Nasceu em Angola, viveu em Portugal e o seu universo criativo é muito vasto. Dele fazem parte a música, vídeo, poesia, projectos em que a fotografia se mistura com a performance, ou simplesmente dá voz a pensamentos ou valores. O seu trabalho já esteve exposto na Bienal de Veneza, Trienal de Luanda, Tate Modern e Museu Berardo.
O primeiro poema que musicou chamava-se Abortion: “Cantei-o a dois ou três amigos. Eles disseram que estava fixe, eu acreditei e nunca mais parei”. Lançou recentemente o novo álbum: Se eu Fosse Angolano, numa parceria com o designer gráfico espanhol Vic Pereiró. O álbum reflecte uma Angola actual em movimento e vai apresentá-lo esta quinta-feira, dia 17 no Lux.
Qual é a tua opinião sobre Angola a nível artístico nos dias que correm?
A minha opinião é que como tudo, em Angola é preciso trabalhar, é preciso comunicar, é preciso colaborar e acima de tudo é preciso estabelecer relações consequentes… Mas isso, creio que não era, não é e não será diferente, no tempo e no espaço, em qualquer território… Não sou a melhor das pessoas no que toca a falar dos dias que correm, sobre praticamente nada, inclusive a nível artístico… opiniões são coisas perigosas quando têm a ignorância como única certeza...
Como idealizaste a nível artístico o vídeo My African Mind? Foi uma espécie de site specific para a exposiçãoque fizeste na Tate Modern?
Não… My African Mind nasce de um colectivo que formei com Pere Ortín quando estive uns tempos em Barcelona; os Bofa da Cara. Não nasceu de nenhuma comissão… Queríamos abordar aquela perspectiva, a cultura pop na formação e condicionamento de uma sociedade, e foi o que fizemos… Nada do que faço é idealizado artisticamente, no sentido que não nasce deuma necessidade estética, mas de uma necessidade de utilidade. Utilidade essa que nasce primeiro no satisfazer o propósito de termos à nossa disposição as ferramentas que possuímos, como o nosso sentido de humor por exemplo. Na Tate aproveitei para mostrar uma série de vídeos, onde a novidade foi o formato que utilizei para o fazer.
A tua música tem sido uma referência para grandes críticos. Descreve-me um pouco o teu processo criativo e a tua abordagem a nível musical.
Apresenta- -me esses críticos por favor… (risos) A abordagem é simples. Se não escrevo morro. Não quero morrer já, então escrevo. E se escrevo é bom que seja útil a começar em e para mim...
Fazes vídeo, poesia, performance. Alguma destas áreas te dá um especial prazer, ou preferes a fusão de todas elas?
Estar em cima do palco, actuar dá-me um gozo tremendo… sinto-me poderoso com um microfone nas mãos, ou com uma câmara a apontar para mim quando tenho algo para dividir.
Utilizas vários nomes como: Dzzzz, Gavião, Fly, The Night Fly, Saco, Nasty- o, Cucumber Slice, Zura, Zurara e Dzzzzrura. São heterónimos para as tuas diversas abordagens artísticas?
Não… Eu só tenho uma abordagem. Ser útil. Não sou escravo de quem consome e permite que o meu trabalho exista, mas estou inegavelmente ao serviço dos cidadãos do planeta Terra. Os nomes são o resultado de uma infância e juventude cheia de momentos caricatos e amigos e conhecidos que não passaram despercebidos ao longo do meu caminho.
Fizeste uma tournée pelo reino unido com os Buccimazza, que pelos vistos não correu bem e decidiste seguir o teu caminho a solo. Porquê?
Não correu mal… Foi simplesmente esclarecedor. É como descobrires que a razão pela qual não gostavas de cozido este tempo todo era apenas a presença do repolho na cozedura geral… Tiras o repolho e mais ninguém te afasta do raio do cozido!
Apresentaste vários trabalhos/performances na 1.ª Trienal de Luanda, como foi a recepção por parte do público e o teu relacionamento com Fernando Alvim?
Confesso que não sei ao certo a recepção das pessoas… mas continuei a trabalhar, o que é bom sinal! Eu sei que me respeitam, só não sei bem o que isso quer dizer na relação que querem ter comigo… Fernando Alvim é um dos profissionais mais competentes que conheço, quando não deixa as suas paixões ou angústias pessoais invadirem o seu discurso. Ele foi, e é ainda, alguém que se atreve a não só achar possível uma Angola onde o artista, e a sua arte, contribuam consequentemente para a vida dos seus cidadãos, como vive activamente para isso. Ele tem o meu respeito. O nosso relacionamento é educado. O primeiro pagamento na minha vida por uma obra foi-me dado por ele...
Há algum artista português com quem gostasses de trabalhar?
Sou extremamente ignorante no que toca a artistas de arte contemporâneos em geral. Venho da televisão, não da arte. A minha paixão é a palavra, e meu vício a cultura pop do mundo… A música e a literatura são os meus fios condutores… Mas a minha inspiração vem do desporto e da ciência. Conheço alguns músicos e gostaria de trabalhar com muitos mais. Para mim colaborar com o contrabaixista e amigo Hugo Antunes é sempre um prazer. O João Gomes é um amigo e generoso colaborador, sem esquecer o Ndu e o Biru com quem colaboro em algumas coisas. Gostava de trabalhar com o maestro Vitorino, sou fã dos Clã, uma banda muito competente eu acho; é aquela voz que ama as palavras. Adolfo Luxúria Canibal, New Max, Manel Cruz, Rodrigo Leão, sei lá… Eu acho que Portugal tem coisas tão boas. Falo dos artistas, músicos pena sentir uma falta de esperança e urgência em darem uma surra de luz e força aos seus cidadãos. Não entendo como de forma geral a Europa parece ainda estar tão focada na análise. Não sinto os artistas fora disso. Diz-me por favor que sou eu que sou preguiçoso e não sei para onde olhar!