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"Eu pinto porque a pintura é uma utopia privada"

O seu trabalho é uma espécie de caleidoscópio de imagens irónicas, misteriosas e controversas. Pinturas povoadas por figuras da banda desenhada, deuses gregos e ditadores. Erró gosta de provocar com o seu trabalho que à partida parece lúdico e colorido, mas não deixa de ser portador de uma carga política e crítica. Num espírito provocador expõe líderes cuja máquina de propaganda revela a ditadura. Armas, violência e sexualidade são outros dos ingredientes da sua obra.

Muitas das suas pinturas parecem painéis de banda desenhada que numa combinação de estilos e linguagem pictórica se transformam num puzzle gigantesco. Em 2001 foi inaugurado um museu em Reykjavik consagrado unicamente à sua obra.

Desde os 10 anos que a pintura se tornou uma paixão para Erró, uma veia criativa despoletada pelas imagens de um catálogo do nova-iorquino Museum of Modern Art. Gudmundur Gudmundsson Erró nasceu na Islândia em 1932, estudou no Icelandic College of Arts and Crafts e aos 20 anos partiu para Oslo com o objectivo de continuar os seus estudos. Nos anos 50 decidiu explorar a Europa, viajando por Espanha, Itália, Alemanha e França, países que abriram os seus horizontes a nível artístico. Em 1954 estudou na Florence Academy of Art e um ano mais tarde na School of Byzantine Mosaic Art em Ravenna, o que muito influenciou o seu trabalho a partir de então. «Encaro a minha obra como um pot pourri de estilos e de linguagem pictórica, o que muito se deve também aos dois anos que passei a estudar na escola em Ravena. Aprendi a fazer mosaicos e a restaurá-los, o que muito me influenciou», revelou Erró à Umbigo. Os anos 50 também marcaram a sua arte. Devido à sua curiosidade pelos políticos de esquerda passou algum tempo preocupado com o pós-guerra e com a chegada da sociedade de consumo à Europa. Em 1957 decide viajar para Israel onde passou oito meses e é nesta altura que o artista se começa a interessar por colagens. Em 1958 muda-se para Paris e é lá que inicia esta sua nova expressão artística.

Na série Radioactivity, que fala sobre o crescimento do holocausto nuclear, Erró mostra como a tesoura e a cola se transformaram na sua principal ferramenta de trabalho atacando a sociedade do espectáculo.

Apropriava-se de elementos da cultura de massas transformando- os em arte. A postura era misturar várias informações e ironizar.

«Coleccionava notícias, fotografias e todo um leque de imagens e de repente ficava aflito porque tinha muita informação de diferentes fontes e a selecção tornava-se complicada. Comecei depois por interessar-me pela propaganda política russa, e depois pela chinesa, pelo socialismo e pelo comunismo e fiz uma série de pinturas sobre estes temas», disse o artista. Outro momento crucial na vida de Erró foi a descoberta da arte pop americana. O impacto de Warhol, Wesselman e Rosenquist foi muito importante na sua vida. «Foi das melhores épocas e nada similar voltará a ter lugar. Estava tudo a acontecer, nós não tínhamos dinheiro e era tudo muito barato. Quando fui para Nova Iorque conseguíamos viver com menos de 100 dólares por mês, incluindo a renda. O movimento figurativo nasceu ao mesmo tempo que a arte pop nos Estados Unidos, mas o figurativismo era muito mais complicado porque a arte pop é baseada em pequenos detalhes, como uma mão, uma cabeça, extremamente simplificada. Aliás o nome pop é muito bom porque é mesmo como um pop que surge. O figurativismo era muito mais complicado e as pessoas em França não nos viam com bons olhos, éramos políticos e punks ao mesmo tempo. Ninguém nos defendia e as galerias não nos queriam. A arte pop começou a ter algum sucesso no início dos anos 60, o que nos ajudou e fez acreditar que era possível sobreviver com o que fazíamos. Era muito amigo de Warhol, Rosenquist e Lichtenstein, eram pessoas com uma mente muito aberta. Ninguém se importava de vender uma pintura por 50 dólares. Fazíamos festas maravilhosas na Factory, e havia sempre algo de novo a acontecer. Era fantástico», contou Erró.

A sua série American Interior (1968), é composta de enormes pinturas que não só são as mais explícitas como também representam o clímax de uma década de trabalho. Tornaram- se emblemáticas da viragem política em França. Uma delas foi capa da Art et Contestation (1969), uma importante antologia de artigos escritos por críticos culturais franceses. Nos anos 70 Erró produzia as suas Chinese Paintings, uma grande série com representações da era de Mao Tse Tung. Desde o final dessa década que o artista voltou a sua arte para o imaginário vindo dos livros de comics. «Sou muito inspirado por esta arte. Acho que os autores de banda desenhada têm muito talento e deveriam ser apreciados como artistas».

Erró tem uma grande ligação com Portugal. Aliás, quem passa na estação de metro do Oriente não fica indiferente ao grandioso mural em azulejo repleto de B.D por todos os poros. «Foi um desafio que me deu um grande prazerem fazer». Tem também um outro mural em azulejo na praça interior do VIP ART'S Hotel e Business Center, no Parque das Nações, em Lisboa. Recentemente teve uma exposição alucinogénica intitulada Azulejo a Óleo na Galeria António Prates, em Lisboa. Uma estrutura completamente diferente da que o nosso imaginário está habituado. Metade azulejo clássico, metade banda desenhada numa série que não deixa ninguém indiferente. Segundo escreveu a crítica de arte Maria João Fernandes. «Mil imagens labirinto, rostos de um caos e de uma desordem contemporâneos da nossa ansiedade que não se satisfaz com a luxuriante torrente dos sentidos, écran de um desejo sem fim. Imagens da cultura com um sabor português, na evocação dos azulejos do Palácio Fronteira e imagens de uma civilização que vive a experiência da fragmentação e da explosão de uma identidade há muito perdida com a distância que o conhecimento racional impõe em relação à natureza, factor de unidade e fonte de poesia».

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