FOTOGRAFIA

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Imagens de capa: Ana Filipa (desenho); Helena Flores (fotografia).

Helena Flores foi a grande vencedora do prémio Novos Talentos FNAC Fotografia 2014 com o seu trabalho Luz Interior em que uma das imagens é neste momento a capa da Umbigo online. Um trabalho a duas mãos realizado entre Helena Flores e Ana Filipa e materializado em dípticos que relacionam a fotografia com o desenho.

Como decidiu concorrer ao Prémio Novos Talentos FNAC Fotografia e como se desenrolou o processo e criação do conceito?

Quando decidi concorrer ao prémio o trabalho já estava feito. Durante o primeiro ano do Curso Profissional de Fotografia foi pedido à turma que desenvolvesse um projecto fotográfico em Serralves. Tínhamos analisado o trabalho da Sophie Calle recentemente na mesma disciplina e a partir daí as duas componentes juntaram-se na minha cabeça. É destas coisas que surgem as ideias… A ideia inicial era fotografar um invisual a explorar as esculturas do parque. A possibilidade de juntar os desenhos às fotografias construindo dípticos só surgiu depois de perceber que os invisuais desenham, ao longo do tempo de pesquisa. Então, quando encontrei a Ana propus-lhe que, para além de observar as esculturas também as desenhasse e o resultado é o Luz Interior.

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Fotografia significa escrever com luz e a Helena parte do conceito Luz Interior, como chegou a esta ideia?

Não parto desse conceito, chego a ele quando vejo os desenhos da Ana. É como se ela contivesse uma reserva de luz que ilumina o mundo cá fora para ela poder transformá-lo em ideias, pensamento, memória e, por fim, desenho. É também desta questão que falamos quando escrevemos com luz, na fotografia: de memórias, documentos registos, informação. A luz também vem da memória, do cérebro. Vem de dentro. Associamos sempre a luz à possibilidade de ver, mas no sentido metafórico será também a capacidade de memorizar.

Para materializar esta luz interior procurou alguém invisual que quisesse participar no projecto. Foi um processo de procura moroso, levando-a quase a desistir.

Não diria moroso… Na verdade tinha, logo à partida, pouco tempo para uma ideia ambiciosa. As propostas feitas pelos docentes das disciplinas têm prazos, este também tinha. Contactei a ACAPO e inicialmente pareceu-me que não teria dificuldade em obter a colaboração desta entidade. Mas o tempo foi passando e percebi que não me poderiam responder com a urgência que eu tinha. Sou enfermeira, trabalho num hospital a tempo inteiro, para combinar uma sessão fotográfica dependia de vários factores, e nem a minha disponibilidade nem a das outras pessoas é total. Iniciei um plano B para o trabalho. Não podia facilitar. Mas continuei a procurar, quer através das redes sociais, quer entre colegas de trabalho. E foi uma colega de trabalho que se lembrou da Ana. Tinha que ser uma pessoa especial, com abertura para sair de casa para ir para os Jardins de Serralves ver esculturas contemporâneas.

O que aprendeu com a Ana Filipa? Como foi a interacção e como lhe transmitia ela o seu modo de ver?

O que aprendi com a Filipa? Que usufruímos pouco dos restantes sentidos que temos. Deixamo-los na preguiça. A Ana parou quando chegou perto de um objecto grande em espaço aberto. Não estava em rota de colisão com a escultura mas parou ao lado dela porque se apercebeu que ali estava. Como? Perguntei-lhe. Porque o som dos passos ficou diferente. Nós veríamos o objecto e não estaríamos tão atentos à informação chegada pela audição.

Como referiu foi um processo de trabalho moroso e complicado mas que de certa forma atribuiu alguma magia ao projecto e ressalva as qualidades do que lhe foi permitido fazer. Que evolução foi sentindo e de que forma o trabalho foi ganhando para si um carisma especial?

No momento em que a Ana aceitou desenhar. Aí percebi que o trabalho tinha muita força e que iria ser concretizado.

Trata-se de um projecto para além da imagem, aproximado da filosofia, da estética, de uma linha de pensamento muito formal. Está a Helena de alguma forma ligada a estas áreas?

Creio que todos somos influenciados por estas disciplinas, se de alguma forma pensamos sobre o mundo que nos rodeia. No meu caso não sinto essa influência de forma organizada, estruturada, como quem as aprende na escola, mas o projecto é reflexivo e coloca algumas questões. A reflexão sobre o preconceito não é uma novidade mas creio ter conseguido usar a fotografia como forma de o desmontar. Quanto à formalidade que refere, ela existe, quanto a mim, na organização das imagens em dípticos, todos eles com a mesma receita: desenho da Ana /imagens da Ana. Quanto ao conceito ou às imagens da Ana não vejo formalismo, pelo contrário.

Para finalizar gostaria que comentasse a forma como olha e como vê.

Procuro estar atenta ao mundo. É tão só isso. Se vivermos de olhos fechados talvez nos consigamos proteger dos horrores do nosso tempo, mas não só perderemos a oportunidade de intervir sobre isso como deixaremos escapar uma miríade de coisas belas.

A título de curiosidade para a entrevista:
1 – Quando e como decidiu tornar-se fotógrafa?
2 – Lembra-se da sua primeira máquina fotográfica e da primeira imagem que concebeu?

Tive a minha primeira câmara quando casei, há 15 anos: uma Nikon F60. Comprámo-la em Lanzarote, na lua-de-mel. Pouco tempo depois fiz um curso básico de fotografia para optimizar o uso da câmara. E sempre ia recebendo elogios do meu marido. Ele foi fundamental para a forma como foi crescendo em mim o gosto pela fotografia. Com o nascimento da nossa primeira filha veio uma câmara digital. Então foi mais fácil fotografar mais, errar mais e melhorar. Fui alimentando o gosto pela fotografia até ao momento em que decidi fazer formação. A opção foi o Instituto Português da Fotografia. Identificar-me como fotógrafa ultrapassa a questão da decisão de fazer o curso ou até conclui-lo. È uma questão de perspectiva sobre o mundo e cá dentro existe uma enfermeira a viver há alguns anos. Levei algum tempo a apresentar-me como fotógrafa. Acho que já deixei de ser a enfermeira que fez o curso profissional de fotografia. As primeiras imagens que concebi foram de férias, não ficaram gravadas de forma significativa, mas foram certamente alimentando o bichinho cá dentro.

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