MÚSICA

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Fotografias António Néu.

Nástio não é identidade, é motivação.

Não é Angola​ nem o mundo, são as pessoas.

Não é a voz dele que se impõe, é todo ele que é poder.

E o que nos traz,  ​não é um confronto, ​ ​é um ​contínuo convite à reflexão​,​ um despertar de consciências.

Empossado de palavras, Nástio revela-se-nos através do questionamento, focando-se no que considera ser relevante. Defende a revolução desde que esta seja possível e consequente​. Aborda ​ temáticas transversais, geracionais, políticas, sociais e, inevitavelmente, ainda que o negue, também pessoais.

Tendo como mote uma Angola contemporânea, em movimento e redefinição, Se Eu Fosse Angolano é muito mais do que um álbum, é um processo em forma de projecto, que explora perspectivas, cenários e reflexões, suas e de uma pluralidade, que aqui ganha dimensão própria, sem fronteiras nem limites.

Foi através do trabalho My African Mind que cruzei o Nástio pela primeira vez, em janeiro de 2013, no âmbito da exposição colectiva de artistas angolanos,​ apresentada no Museu Berardo. Mas foi apenas mais tarde, em julho, no ciclo exibido na cinemateca, Olhares sobre Angola, que voltei a cruzar​-me com o seu trabalho, e desde então, nunca mais o perdi de vista. Como pessoa e como artista. No dia imediatamente após ter assistido a alguns ​dos seus ​vídeos​, escrevi-lhe. Em resposta, recebi um link com o S.E.F.A, ainda não editado nessa altura, acompanhado de algumas frases, cada uma delas rematada com mais de trinta e cinco pontos de exclamação e de interrogação!?!?

Todo o ritmo e energia subjacentes a ​cada ​palavra que compõe o universo e o discurso de Nástio Mosquito, está também patente em todas as suas dimensões de comunicação. Seja ela escrita, visual, corporal, falada, cantada. No palco como na vida real, enquanto artista como ser-humano, Nástio é idiossincrático, singular e igual a si mesmo, em qualquer circunstância ou contexto.

Rendi-me de imediato ao S.E.F.A, mas confesso que demorei algum tempo a digerir a densidade das várias camadas que compõem este álbum. Ouvia repetidamente cada uma das músicas, e em todas elas (re)descobria uma nova dimensão de cada possível reflexão; identificava uma nova sonoridade dentro do seu eclético cruzamento de géneros; um novo sentido por cada palavra que então se destacava no contexto da mensagem; e tudo isto, me soava tão familiar, e ao mesmo tempo tão difícil de categorizar.

Nástio quê? Era a pergunta que se colocava na altura quando, vibrantemente, comecei a partilhar o S.E.F.A. com alguns ‘entendidos’. Intrigados e expectantes, a maioria rendeu-se de imediato a este talento, seja ele um poeta, cantor, performer, artista plástico, visual, angolano, português, global, como o preferirem ​denominar​. Recordo precisamente o momento em que lhe perguntei qual a faceta com que mais se identificava. O Nástio da música, dos vídeos, das imagens, das instalações, da performance, da palavra? E a resposta foi: "Tudo isto sou eu. Sem camadas ou percentagens, mas como um todo, indissociável.”

Tudo isto é 100% Nástio. Todas estas dimensões são essenciais e complementares para que o Nástio nos chegue com a totalidade, intensidade e identidade que o define​m​. Um Nástio entregue, de corpo e alma, sem comparações ou legenda para legitimem o que faz, sem pretensões, o mesmo Nástio que nos toca através do que o move e inspira. O Nástio que se apresenta no Walker Art Center em Minnneapolis, na Tate Modern em Londres, no Museu Berardo em Lisboa, na Bienal de São Paulo, em Moscovo, em Tóquio, no Lux, em qualquer parte do mundo, e até na mesa de jantar de casa, será sempre o mesmo Nástio​ – o que nasceu no Huambo em 1981 e ​que assina Dzzzzzzzzzzzzzz.​

O que o Nástio desperta em cada um de nós é muito singular, embora seja a pluralidade que pretende representar através das suas declarações que se fizeram ouvir, com casa cheia, no passado dia 17 de abril no Lux. Imprescindíveis foram os seus companheiros no palco e na vida, Vic Pereiró, João Gomes e A.F.Diaphra.

O repertório esgotou, mas a vontade de 'Mais' fazia-se sentir.

Uma viagem por uma polirritmia de referências, num cruzamento de influências e de sons mais tradicionais aos mais contemporâneos, conjugando a herança da música popular angolana com​o​ semba, kuduro, dub, hip hop, incluindo até o rock. Da familiaridade à inconformidade, da poesia à reflexão, tudo se transcende, todo ele se transcende e nos transcende, através da entoação única que dá às palavras cantadas, as mesmas que ganham vida através da voz grave que as projeta, e tudo isto, em sequência e em consequência, impõe-se a todos os nossos sentidos. ​Mais do que assistir, testemunhamos uma sintonia absoluta entre voz e corpo.

Desde o primeiro momento que sentíamos ​participar de algo diferente, entrar​ numa outra dimensão, a de Nástio Mosquito. E disso era revelador o vídeo de introdução do concerto, palavras cantadas num discurso que ​transpunha limites, entre a e​ provocação, inspiração, declaração e libertação.

Já o chamaram de completo e complexo, mas dúvida não há que Nástio é singular, sem sinónimo, sem fronteira, único quando se conhece, e inteiro quando se dá.

Por mais que veja na identidade uma limitação, a verdade é que, num meio caminho entre a motivação, genialidade, singularidade e aproximação, Se Eu Fosse Angolano, faz-me sentir ainda mais orgulho em ser angolana.

Nástio quê? Nástio Mosquito.

Este ano Nástio irá actuar no Festival Músicas do Mundo, em Sines.

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