Vinil, vinil, vinil. Aquele objecto de desejo sonoro que resiste ao passar dos tempos e se torna cada vez mais resistente. Táctil, visualmente apelativo e com uma qualidade que faz estremecer os ouvidos mais cépticos. A este prazer físico junta-se o prazer visual de olhar para as capas que por vezes são autênticas obras de arte. Por trás deste "amor pelo vil plástico negro" está Edgar Raposo, fundador da Groovie Records e da actual Monotone dedicada única e exclusivamente à edição de singles em vinil de bandas lisboetas. Da colecção já fazem parte os The Fishtails, The Watchout Sprouts e os The Dirty Coal Train. "Sempre com um pé no futuro mas com os olhos no retrovisor", Edgar Raposo edita, promove e organiza concertos no espaço da Groovie Records...
O fim do vinil já foi anunciado há algum tempo, mas actualmente a realidade é totalmente diferente e é um suporte que está cada vez mais em voga com um culto cada vez maior à sua volta. Que factores preservam este culto?
O vinil nunca desapareceu completamente, sempre se manteve nos mercados alternativos. Esteve muito mal, e tivemos alturas em que até as fábricas eram difíceis de encontrar. Muitas fecharam, outras, poucas, ficaram no activo até hoje e prosperaram com o erro daquelas que se dedicaram ao fabrico de cd’s e agora estão na falência devido ao mercado do digital e do streaming. O vinil simplesmente é o formato mais fiel à música gravada em si. Um vinil é um objecto valorizado, tanto devido ao seu formato físico como gráfico. Em termos de qualidade é quase imbatível. No cd temos apenas gravação digital, O1O1O1O1O1O1O1O1, no vinil tens a gravação analógica, com todos os seus instrumentos e vozes, ruídos e som natural. O cd não reproduz esse som natural. Simplesmente o tenta imitar. Para já, o vinil não só se manteve como já está a superar as vendas do cd. Viva!!!
A Groovie sempre editou vinil desde o seu surgimento. Quando começaste a editora qual era o conceito?
A Groovie sempre lançou vinil sim, uma das razões foi sempre o meu “amor” pelo vil plástico negro. Desde sempre fui resistente ao cd, de todas as pessoas ao meu redor fui o último a adquir um leitor de cd e actualmente quase não tenho cd’s. Para teres uma ideia escuto cd’s no leitor de dvd, e muito raramente, uma ou duas vezes por mês, se tanto. O conceito sempre foi tentar fazer algo que eu sentia estar em falta em Portugal, uma editora perfilada com um género musical um pouco “maldito” por aqui, o garage, 60’s, garage punk, r&b. Podes até, hoje em dia ver uma série de pessoas a escutar ou dj’s a tocar esses géneros. Em 2005, em Lisboa, as únicas pessoas que eu conhecia a ouvir esses géneros eram o Luís Futre, Jota (Vinil Experience). Depois haviam uns gajos espalhados pelo país , Leiria, Coimbra e Porto. É então que surge essa oportunidade, a de começar algo que eu já pensava fazer há alguns anos. Já tinha alguma experiência editorial nesse campo devido a outras aventuras discográficas. Existe sempre uma ideia por detrás da editora, um caminho, e isso é aquilo que gostamos, o universo do garage, psicadelismo, punk, mod e r&b. Sempre com um pé no futuro mas com os olhos no retrovisor.
Quais as bandas que mais prazer te deram editar?
Quase todas, gostei muito de ter conseguido lançar bandas como os Haxixins, do Brasil ou Los Explosivos do México. Actualmente estou a trabalhar com duas bandas fantásticas, como os japoneses The Routes, que tocarão em Lisboa em Abril e com The Future Primitives, da África do Sul, com o seu primeiro LP acabadinho de sair e quase esgotado, dois meses depois…Outra banda que gostei bastante e estou a gostar de trabalhar são os nova iorquinos The Electric Mess.
Organizas um concerto a cada saída de um álbum?
Com bandas novas sim, normalmente as bandas entram em tournée pela Europa e países de origem logo ou pouco depois de sair o disco.
Fala-me de todo o processo. Como escolhes as bandas e como funciona a questão logística?
Não temos um processo propriamente dito e nem sempre é lógico, muitas vezes é um tiro no escuro. Vemos ou ouvimos uma banda que gostamos e vemos se tem o carácter da Groovie. Andamos quase sempre contra a corrente, tentando encontrar bandas fora do circuito europeu, pois prefiro ir ao encontro do que se faz fora da UE, menos influenciadas pelo que se faz por aqui.
As capas sempre foram uma das grandes mais valias do vinil. Quem faz o design?
O design na Groovie é 99% feito “inthehouse” por mim mesmo…
Actualmente criaste uma nova editora, a Monotone, especializada em singles e em bandas de Lisboa...
A ideia é antiga, surge da necessidade de reforçar o movimento, ou mesmo recriá-lo. A cena rock e garage de Lisboa e arredores necessita de ser reforçada, de criar movimento. E com isso surge a Monotone, residente no mesmo espaço da Groovie, na rua de São Paulo, na baixa. Onde fazemos concertos, pocket shows regulares com as bandas da editora e não só. Tudo está a ficar melhor, as pessoas estão a começar a perceber que se passa algo. As bandas começam a circular e a fazer concertos juntas com regularidade e em várias partes do país. É necessário um “farol” onde todos se possam orientar. Alguém que trate da promoção, que guie a cena. É aí que entra a Monotone. Com a experiência adquirida ao longo dos anos penso que vai ser possível.
As edições são limitadas. Quantas cópias?
150 ou 300 cópias, numeradas…
Existe muita procura?
Existe procura suficiente para o que queremos fazer, editar discos, um a seguir ao outro.
Que mais projectos tens em mente?
Em breve a Groovie em parceria com a Ghost lança o seu primeiro livro, sobre o rock nacional, um livro gráfico sobre o movimento pop rock em Portugal de 1958 a 1981. Centenas de fotos, memorabilia, capas de discos e pouca conversa.