MÚSICA

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Hoje, num dia marcado pela perda de um grande ícone do mundo da música e da moda, a Umbigo vasculhou nos seus arquivos e homenageia-o com um artigo publicado nas suas páginas em Março de 2013. Um artigo que fala sobre a vida e importância da sua carreira em todos os aspectos.

RIP David Bowie!

Mas agora em Março de 2013 pergunta Bowie: "Where are we now?". Pergunta pessoal ou universal? Pergunta de quem esteve num hiato de dez anos entre este e o penúltimo álbum. Pergunta de quem na capa deste novo álbum ironicamente baptizado de The Next Day coloca uma fotografia da capa do álbum Heroes de 1977 só que com um quadrado branco a tapar o rosto. Ou ele apagou-se ou deseja que cada um escolha e cole o rosto que quiser. Ele apagou-se para se reinventar como fez ao longo da carreira de décadas? Tudo é permitido na brancura vazia do quadrado de Malevitch? O designer da capa, Jonhantan Branbook diz isso justamente, que a ideia era apagar o passado, mas se no passado Bowie pretendeu (?) sempre estar no futuro, e quase sempre conseguiu, o que pretende agora no presente?

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O presente como zona de conforto, rodeado de músicos já conhecidos dele, e em especial do produtor americano Tony Visconti, responsável por muitos e marcantes álbuns de Bowie. Zona de segurança ao repescar o passado na capa de um álbum de 1977 como de um som que remete para uma certa “normalidade”. Mas o que poderia fazer David de novo? E desejava fazer? No entanto nem tudo é conforto, é só aparente, pois um certo negrume atravessa músicas e letras. O presente como zona de desconforto, universal, e talvez pessoal.

Let´s Dance… this is not America… absolute begginers…blue jeans…china girl… era o Bowie que me chegava aos olhos e ouvidos durante a adolescência na década de oitenta. Mas chegou-me mais directamente na versão do Ziggy Stardust no disco que comprei e ouvia compulsivamente dos Bauhaus. A cena gótica daquela década influenciada por Bowie na versão Ziggy pois se Bowie passou incólume pelo Punk seja pelo que fez como por não ter estado na “lista dos inimigos” do mesmo já algum pós-punk poderia reclamar alguma paternidade. Quem reclamaria paternidade seria a cena New Romantic de 1979 a início de 80´s e que teria a sua sede no Blitz Club e na boutique PX. Não por acaso também designados por “Bowie Kids”. Bowie assumiria a paternidade ao visitar o Blitz e convidar algumas das suas figuras principais, entre elas Steve Strange dos Visage, para entrar no seu próximo videoclip Ashes to Ashes.

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Ainda no outro dia ouvindo os dois primeiros álbuns dos Duran Duran de 1981 e 1982 respectivamente, pensei que músicas maravilhosas e estranhas, e eram músicas comerciais…poderiam ser do Bowie pelo ambiente…e as letras…e pensei no que fazia Bowie nesses anos pós Berlim…fazia Scary Monsters em 1980 e em 1983 lançava Let´s Dance já mais impregnado de funk branco, tal como entre outros da época, os Duran Duran. Novidade ou apenas contemporaneidade da parte de Bowie? Modern Love ou apenas Absolute Begginers? Absolute Begginers, filme de 1986 inspirado no livro de 1958 de Colin McIness. Livro relato de uma londres de final de 50´s e onde o personagem “sem nome” seria um protótipo daquilo que viria a ser a tribo Mod logo uns dois ou três anos depois. Bowie começaria por aí, no rhythm and blues, e depois pelo som Beat da Swinging London, até a algo meio folk da praxe de final de 60´s.

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Depois viria o Bowie que se tornaria superstar, uma superstar que viria do espaço numa cena glam rock de excessos. E aqui já seria mais original, procurando algo novo e não algo já estabelecido. E depois o soul à la Filadélfia, e o funk branco, e o frio experimentalismo europeu, e o drum and bass/jungle dos 90´s, mas sempre o pop, vestido em alta costura de qualidade. Bowie alfaiate, de sons e imagens.

