Fotografias: Sara Pinheiro e Rui Soares.
Natureza Criativa torna a engrandecer os Açores
Mais de 60 criadores nacionais e estrangeiros em cartaz, intervenções em cerca de 20 espaços localizados em vários concelhos da ilha, quatro residências temáticas, workshops e ARTalks: semanas antes do início do festival Walk&Talk, já era conhecido o número de artistas e projectos quedurante duas semanas, passariam pela ilha de São Miguel com o intuito de contribuir para o crescimento desta região açoriana enquanto palco aberto às múltiplas expressões artísticas contemporâneas.
Antes da abertura oficial do festival, que aconteceu no passado dia 18 de julho, já a dupla João Pedro Vale e Nuno Alexandre Ferreira, Pascal Ferreira e Christos Voutichtis se encontravam na galeria Walk&Talk, garantindo que cada uma das três instalações site-specific estivesse pronta a tempo da inauguração do festival.
À abertura oficial, antecedeu-se o Pre-Opening, com a inauguração da exposição de Julião Sarmento na Galeria Fonseca Macedo, um dos espaços culturais parceiros do Walk&Talk.
Ao aproximar-se da data da abertura oficial, os restantes artistas convidados foram chegando, fazendo da Galeria Walk&Talk a sua segunda casa, onde a vivência entre artistas das mais diversas áreas se torna comum nas duas semanas de festival, onde o ambiente de entreajuda e discussão se torna comum – de facto, a partilha cultural é um dos objectivos do festival, sendo hoje esta a imagem de marca do evento que conta agora com quatro edições.
A abertura oficial ocorreu no passado dia 18 de julho, na Galeria Walk&Talk com a apresentação da exposição colectiva desenho que junta obras dos portugueses Ana Frois, Diogo Mendes Freitas, David Penela, Leonor Morais, Mariana a Miserável e Rosário Pinheiro com a dos espanhóis David de la Mano e Diego Liñares e ainda do brasileiro Douglas Cardoso.
É também na Galeria que estão os projectos especiais: logo à entrada, dando as boas-vidas a quem entra na sede do Walk&Talk, está o Retiro, de autoria de João Pedro Vale e Nuno Alexandre Ferreira que reproduziram o ambiente de festa popular açoriana, sendo o resultado uma escultura habitada que irá acolher algumas actividades do programa do festival, nomeadamente as festas. Neste âmbito, o festival dá particular atenção ao Retiro W&T, um tradicional convívio de música e petiscos, que sob autoria de João Pedro Vale e Nuno Alexandre Ferreira promete levar ao largo de São João (espaço exterior junto à galeria Walk&Talk) o tradicional ambiente de festa micaelense.
Retiro, João Pedro Vale e Nuno Alexandre Ferreira
No primeiro andar, Christos Voutichtis, que trabalha na intersecção entre a arquitectura, o design e a tecnologia, como meio de explorar soluções que transformem positivamente a vida humana, fez por explorar e perceber o ambiente que serviu de espaço à sua instalação: “todos os espaços do mundo têm a sua própria geometria, a sua textura, é isto que procuro, a verdadeira geometria do espaço”.
O grego Christos criou a sua própria aplicação: um programa informático que traduz a linguagem de qualquer espaço em objectos tridimensionais que depois de analisados são reproduzidos. Deste processo, resulta uma escultura de formas cristalinas cujos dados, sita Ponta Delgada, são transmitidos via internet para Alemanha, onde se encontram outras esculturas da mesma natureza, completando assim um organismo experimental que desafia o monopólio criador da natureza.
Ainda, ao atravessar o espaço da exposição colectiva é possível conhecer-se o projeto de Pascal Ferreira: uma espécie de montanha feita com madeira reutilizada, de antigos telhados e não só. “A montanha é o meu elemento de eleição, a minha figura actualmente”, explica, “isto porque estou a contar e a ilustrar um conto infantil: a história do Homem Montanha e da Menina dos Lápis de Cera”.
