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O sangue é um dos elementos orgânicos pessoais que tem sido utilizado, de forma mais ou menos impressionante, pelos artistas contemporâneos. O sangue é a vida, a identidade, o sangue é o corpo, matéria rica de significados e simbolismos. Artistas como Franko B. ou Marc Quinn já usaram o seu próprio sangue como matéria plástica para auto-representação e por vezes como elemento de choque. No lado mais feminino, Gina Paine e Ana Mendieta imprimiram sangue nas suas obras como testemunha da vida, da morte ou do sofrimento.

O artista Ted Lawson segue o caminho sangrento de outros artistas e enveredou por uma solução tecnológica de cruzamento entre a arte e a ciência. Assim, fez uso de uma impressora equipada com o sistema CNC (Computer Numerically Controlled) para realizar um invulgar auto-retrato chamado Drawing Blood. A impressora que normalmente está ligada a um cartucho de tinta, está neste caso ligada às veias do artista, sendo alimentada não com tinta mas com sangue. O mecanismo resulta numa impressão a jato de sangue do corpo nu do artista. Mas não é a nudez que está no campo central da temática desta obra, e sim o processo de se chegar a esta peça. Ted fez-se fotografar nu, deitado. Essa imagem foi transformada num desenho em vetor. Depois, o artista programou uma impressora para produzir falhas espontâneas, não controladas, ou seja, “glitches”. Isto traz alguma imprevisibilidade ao trabalho e minimiza o seu lado puramente mecânico para aumentar o fator “acaso”. De seguida o que acontece é a impressão, com cabos de alimentação que estão presos às veias do artista enquanto ele vai comendo alguma coisa para manter as forças necessárias durante as horas necessárias para chegar ao resultado final.

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Na Série The Map is Not The Territory, da qual esta peça faz parte, parte-se do corpo para a representação do corpo com materiais do próprio corpo, mediados por uma máquina, o que torna tudo muito interessante e inovador. “A ideia de me ligar directamente à máquina e de fazer depois essa ligação às outras peças da exposição era o mais importante para mim”, diz Lawson que desvaloriza a nudez que o trabalho envolve. Para Ted lawson, este trabalho faz sentido numa sociedade narcísica que actualmente vive obcecada com as selfies e com a disseminação de auto-retratos pelas redes sociais.

A obra de Ted Lawson relaciona-se quase sempre com um lado tecnológico que é associado a temas primordiais como a representação do corpo, a escultura entre o natural e o artificial, o questionamento da própria representação na arte. Há sempre um forte lado orgânico naquilo que faz e uma referência a arquétipos e elementos ancestrais da nossa cultura. “Aparentemente, na auto-representação o outro deixa de existir; o outro é o pintor mesmo”, diz o filósofo português José Gil. “Quando ele se representa, a reflexão do olhar fecha-se sobre si. (…) O que escapava ao circuito reflexo, ou porque ficava na sombra ou porque ficava descentrado, organiza-se agora à volta de um centro. No auto-retrato nada mais foge ao olhar: a imagem atrai e reflete o olhar que a olha; e porque tudo no olhar do pintor se concentra na sua própria imagem, esta absorve tudo o que a rodeia, e reenvia-o, centrando mais ainda (pela composição que aprisiona) os elementos da representação”. Quando o material do qual se cria esta imagem faz parte do corpo do próprio pintor, dá-se então uma força centríptica de criador, matéria e imagem.

No trabalho de Ted Lawson a representação do corpo aparece como tema recorrente, mas de uma forma em que se verifica uma desintegração do mesmo, uma espécie de decadência orgânica. As suas esculturas parecem estar num processo de dissolução, de putrefação. É comum aparecerem figuras femininas que parecem derreter como se de silicone se tratasse, como no caso das peças Mortality is a Myth, Crude ou Death of a Narrative.

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Usando a representação figurativa e a abstração geométrica , Ted Lawson cria uma progressão narrativa de formas que revela algo conceptualmente maior do que a soma das suas partes. Nas obras de grande escala, Ted combina a tecnologia digital com métodos tradicionais de escultura altamente trabalhada para produzir objetos perfeitamente conceituais que expressem a verdade analógica subjacente dentro do seu assunto. O seu processo de trabalho é uma exploração da experiência existencial humana através de modelos imaginados do universo como a forma física. Lawson vive e trabalha em Nova Iorque, criando trabalhos originais a partir do seu estúdio em Greenpoint, Brooklyn.

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