A propósito da inclusão indevida de escultura de Rui Chafes no projeto “História com Voz”
A propósito do projeto História com Voz, que anexou um texto em áudio à escultura Sou como tu (2008) de Rui Chafes, sem o consentimento do mesmo, a Umbigo posiciona-se ao lado da comunidade artística que condena o ato descuidado para com a obra e com o artista.
Levada a cabo pela Junta de Freguesia de Santo António e o Centro Nacional de Cultura, a proposta de animar figuras representadas em estátuas pela cidade, através de um conteúdo complementar para leitura em QR code, acabou por atribuir à escultura de um dos maiores nomes da arte portuguesa uma narrativa à qual nem a obra, nem o artista, deveriam ser associados.
Com um corpo de trabalho e reflexão reconhecido mundialmente, ao longo da sua prolífica carreira Rui Chafes já realizou inúmeras exposições individuais por todo o mundo, passando por galerias e museus de renome como o Centre Pompidou, a Fondation Gulbenkian ou a Fondazione Centro Giacometti, tendo, inclusive, sido um dos representantes de Portugal na 46.ª Bienal de Veneza e na 26.ª Bienal de São Paulo. Para além de Lisboa, as esculturas do artista fazem parte do espaço público de diversas cidades, em diferentes países. No dia 1 de fevereiro de 2024, a Universidade Católica Portuguesa (UCP) atribuiu a Rui Chafes o grau de Doutor Honoris Causa.
Enquanto meio de comunicação social e enérgica dinamizadora do pensamento sobre a arte e a cultura em Portugal, a Umbigo endossa a perspectiva de que qualquer discurso produzido sobre a obra de arte deve levar em consideração as complexidades do seu sentido original e a autoria de quem a fez nascer. Aspectos estes que, neste caso, são ainda agravados pelo facto de Rui Chafes ser um profissional vivo, residente em Lisboa, e que a “voz” acrescentada à sua escultura, antes de se assumir como um discurso indireto sobre tal trabalho, pretende-se passar como um discurso direto do mesmo. Em qualquer uma das hipóteses, deve prevalecer o respeito aos direitos de propriedade intelectual e à fruição da arte – que deve sempre ser levada à sério.