NOTAS SOLTAS

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Fotografias: Tiago Mota.

Filipe Pau-Santo. O gajo é bom tipo. Não se sabe se nome se alcunha. Irrelevante. Todos o tratam assim. O começo e a inversão da idolatria – Paulinho Cascavel, Marlon Brandão, Rijkaard, sim chegou a fazê-lo, são paulatinamente substituídos por Robert Smith, Wayne Hussey, Ian Astbury. Ao mesmo tempo, o tampo da secretária deixa de ter a configuração em 4-4-2, com um onze ideal e passa a ser a enumeração dos álbuns favoritos e das bootlegs que só ele e quem as gravou conhece. O verde pelo preto, as t-shirts pelas camisas de folhos e os ténis brancos por botas com 10 fivelas e igual número de centímetros para tamanho de sola. Não era um gótico qualquer. Melancólico como todos e impossível apanhá-lo na praia. Mas – aquela forma de falar. Tardava. O que poderia dizer em dois minutos fazia-o em dez. Uma resposta de segundos transformava-se em tratado sobre a complexidade do cosmos. Era gótico no vestir, mas tudo o resto barroco. Claramente barroco. E entranhava-se. Perdia autocarros em catadupa, as refeições eram horas, nos exames da faculdade ficava-se pela primeira resposta. O tempo era constrangimento.

Desaparecera. Muitos anos sem contacto. Até que – dia 22 de Novembro, Taberna das Almas, 20.XX.Vinte. Alguns antigos amigos aproximam-se. Filipe? Ya. (O quê?! Resposta curta). Filipe Pau…? Exactamente. Então? “Estás a ver, começo a dar valor ao efémero, ao momento e ao eternizar do presente. À descarga e ao relâmpago. O bater de uma onda no molhe. Aquele quadrado de chocolate e ingeri-lo na sofreguidão alarve. A beleza dos quarks”. Ok, alguma das características mantinha. Mas a beleza do efémero?! Como tal, não foi estranho vê-lo atento a cada detalhe das ilustrações. Pose curvada, tudo para ser absorvido, ao segundo. Deslumbramento maior quando descobriu que as mesmas teriam duração limitada – aquela noite. Que mudança. Do tempo elástico ao consumo instantâneo. Deixou-se ficar naquela espécie de primeiro andar recuado. Debruçado sobre o corrimão da varanda interroga-se como cada um irá lidar com a contagem decrescente – 14.56, 14.55, 14.54s. Da intensidade de Gabriel Ferrandini em parceria habitual com o Rodrigo Amado, de Pedro Sousa e David Maranha, como coubera tanto corpo atrás de teclado tão pequeno? ao registo mais folk de Alek Rein ou à festividade saltitante de uns Poster. Aqueles 6 minutos de Memória de Peixe. Como é que se conseguem desperdiçar 9 e ainda assim ficar na retina como um dos melhores registos da noite? E se de Asimov já se disse que seria melhor do que cereais ao pequeno-almoço, em 11 minutos e com um só tema, o poder energético da banda aproxima-os de outra iguaria – sopas de cavalo cansado. Por fim, aquele ritual catártico de Feia Medronho, exemplares maiores do movimento chungwave, entre strobes, leituras guturais sobre Zlatan Ibrahimović e destruição de quadro da última ceia.

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Para o ano há mais – 60 artistas, 15 minutos, lotação esgotada. E com quem aprendeu a lidar com o tempo de maneira diferente.

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