Changes. Dele e minhas. Depois da minha fase Ziggy Stardust versão punk gótico Bauhaus entro na década de 90 e observo atentamente a capa dupla do meu Hunky Dory. No interior fotos de Bowie naquela sua fase. Calças largas, meio clássicas, com pinças e em pose a fumar por uma piteira. Um poseur provocador. Troquei as calças justas que usava por outras mais largas e a fazer contraste com as peças da parte de cima do corpo sempre mais apertadas. Uma gestão de imagem que sempre mudou conforme a fase em estava e que lhe deu a alcinha de “camaleão”.

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E nos últimos anos? Como uma artista gere a sua imagem já não sendo um jovem de aparência? Para mais tendo tido problemas cardíacos nos últimos anos o que provocou certamente o tal hiato discográfico e de concertos. Se calhar já não precisa de gerir a sua própria imagem mas apenas controlar tudo à sua volta como é seu apanágio. A arte de controlar, de gerir uma carreira musicalmente e esteticamente. De saber ser influenciado e de saber que influência.

Mudanças. Fazer escolhas. Escolhas. Assim por alto ao longo das décadas teve por acompanhantes Nile Rodgers, uma das cabeças dos importantes Chic e um dos inventores do Funk contemporâneo. Tony Visconti, de que já falei no segundo parágrafo, o amigo seguro a que Bowie voltou a recorrer para este regresso. Carlos Alomar o som de guitarra frio funky europeu de vanguarda que tantos de nós reconhecemos à primeira audição de clássicos de Bowie é simplesmente um porto-riquenho nova-iorquino e não um músico intelectual europeu.

Iggy Pop, outro réptil de alcunha, o “Iguana”, foi resgatado pelo “camaleão” na fase tardia dos Stooges e mais tarde a solo na “fase Berlim” em que viveram e compuseram juntos. É para essa época que remete a capa deste novo álbum. Estes todos são os amigos americanos porque temos ainda os compatriotas Brian Eno o mago-produtor, responsável por algum do som estranho de Bowie e figura que só não ombreia em popularidade com o mesmo porque embrenhou-se nas “vanguardas”. Também um sobrevivente do Glam Rock, no seu caso uma das cabeças pensantes dos Roxy Music. Mick Ronson, Robert Fripp, a arte de fazer escolhas. A música Lust for Life seria um pouco mais tarde massificada pelos DJ´s devido a ter aparecido na banda sonora do filme Transpoiting. Até aí era ignorada por um público que provavelmente continua a ignorar o álbum original de onde saiu. Esses dois álbuns do Iggy/Bowie são de 1977 e “Who cut david bowie´s hair in 1977?” pergunta-se no livro Perry Boys de Ian Hough. Na capa do Low desse mesmo ano Bowie aparece de perfil com um estranho corte de cabelo. Fenómenos não muito explícitos e algo ignorados até hoje (com excepção desse fantástico livro) levaram a que em 1979 vários jovens aficionados do Manchester United e do Liverpool usassem esse corte de cabelo. Algo efeminado para hooligans. Os do Manchester United por usarem polos Fred Perry seriam designados de Perry Boys.

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Roupa de marca chique desportiva, ténis Adidas Stan Smith, calças Lee. Os primeiros casuals. E Bowie estava no cabelo. Como estava nos Suede ou nos Placebo. Não estaria no filme de Tod Haynes, Velvet Goldmine, em que seria uma das principais personagens inspiradoras naquele tributo aos tempos do Glam Rock. Aliás no filme mostra os mods como os primeiros dandies modernistas que ao pintarem os olhos e a sua obsessão por roupa anteciparam de certa forma o tal Glam Rock do filme. Tal Bowie, antes e depois. Em 2009 numa das festas mod que organizo um “suposto” mod quando ouve o Young Americans a ecoar no bar diz-me que não está certo passar aquilo numa festa mod. Ele é que estava errado na festa. Deixámos de nos falar.

Nova Iorque, Berlim, cidades do camaleão, mas é em Londres, onde nasceu, que esteve patente no Victoria and Albert Museum a exposição David Bowie is com mais de trezentos objectos relativos à vida do mestre. A mesma, patrocinada pela Gucci, mostra que a cultura pop é mais do que apenas música, é moda, design, cinema, tendências, atitude, através das colaborações e influências de David Bowie. Onde estamos nós agora Camaleão?

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