquizofrénico. A acompanhá-lo oito excelentes músicos, da nova geração, muita estrada e companheiros de mil e uma aventuras, a saber – Afonso Cabral, Margarida Campelo, Francisca Cortesão, Nuno Lucas, João Correia, Diogo Duque, João Capinha e Raimundo Semedo. Seja nas teclas, seja na guitarra, Bruno Pernadas é mais que um simples conductor/maestro. Como se através de vegetação densa atirasse pequenas centelhas e quem o acompanha, não necessitasse mais do que esse ínfimo sinal de luz para identificar a direcção – seja o trio de sopros, que magnífica actuação, seja a Francisca Cortesão na voz, num registo folk sempre esclarecido, seja a Margarida Campelo, nas teclas e voz. Camada sobre camada, a diversidade de sons e combinações num curto espaço de tempo, a utilização de técnicas associadas a um estilo num contexto musical quase completamente díspar, obrigar-nos-iam a exercício de catalogação intenso. Blakea attenboroughi, Nepenthes attenboroughii, Zaglossus attenboroughi são alguns dos exemplos de espécies descobertas pelo cientista britânico. Poderá constituir exagero, se no futuro se identificar o Dó ou Ré Pernadasi, mas não nos enganaremos muito se afirmarmos que How can we be joyful in a world full of knowledge? será dos trabalhos, que no ano dourado da música portuguesa (2014), resistir com maior solidez à passagem do tempo. Nova demonstração científica, ou melhor musical, do virtuosismo do autor já esta quinta-feira, na S. I. Guilherme Cossoul, com Francisco Brito e David Pires.