MÚSICA

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Fotografias: Hugo Lima.

Temp(l)o para Celebrar a Música

Ao longo de uma semana, aterram centenas de naves em forma de tenda pelas margens do Taboão. De todos os cantos do país e arredores, chegam entusiastas prontos para saborear e descobrir o melhor da música em sintonia com a natureza. A criatividade desdobra-se em forma de sinalética ou guarda-roupa exuberante. Nesta arca de Noé, reúnem-se reinos e linhagens, surgem crocodilos dançantes ou guerreiros das cruzadas, adaptados ao século XXI. As múltiplas "espécies" de Coura abraçam sem preconceitos uma multiplicidade de gostos e cenários musicais. O público adere e emociona-se com a sensibilidade de James Blake, dança ao som de Cut Copy, vibra com a máquina Franz Ferdinand ou delicia-se com a atmosfera mágica de CVRCHES. Durante vários dias, distribuem-se guias e fórmulas para uma semana de felicidade num festival que se renova a cada ano que passa. Nesta edição, Paredes de Coura voltou a estender-se, subiu à vila, reencontrou-se com os recantos da paisagem, afirmando-se e encorajando novos cruzamentos sonoros.

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No primeiro dia oficial do festival são já muitos os que se aglomeram expectantes junto a entrada do festival. Pelos motivos óbvios de uma afluência inesperada, a organização viu-se obrigada a mudar a programação para o palco principal. Foi neste espaço que Ana Matos a.k.a. Capicua abriu as hostes perante uma moldura já bem composta. Das palavras acutilantes e atentas da rapper da Invicta, seguimos viagem pelo devaneio expressionista de Cage the Elephant. A banda do Kentucky arrebatou e conquistou o público que flutuava ao som de melodias inquietas e provocantes. Matt Shultz despe a camisola e enfrenta uma multidão efusiva. O líder da banda não poupa esforços e elogia a audiência repetindo a frase "You are a miracle in my life".

Depois da passagem de um furacão de peso, a nova coqueluche do R&B Janelle Monáe recria em palco uma teatralidade e performance épicas. Na versão I Feel Good de James Brown, a plateia rende-se a uma voz irrepreensível. Num manifesto de igualdade repleto de adrenalina, Janelle veste a pele de uma "Electric Lady" que exibe orgulhosamente a sua bandeira conciliadora.

Public-Service-Broadcasting

Por volta da uma da manhã, o sentido de humor refinado dos Public Service Broadcasting transporta-nos numa aventura maquinal, devidamente ilustrada por películas e imagens de arquivo. Uma exímia bateria conjugada com frases pré-gravadas, guitarra, banjo e eletrónica, levaram a audiência a uma verdadeira revolução industrial muito bem sintonizada com a pista de dança verdejante.

Já no Palco Vodafone FM, e em antecipação ao concerto de sexta-feira, os mestres de reciclagem Cut Copy serviram um delicioso DJ Set com receita australiana. Um batido em formato pop, faria as delícias da madrugada e daqueles que nela dançassem.

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Quinta-feira arrancou na tenda Vodafone FM com o blues-rock endiabrado do barreirense Fast Eddie Nelson. Já no palco principal, a indie catalã dos Oso Leone foi o cenário perfeito para sintonizar com os últimos raios de sol da tarde. De volta ao palco secundário, os Panama viajaram do outro canto do mundo para protagonizar uma sessão pop dançável e solarenga.

Pelo final da tarde o anfiteatro natural foi surpreendido por um septuagenário de barbas longas e uma história de vida impressionante. Seasick Steve foi o herói de um dos momentos mais marcantes desta edição do festival. Dos confins da América profunda para a paisagem minhota, o blues de jardineira, intercalado por contos mirabolantes ou serenatas ao vivo, deixaram a assistência totalmente rendida.

Seasick-Steve

Outro dos momentos da noite foi protagonizado pelo dedilhar mítico e vertiginoso de Thurston Moore. O co-fundador dos Sonic Youth revelou algumas das sonoridades do próximo álbum a solo, previsto para Outubro deste ano.

Enquanto um desconcertante Marc di Marco reunia entusiastas em palco para uma actuação repleta de irreverência adolescente, os The Oh Sees descarregavam overdoses de energia em formato garage-punk. Uma erupção crescente entre o público levou a assaltos ao palco, que provocaram resistência pelos elementos da segurança. Eis que John Dwyer interrompe a cena acenando "no choking" e a manifestar o desagrado contra as restrições agressivas. A espontaneidade crua e momentos de êxtase não esmoreceram, o incidente dissipou-se e a intensidade da actuação saiu vitoriosa.

CHVRCHES

Já pela noite dentro, a synth-pop do trio escocês CHVRCHES, invadiu o recinto com uma nova religião em formato pista de dança. A magia singular da voz de Lauren Mayberry e os ritmos sincopados dos sintetizadores, aproximaram o futuro da plateia. Durante cerca de uma hora, o céu desceu à terra em contornos luminosos, a deixar o público em suspensão.

Depois do manifesto pacificador do trio escocês, os Franz Ferdinand invadiram o palco para incendiar a plateia. O regresso muito aguardado da banda de Alex Kapranos contagia e continua a agradar gregos e troianos, meninos e meninas. Esta máquina de fazer música detém uma fórmula universal que poucos dominam. Nuvens de pó levantam-se e aqui e ali explodem focos luminosos. "It's just a band" diz Kapranos numa tentativa para resfriar os espíritos mais exaltados do público. Mas o delírio conjunto prolongou-se enquanto a banda se manteve em palco.

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Apesar de refreados, os ânimos continuaram acesos no palco Vodafone FM para receber White Haus, projceto do multifacetado João Vieira que conjuga várias referências e culturas musicais. Uma simbiose de dançarinos e instrumentistas deram uma prestação intensa para fazer mexer as ancas. Ficámos com a sensação de saber a pouco devido às restrições do horário. Para completar o cardápio, Ivan Smagghe deu uma lição de dança em modo de centrifugação eletrónica que se estendeu pela madrugada fora.

Depois de uma noite recheada em momentos memoráveis o corpo pedia já descanso. Anteviam-se mais dois dias e duas noites de música e festa para mergulhar até ao último minuto.

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