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Inaugura amanhã, dia 5, a mostra M'Bilú do artista angolano Hildebrando de Melo numa exposição a dois tempos. O início terá lugar às 18h, na Galeria da Livraria da Costa e posteriormente o público segue para o espaço Camões sito na Praça Luís de Camões, 22 - 4º.

De aparência abstrata a pintura de Hildebrando de Melo é designada nas palavras de Fernando Galan, de um realismo quase-esotérico. Realidades materiais cruzam-se com realidades imateriais numa obra homogénea e pautada de signos. Aqui vos deixamos o texto de José Sousa Machado para o catálogo da exposição:

Entre o bem e o mal

O universo criativo de Hildebrando de Melo é vasto, complexo e contém múltiplas possibilidades de abordagem. É como se o artista, em cada nova série de trabalhos que realiza, incorporasse no seu léxico já consolidado novas áreas de conhecimento – cada qual com o seu sistema de referências particular – oriundas tanto do universo específico da arte como da religião e das inumeráveis narrativas mitológicas que cita, da antropologia, da política, robótica, biologia ou, sobretudo, da ontologia. A pintura assume-se, assim, para Hildebrando de Melo, como laboratório de observação dos fenómenos  naturais e suas repercussões nos planos espirituais; suporte sensível sobre o qual o pintor inscreve, anota, regista o resultado da sua experiência quotidiana enquanto ser no mundo, consciente do mistério insondável e movediço no qual se enraíza o destino individual e coletivo da humanidade.

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Vírus 001989, 2013, técnica mista s/ tela, 151 × 151 cm

“Desde tenra idade que questiono a existência (…) Sempre tive o desejo de ver Deus! Qual será a sua fisionomia? (…) depois da expressão o que virá? (…) gosto de tratar a pintura como um organismo vivo, como um vírus que cresce, muta-se, divide-se (…) e analiso a espécie humana também na sua condição de vírus que precisa de proteínas para viver; no confronto com a terra, em busca de alimento – a fome, as doenças, os desastres naturais, Deus”, afirma Hildebrando de Melo no livro que publicou recentemente, reunindo 20 anos de labor artístico.

A interrogação urgente sobre o sentido da existência e, em particular, a procura incessante de uma explicação plausível para o conflito insanável entre o bem e o mal na história da humanidade, com o seu tremendo cortejo de horrores, constitui, do meu ponto de vista, a questão fulcral, sempre retomada e reatualizada, da obra de Hildebrando de Melo. Muitas das suas pinturas são, metaforicamente, autênticos campos de batalha, onde se confrontam forças poderosas antagónicas que o artista, qual Kimbanda (sacerdote) iniciado nos mistérios, procura apaziguar plasticamente, restaurando em cada nova obra o equilíbrio vital ameaçado.

De aparência abstrata, a pintura  de Hildebrando de Melo é, de facto, realista, pois retrata realidades materiais - gruas, robots biomórficos, seres-máquina, candongueiros, composições articuladas, insectos, imbondeiros –, bem como realidades imateriais – nkisi (figuras de adivinhação), entidades mitológicas e arquetípicas, potestades – no que poderemos designar, como muito justamente notou Fernando Galan, de realismo quase-esotérico. Convém sublinhar, em defesa desta tese, que a maioria das pinturas do artista tem título – Movement of God, Estudos para Vorax, Posição de Combate, Kiling Structures, Spider, Vírus, p. ex. –, nomeando explicitamente o objeto ou ambiente retratado em cada obra e fornecendo ao observador informações preciosas sobre como o autor articula os conteúdos verbais com a sua tradução plástica específica.

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Vírus 001981, 2013, técnica mista s/ tela, 149 × 153 cm

Dos fundos coloridos das telas pintadas a espátula – parecem puzzles de lâminas sobrepostas – irrompem formas geométricas, retilíneas, angulosas, estruturas articuladas rigorosamente monocromáticas que se instalam ante o nosso olhar como protagonistas do acontecimento plástico vertente e nos transportam subitamente do universo da pintura para o da escultura. Ou seja, a plasticidade matérica e harmoniosa do suporte parece preparar o ambiente adequado para a entrada em cena do clímax escultórico, integrando, assim, o artista, numa única obra, as duas disciplinas.

Na mostra que Hildebrando de Melo apresenta na galeria da Sá da Costa, intitulada M’Bilú (luta), está exposta uma obra em que o elemento escultórico, que nas obras anteriores estava implicitamente sugerido nas composições articuladas monocromáticas, existe agora realmente, fisicamente, em metal recortado, emanando da superfície pictórica, em alto relevo, conferindo uma maior coerência ao intento do artista e inaugurando uma nova via de desenvolvimento deste projeto artístico.

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