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Álvaro Siza Vieira em expansão, em Serralves

Álvaro Siza Vieira é uma figura marcante na arquitetura contemporânea, a nível nacional e internacional. Tem uma presença constante, com uma produção contínua e ímpar, que se materializa num corpo de trabalho de valor incalculável. O seu mais recente projeto, a Ala Álvaro Siza, em Serralves, dá continuidade e enriquece a admirável obra do arquiteto. Dotada de uma notável qualidade formal, este edifício é expressivo tanto de uma singular mestria disciplinar quanto de uma sublime sensibilidade estética. Será, por certo, uma das suas maiores obras-primas.

Trata-se da nova ala do Museu de Arte Contemporânea de Serralves, que resulta e celebra a relação longa e próxima entre a instituição e o arquiteto. A sua denominação como Ala Álvaro Siza presta, ao seu autor, uma merecida homenagem. O edifício fortalece e realça, igualmente, um outro vínculo: entre o museu, compreendendo neste a arte que acolhe, e a natureza. A nova ala surge como que esculpida no Parque, integrada na sua vegetação, abraçada pelas árvores. Um dos objetivos do arquiteto fora, justamente, que o edifício não se evidenciasse, mas, pelo contrário, se inscrevesse na sua envolvente, em continuidade e semelhança à edificação principal do museu. Ergue-se, assim, uma obra de arquitetura em plena harmonia com o meio ambiente. Face à crescente preocupação com o impacto da arquitetura na sustentabilidade e na crise ambiental, sublinho a urgência de nutrir este elo, o da relação com a natureza, e o respeito por ela.

Recordo que o pai de Álvaro Siza, Júlio Siza Vieira, era escultor, e a obra do filho reflete a proximidade e a influência desse campo artístico. Observando os inúmeros projetos do arquiteto, verifica-se, precisamente, emergirem da articulação entre o objeto arquitetónico e o escultórico, sendo que o novo projeto será um dos seus mais belos exemplos do encontro e do cruzamento entre essas duas disciplinas e as suas respetivas expressões formais e plásticas. Com efeito, mais do que um edifício, trata-se de um monumento.

Para além da amplitude da área e do seu elevado pé direito, que suportam e evidenciam a grandeza desta construção, observem-se, sobretudo, os inúmeros recortes e volumetrias habilmente desenhados entre as paredes e os tetos. Também a luz, as janelas, a relação com o exterior, a comunicação e a passagem entre as diversas salas, contribuem para a fluidez e a abertura do espaço, princípios estes característicos e transversais à prática de Siza Vieira. São esses mesmos elementos que orientam e conduzem o olhar e o corpo, numa cadência magnética, de certo modo poética.

A entrada nesta nova ala faz-se a partir do edifício principal do museu, sendo que os dois se encontram ligados. A transição entre um espaço e o outro é orgânica, até porque partilham os mesmos materiais: no exterior, a cobertura de camada de godo e o betão, e no interior, o mármore e os pisos e acabamentos em madeira. No entanto, e recorrendo às palavras do arquiteto, “localizada na fachada do novo edifício, imediatamente oposta à ponte que liga com o atual Museu, observa-se uma janela especial, de formato triangular, como que chamando a atenção para o facto de estarmos a entrar num edifício diferente“.

Sobre a finalidade da nova ala, irá apresentar, no primeiro piso, exposições da Coleção de Serralves e, no segundo, mostras de arquitetura, sublinhando-se e fortalecendo-se, também aqui, a ligação e o diálogo entre os dois campos. Conta-se mais de 44% de espaço expositivo, ao qual se acrescenta, no piso inferior, mais 75% para depósito, tanto para novas aquisições como para as coleções de Serralves, da CACE, do BPP, entre outras, tais como os arquivos do próprio Siza Vieira.

A inauguração desta nova ala como área de exposições está agendada para o início de 2024, com duas mostras, uma da Coleção de Serralves e uma dedicada à obra do arquiteto. Não obstante, a ala encontra-se aberta para visitar, ocasionando-se uma oportunidade única para descobrir, contemplar e experienciar esta magnífica obra de arquitetura na sua plenitude geométrica e tocante luminosidade.

Entre o Museu de Arte Contemporânea, inaugurado em 1999, a Casa de Cinema Manoel Oliveira, em 2019, que acolhe o acervo do respetivo cineasta, a Casa dos Jardineiros, em 2021, situada no Parque, e, no mesmo ano, a recuperação da Casa de Serralves, para melhor a adequar à exibição de arte, consolida-se um impressionante conjunto de edifícios que institui Serralves enquanto o lugar onde se reúnem mais projetos do arquiteto.

Álvaro Siza Vieira é o arquiteto moderno português por excelência, com um ímpar e extenso legado. Com sessenta e oito anos de carreira, desde 1955, quando se formou pela Escola Superior de Belas-Artes do Porto, é o mais prestigiado e premiado arquiteto do país, destacando-se o Prémio PRITZKER que recebeu, considerado o Nobel da Arquitetura. As suas obras são atemporais, de uma inultrapassável contemporaneidade, constituindo objetos de eternos deslumbramento, interesse, estudo e referência. São já várias as gerações que se inspiram, educam e cujas ideias são enformadas pela sua obra, e inúmeros os que o intitulam de mestre. Indubitavelmente, a arquitetura portuguesa é, em grande medida, Siza Vieira.

Constança Babo (Porto, 1992) é doutorada em Arte dos Media e Comunicação pela Universidade Lusófona. Tem como área de investigação as artes dos novos media e a curadoria. É mestre em Estudos Artísticos - Teoria e Crítica de Arte, pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, e licenciada em Artes Visuais – Fotografia, pela Escola Superior Artística do Porto. Tem publicado artigos científicos e textos críticos. Foi research fellow no projeto internacional Beyond Matter, no Zentrum für Kunst und Medien Karlsruhe, e esteve como investigadora na Tallinn University, no projeto MODINA.

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