Fotografias: Joana Pires.
1. Tamanho de Pilas
O maior problema do Festival de BD de Angoulême, que decorreu entre 30 de Janeiro e 2 de Fevereiro deste ano, é justamente explicar o que ele é a seja quem for! Como explicar a uma pessoa seja ela uma leitora ou não de BD o que é aquele acontecimento cultural?
É um festival de BD em França, ponto assente. É um festival do “tipo europeu”, ou seja, um evento onde há venda de livros e artigos similares, onde se realizam encontros com autores e se organizam exposições de originais – ao contrário do “estilo norte-americano” que baseia-se apenas em comércio de produtos e encontros com autores e outros agentes da indústria.
Depois disto, é mais complicado esmiuçar a coisa porque em Portugal apesar de termos tido grandes festivais no passado (Salão do Porto e Salão Lisboa) ou ainda termos dois activos (Festival de Beja e a BD Amadora) ainda assim todos eles são muito pequenos em comparação!!! O Festival de Angoulême é o mais importante evento de BD na Europa, já com 41 anos de idade. O quê mais? É o Shoah do eucalipto? Um Festival Rock de Verão mas no Inverno e sem bandas? O South by Southwest dos quadradinhos? Uma orgia de “bedófilos”? (bedófilos é uma expressão criada por três engraçadinhos para definir “bedéfilos”, pessoas que gostam de BD, que gostam BD para crianças, aproximando-se assim à expressão “pedófilos”)… Seja como for, que espécie de outro evento cultural conhecido servirá de comparação para um leigo?
Creio que não há resposta nem haja nada parecido com este Festival, por isso, o melhor é tentar explicar de alguma forma... Imaginem Viseu, por exemplo, onde nada acontece durante o ano inteiro, e no último fim-de-semana de Janeiro, a cidade é invadida por milhares de pessoas, de um lado visitantes que são apenas fãs e consumidores de BD, de outro lado toda a espécie de profissionais e amadores ligados à BD como editores, agentes literários, autores, directores de institutos ou eventos, investigadores jornalistas, críticos, etc… estes últimos vindos de toda a parte do planeta, esgotam a lotação de quartos de hotel, de pensão, de pousada de juventude e até refúgio para sem-abrigos – verdade, já me aconteceu em 1998 quando fui para lá à “pato bravo”!
Continuando… No centro da cidade são montadas várias tendas para stands comerciais. A maior (ou melhor, são duas lado a lado) intitulada Monde des Bulles (O Mundo dos Balões) serve para as grandes editoras comerciais como a Casterman (detentora do Tintim, Corto Maltese,...), Glenat, Gallimard, Delcourt, etc… Uma outra, um bocado menor, é para as editoras “médias” (L’Association, Fremok, 5éme Couche, Actes sud, Atrabile, Ego Comme X, etc…) conhecida por ser o “Novo Mundo” e que se prolonga para uma outra de “BD Alternativa” (produção em fanzines / auto-edição).
Pela cidade ainda há uma série delas menores para os direitos internacionais, para merchandising asiático (refiro-me à cultura Manga / Anime, claro, e não a pichebeque chinês), para os novos talentos, para coleccionismo (chama-se a tenda “Para-BD”) e pelos vistos este ano para o género “BD policial”.
Angoulême para além de ter parque museológico normal como qualquer cidade antigo europeia, comparando com Viseu (não se esqueçam que é um exemplo, se preferirem podem mudar para Guarda!) ainda tem uma grande parte dedicada à BD como o Museu da Banda Desenhada, a Nave Moebius – o primeiro museu inaugurado nos anos 90 onde inclui uma Bedeteca, antigamente conhecido pelo CNBDI, Centro Nacional de BD e Imagem –, a Universidade de BD / Ilustração / Cinema de Animação / Imagem digital, e ainda a Casa dos Autores (para residências de estudantes e professores), fazendo literalmente de Angoulême a Cidade da BD.
Mas há mais! Para o festival, são usados não só esses equipamentos acima referidos como uma série de edifícios da Câmara para fazer exposições oficiais como teatros, espaços culturais, museus, o palácio da justiça ou ainda as ruas (este ano dedicado aos 80 anos da revista do Mickey – obviamente a rua é usado para situações mais populares). E ainda não oficialmente, também é normal usarem as igrejas e catedrais para serem feitas exposições de BD – de teor cristão, claro.
Ufa! Chega para primeira abordagem?