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O Espaço como a Extensão de um Corpo

Aconselho se ainda não viu a exposição que se encontra no Espaço Chiado 8 que reúne obras de duas artistas plásticas da mesma geração que não necessitam de apresentação, dada a importância e o já reconhecimento dos seus percursos que são por si só marcantes no panorama da arte contemporânea.

Ambas têm um estilo muito definido e personalizado, enveredando por caminhos diferentes. No mesmo ciclo expositivo, que se iniciou com trabalhos de João Onofre, é a segunda mostra neste espaço com obras que pertencem à Colecção António Cachola-Museu de Arte Contemporânea de Elvas. A primeira sala é ocupada com uma instalação de F. Fragateiro Expectativa de uma Paisagem de Acontecimentos que inclui duas peças, um soalho (pavimento) em cortiça e uma estrutura de cadeira tipo modernista em ferro galvanizado. Nas outras duas salas, deparamo-nos com duas obras em tempos diferentes de Ângela Ferreira; isto é uma intervenção recente das Brigadas do SAAL e uma escultura Marquise (1993) em alumínio e vidro mais recuada no tempo, acompanhada de quatro fotografias. Trata-se de uma referência no plano metafórico de um elemento comum da arquitectura com a problemática ligada aos acrescentos e fechamentos informais que expandem o espaço interior das casas.

O seu processo artístico consiste em reduzir, cortar e ampliar como se se tratasse de um trabalho de costura

Ela desenvolve portanto séries da mesma natureza com configurações semelhantes de estruturas moduladas que se vão adaptando consoante o acolhimento das peças de chão em áreas espaciais, interiores ou exteriores, com materiais propícios. O seu processo criativo consiste em reduzir, cortar, ampliar, adaptar como se se tratasse de um trabalho de costura, que se vai ajustando ao modelo de um corpo, onde o espaço funciona como o prolongamento extensivo de um corpo.

Fragateiro desenvolve este tipo de trabalho através de um exercício numa linguagem única, de forma magistral, especialmente bem-sucedido na criação de esculturas em construções conventuais. F. Fragateiro questiona também de uma forma pertinente o conceito de escultura/monumento, criando obras anti-monumentais em que prevalecem as linhas/volumes horizontais minimalistas nos seus conhecidos soalhos/pavimentos estendidos no solo em detrimento das linhas verticais. Uma outra característica que define os seus projectos é o rigor na criação de espaços com imagens, produzindo ilusões ópticas prolongando uma geometria de espaços que não existem na realidade causada pela introdução deliberada de objectos espelhados. Enquanto a linha de actuação de Ângela, aproxima-se de um discurso social e politicamente assumido como se pode observar nas propostas desta exposição, sobretudo na obra Brigadas do SAAL. Movimento esse que se interessou por reunir soluções arquitectónicas de habitação num envolvimento com as populações locais, num desejo comunitário constituindo um certo grau de improviso e de utopia. Este trabalho foi concebido para a exposição apresentada na Fundação de Serralves no final do ano passado.

A Colecção António Cachola possui um particular envolvimento com esta peça, na medida em que aceitou produzi-la mesmo antes de existir um projecto, possibilitando à artista desenvolver o trabalho em determinadas condições, numa referência explícita ao projecto da Bouça (Porto) do Arqto. Siza Vieira. É uma instalação com uma componente performativa muito forte porque foi criada exactamente a partir de uma acção com um texto da época Manifesto da Brigada de São Vítor lido por dois intérpretes. A instalação/escultura propriamente dita surge visualizada sob duas formas: através de um écran de retro-projecção do vídeo e fisicamente no espaço real expositivo (desprovido de acção). Estabelece uma relação simbólica porque cabe no seu limite ao espectador através da sua fruição preencher, corporizar o espaço transformado pelas duas autoras, de marcas subtis pensadas até ao pormenor.

Os seus projectos envolvem a participação activa do espectador onde o seu olhar deixa de ter um papel passivo para dar lugar a um ver dinâmico, resultando numa experiência estética.

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