O Espaço diz à matéria como se mover e a matéria diz ao espaço como se curvar
Até ao dia 22 de Março 2014 pode ser vista a exposição de escultura e desenho de Inês Botelho na Filomena Soares. Os trabalhos tanto se encontram posicionados no piso térreo como suspensos nas paredes da Galeria.
Uma das preocupações da artista e dos estudos que tem desenvolvido baseia-se no espaço, na matéria e no movimento; tentando assim conciliar de uma forma assertiva uma relação estreita entre o objecto/escultura, num determinado espaço em movimento e o traçado do desenho. A sua obra reflecte a problemática do espaço em torno dos conceitos elementares e universais da física e da geometria, respeitantes à posição e ao movimento dos corpos, desafiando a própria força gravítica.
As sete esculturas de volumes geometrizantes são objetos artesanais, artefactos de formas simples concebidos em barro cozido que lembram recipientes como ânforas, alguidares e bilhas de água. São compostas por objectos cuja superfície contém em si o movimento de rotação que lhes deu origem, uma vez que foram construídas em barro numa roda de oleiro.
O desenho surge em duas situações distintas, ora para acompanhar e auxiliar as próprias peças através do traçado exacto geométrico, ora com autonomia de suporte objectual, como obra principal sob a forma de composições amplas realizadas a tinta-da-china e água sobre papel. São executados pela queda das gotas de tinta, sujeitos ao atrito do papel que por sua vez se movimenta sobre si mesmo.
A artista ao construir múltiplas orientações numa mesma obra destabiliza o olhar do espectador, o qual é confrontado com outras escalas, como a do espaço cósmico. A um dos desenhos foi atribuído o título da mostra, que é uma citação do astrofísico John Wheeler. O desenho é uma ferramenta essencial do seu gesto e percurso criativo, sendo uma disciplina nuclear que faz parte do desenvolvimento dos seus projetos e que tem vindo a ser consolidado.
Gosto dessa ideia de linha que é simultaneamente formal e poética
I. Botelho é fascinada por temáticas ligadas à ciência, à física e à exactidão matemática de determinados movimentos onde evidencia a fisicalidade dos objectos. Noutras mostras, a autora já se tinha debruçado sobre o sentido da gravidade, da rotação, da translacção e inflexão. No plano plástico, destacam-se pinturas formadas por manchas escuras sombreadas em dégradé, no barro com pigmentos de cor rosa e azul.
O seu trabalho de pintura é mais gráfico. A minha pintura tem tido um carácter mais de desenho. Nestas obras não existe uma dimensão arquitectónica tão visível como é habitual nas suas exposições anteriores onde havia uma relação directa com a escala, o corpo e a dimensão das coisas. Contudo, verifica-se uma relação intrínseca numa definição de geografias e lugares que explora questões espaciais e sociais.
No espaço expositivo, encontra-se suspenso um objecto com o sinal de trânsito Stop, de duas faces diferentes em ferro e tinta de esmalte que pertence ao mobiliário urbano, contrastando com o resto da exposição. Esta peça foi trazida da Aldeia da Luz, local onde a artista participa numa colectiva. O desenho é escolhido pela artista porque existe impossibilidade de materializar projetos de escultura, dadas as condicionantes físicas, ficando a representação bidimensional.
É uma artista experiente com formação em Pintura pelas Belas-Artes, no Ar.Co e o Mestrado em Nova Iorque. A minha ideia era ser pintora, queria ser artista. O curso de Pintura é mais aberto do que o de escultura. Podemos experimentar tudo, frequentar as oficinas e apresentar peças escultóricas.
Existe maior liberdade e os caminhos surgem naturalmente. Produz trabalhos em diferentes suportes visuais desde o desenho, a escultura/instalação até ao vídeo performativo. A sua obra ganhou maior destaque após a sua nomeação para o Prémio EDP Novos Artistas, em 2003 e foi distinguida com a instalação site specific Unidade de Inabitação, com habitáculos que ocupavam os dois pisos do Pavilhão Branco, resultando em algo de insólito sobretudo visto do exterior da construção envidraçada e o vídeo Nomágora na exposição Lugar Falhado.
Estas obras sintetizam o seu ângulo de preocupações nos planos dos espaços social e habitação, explorando o conceito de fronteira e de hierarquia, evidenciando o aspecto subversivo. A sua obra incorpora conceitos elementares universais de espaço. A força da gravidade é uma lei que existe e que não pode ser contrariada; enquanto as de hierarquia e de fronteira já são passíveis de o ser.
Não gosto de separações intransponíveis, mas de sugerir separações, porque uma linha de fronteira também poder ser uma linha abstrata que vai de um lado ao outro do papel, sendo uma divisão que divide um infinito.