Enquanto método, o artista luso-francês explica que o seu trabalho é uma espécie de terapia, um jogo que faz consigo mesmo ao contornar as condicionantes do espaço. Neste caso, o desnível à entrada da sala e a janela à direita de quem entra permitiram a construção de uma espécie de “corredor” para o exterior, em direcção à luz. “No fundo, isto é uma montanha, visto de fora tem esta silhueta”.
Vieira Pereira completa o quadro de artistas com projectos especiais: com mestrado em “Pintura Fotográfica – efemeridade, metamorfose e acção um percurso plástico”, a artista açoriana expõe o resultado da sua tese de mestrado: fotografias que captam o movimento espontâneo e natural que resulta da fusão de diversos materiais líquidos com água.
Aos artistas dos projectos especiais e aos autores dos trabalhos patenteados na exposição colectiva, somam-se tantos outros, que fazem da galeria Walk&Talk o espaço âncora de todo o festival, onde decorre a grande maioria dos eventos do cartaz, como algumas das residências artísticas.
Laboratório de Artesanato Contemporâneo
Este ano, o festival conta com quatro: desde Artesanato Contemporâneo que sob a direcção artística do designer Miguel Flor irá juntar criadores com artesãos locais, ao Laboratório de Arquitectura, proposto pelos ateliers Mezzo e Argot, passando pelo Laboratório de Poesia e Improvisação de Som, promovido pelo compositor Richard Simas que pretende explorar a poesia através do som e não tanto através do sentido do poema em si.
Richard Simas, o responsável pelo Laboratório explica que, por não ter conseguido trabalhar com músicos, não foi possível realizar a terceira etapa do workshop: o juntar sons musicais à declamação dos poemas. “Isto teria sido o ideal. Mas adoro a voz pura! Acho que é o instrumento mais bonito que podemos ter”, confessa, admitindo não ter expectativas pré-definidas para o resultado do workshop, que se baseou na apresentação das técnicas desenvolvidas pelo grupo.
Laboratório de Poesia e Improvisação de Som
Dentro das residências artísticas, de referir também a residência de Dança Contemporânea – no qual o micaelense Núcleo de Artes Performativas 37.25 desenvolveu, desde inícios de julho, a obra Cardume, sob a direção da coreógrafa Filipa Francisco. A residência, com o mesmo nome da obra particulariza-se por inspirar –se na Vila de Rabo de Peixe, cuja população se envolveu e colaborou na criação da peça, que estreou a 26 de julho, no Teatro Micaelense.
Cardume, direção Filipa Francisco
Uma novidade que surge nesta quarta edição são as ARTalks, um ciclo de masterclasses, onde o público tem a oportunidade de conhecer de perto e na primeira pessoa o trabalho de diversos artistas. Julião Sarmento foi o artista que deu início a este ciclo – um português de referência incontornável da arte contemporânea mundial que apresentou o seu diversificado percurso artístico de quase cinco décadas.
Carlos Martins foi o segundo artista convidado para as ARTalks. O ex-Diretor da Guimarães 2012 Capital da Cultura falou sobre o estado da arte da cultura em Portugal e as oportunidades de inovação e de financiamento para projectos culturais, tendo desafiado a candidatura de Ponta Delgada para Capital Europeia da Cultura. “Depois de Lisboa, Porto e Guimarães, porque não Ponta Delgada?” Embora não tenha vindo ao Walk&Talk com o intuito de desafiar a cidade micaelense neste sentido, Carlos Martins considera que tal candidatura é uma possibilidade. “Enquanto cidadão português, gostava muito que cidades como Ponta Delgada tivessem a coragem de enfrentar este processo, independentemente do resultado final.” Carlos Martins realça a ideia com a sua própria experiencia, ao contar que em cidades mais pequenas, nomeadamente capitais europeias da cultura, os projectos são muito mais interessantes, pelo que “um lugar como os Açores tem muito a dizer à Europa”.
Da ARTalk de Carlos Martins resultaram diversas reacções a nível mediático. Marlon de Azambuja e João Onofre também foram oradores de masterclasses, apresentando o seu percurso artístico e trabalhos, numa informal conversa que cativou o público participante.
O festival prosseguiu com um programa de luxo com a masterclass de Martha Cooper, apresentação de resultados do Atelier de Arquitetura e chegada de novos artistas além de diversos workshops e performances.