e um mundo infinito de representações
Depois da fotografia conseguir transcrever para o plano bidimensional (e portátil) todos os assuntos que a pintura abordava até então, esta última forma de expressão artística viu-se obrigada a transcender o seu propósito, intenção e abordagem. Kazimir Malevich trabalhou de forma filosófica (e exaustiva) as novas questões associadas ao objeto artístico do Modernismo e, mesmo depois do surgimento de espécie de enorme condensado de forma a que a história da arte já estava a começar a familiarizar-se, o artista presenteia-a com um simples quadrado negro sob um fundo branco em 1918.
Esta obra é afirmada pelo pintor como o "zero das formas", formas essas que permitiram a Malevich criar uma linguagem a partir deste quadrado, que é por sua vez considerado como uma espécie de buraco negro que engole e absorve todas as formas da natureza. Acrescenta ainda que, ali desaparecem todas as formas reais e irreais, não só de maneira simbólica mas também percetível aos sentidos humanos. Apesar de se ter falado numa possibilidade de abolição de pintura referente a esta obra (uma vez que, o negro como ausência de cor, forma e luz apaga toda as representações possíveis) podem ainda assim ser identificadas duas cores que permanecem, (ou melhor, dois espaços diferenciados: o preto e o branco), o que logo à partida implica uma certa ligação, mesmo que muito ténue, com a pintura.
Tal significa que, se o Quadrado Negro pode transmitir a ideia de vazio, inexistente, de “um nada” ou até de um buraco sem limites nem profundidade delimitada que absorve o mundo inteiro, é também viável a associação à representação dita em si mesma que se faz mostrar através do branco e o negro, ou seja, um espaço habitado (pelo quadrado) que embora não se saiba onde fica, ou o que pretende mostrar, está lá em permanente realidade e visível ao olho humano.
A linguagem utilizada nesta obra é uma articulação de elementos pictóricos mínimos que determina uma certa maneira de ver (ou de construção de raciocínios por associação) sendo que, através desta se constrói um mundo onde o espetador é transportado a observar o universo pictórico (quadrado preto) à face de um abismo branco (o fundo). O Quadrado Negro assume-se então semelhante a uma sensação e não a uma representação da forma (ainda que esta seja simples por si mesma) pois não pretende transcrever nenhum assunto nem motivo vivo na realidade do espetador; não pretende exemplificar, não quer designar. O seu principal objetivo é a transmissão da sensação pura de contemplação inerente desde sempre ao objeto artístico.
The Last Futurist Exhibition of Painting 0:10', Petrogrado (atual São Petersburgo), 1915