Molhado não, encharcado. Literalmente encharcado. Daqueles encharcamentos em que os sapatos passam de claros a escuros, as calças ganham peso na parte de baixo, a gabardina faz a sua função mas dá-te pena vê-la assim molhada, os olhos ficam turvos com as gotas que escorrem da cabeça. Noé em Lisboa numa arca que não navega. Mas navegar é preciso, viver não é preciso. Precioso. Sem preço. E o guarda-chuva branco que combinava com a mala era inútil, pequeno e frágil. Triste vida a dos guarda-chuvas, quando saem à rua é só para se molharem. E o pior, perdi um botão da gabardina que já estava meio solto. Logo o botão de cima… Mas avancei, da Graça à Baixa, roteiro habitual. Sem medo, da chuva, do futuro.
Visito o Lisbon Louge Hostel e o Living Lounge Hostel onde verifico as vendas de artigos da minha marca Portugal Modernista, e o mesmo na Xocoa Lisboa onde tenho canecas à venda. A Xocoa não é uma loja, é um espaço zen cercado de chocolate por todos os lados. Portanto, o paraíso na Terra. Lou Donaldson e o seu/meu Jazz Hard Bop recebe-me de chocolates abertos e uma bolacha de cacau cai do céu tal maná cai no céu da minha boca aberta de espanto ao sabor de cacau e porque o esperanto é o último a morrer e a minha língua é a cafeína, bebo um café. Na Xocoa tudo é bonito, o design, a geometria em quadrados e losangos, tal como a Portugal Modernista, e o som escolhido pelo Sérgio acompanha o bom gosto. Lá fora continua a chover, mas saio, volto para a Graça, molhado não, encharcado. Subo pelos Anjos, porque sinto-me abençoado por estar vivo e encharcado.