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Apertura Madrid Gallery Weekend 2023

A Apertura Madrid Gallery Weekend apresentou a sua 14ª edição entre os dias 14 e 17 de setembro, inaugurando a temporada de exposições da cidade com o evento que reuniu as 56 galerias da Arte Madrid (Associação das Galerias de Arte Moderna e Contemporânea de Madrid) bem como museus e livrarias numa ampla programação, nos convidando a explorar a diversidade de práticas que espelham a cena artística nacional e internacional.

Ao caminhar pelos bairros de Lavapiés e Salesas, era possível observar a movimentação em torno do evento que, para além do contexto comercial, busca ampliar o público da arte contemporânea, transformando a cidade num polo não apenas de grandes nomes tradicionais da arte – Madrid é conhecida por concentrar algumas das obras mais famosas do mundo – como também de criação contemporânea.

Em meio a diferentes tipologias e discursos, surgem diálogos e temáticas comuns entre os artistas – estabelecidos e emergentes – que encontramos no percurso das exposições. A utilização do humor e da ironia como ferramenta de ressignificação de símbolos em torno de questões históricas e sociopolíticas aparece na F2 Galería, com a exposição Mecanismos del humor do artista espanhol Pere Llobera e na The RYDER, com La Yegua de Santiago, da artista chileno-peruana Ivana de Vivanco.

Pere Llobera apresenta um “ensaio sobre pintura”, onde desenhos, telas e objetos espalhados e sobrepostos pelo chão e paredes da F2 Galería representam o estúdio do artista, que mistura tradição e humor através de personagens de pinturas históricas associadas a ícones da cultura pop. Com narizes de palhaço oferecidos ao público na entrada, a provocação ao sistema artístico antecipa a quebra de expectativa em relação ao que se encontra habitualmente no ambiente das galerias e instituições de arte.

Ivana de Vivanco desenvolve uma instalação site-specific na The RYDER, que se localiza num antigo estábulo de cavalo. La Yegua de Santiago é uma subversão da ideia do herói no cavalo branco a partir da lenda de Santiago, com o cavalo do apóstolo padroeiro da Espanha a transfigurar-se numa égua cor-de-rosa. Utilizando a ironia e a teatralidade como estratégias para abordar temas complexos e estruturais da sociedade, como a colonização e a dominação masculina, a iconografia reinventada pela artista celebra a libertação e o protagonismo da Égua de Santiago em sua própria vida.

Tema que atravessa gerações, a Galeria NoguerasBlanchard apresenta A sense of possibility, de Nancy Spero, com trabalhos que fazem parte dos últimos 30 anos de produção da artista e ativista norte-americana. A experiência feminina é central em seu trabalho, que trata também de assuntos como privilégio ocidental e abuso de poder. Expandindo milhares de anos de história, Nancy Spero elabora uma linguagem a partir de motivos da arqueologia universal, numa repetição de padrões que confronta a hegemonia histórica masculina, colocando a mulher como protagonista.

A Galeria NF/Nieves Fernández apresenta La cárcel a cielo abierto, do artista mexicano Moris, que reflete sobre migração e poder político e económico. Caixas utilizadas pelo Banco do México para transporte de dinheiro desenham as fronteiras do país, conhecidas pelos perigos e tensões encontrados por quem pretende chegar aos Estados Unidos. Colocando em questão a ideia de liberdade, o artista aponta o território como uma prisão e o estado de guerra permanente das fronteiras, retratando a violência e denunciando a realidade social do México, herança colonial comum a muitos países do sul global.

Outra sala da Galeria NF/Nieves Fernández abriga uma seleção de obras da artista portuguesa Ângela Ferreira, como parte da programação do Cultura Portugal Gallery Walks. Este é o primeiro ano da colaboração entre a Embaixada de Portugal com a Arte Madrid e a ARCO Gallery Walks, no qual foram desenhados quatro itinerários que contavam com 23 artistas portugueses apresentados em diferentes galerias durante a Apertura Gallery Weekend.

Em torno da ecologia, a Juan Silió Galería exibe I danced myself out of the womb, de Belén Rodriguez. A artista espanhola cria um retrato da floresta a partir das formas e texturas de tecidos tingidos com pigmentos naturais e trazendo a própria vegetação para a galeria. Na Galeria Lucía Mendoza, a exposição Producing world among nets and thickets, das artistas Bárbara Fluxá e Lucía Loren, apresenta elementos do ecossistema e estruturas fractais que refletem as redes de interconexão e interdependência entre os mundos humano e não-humano, chamando a atenção para a proteção da natureza.

A Galeria Carlier | Gebauer apresenta Luz, a primeira exposição da artista sueca Cecilia Edefalk na Espanha. Produzida em seu estúdio em Estocolmo entre dois grandes projetos, existe algo de despretensioso que vem como um respiro na exposição contemplativa. Um olhar espiritual para a natureza, no qual observamos nas pinturas de pequeno e médio formato as luzes da alvorada e do entardecer, quando o sol nunca está em seu ápice.

Após uma visita guiada pela Coleção do Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofía, entre as vanguardas europeias e os seus cruzamentos de influências, o acaso trouxe uma surpresa: Un acto de ver que se despliega, exposição da Coleção Susana e Ricardo Steinbruch. Com curadoria de Manuel Borja-Villel em colaboração com Beatriz Martínez Hijazo, a mostra conta com diversos artistas brasileiros, muitos que fizeram parte do Movimento Neoconcreto assim como artistas contemporâneos como Jonathas de Andrade e Fernanda Gomes. Também estão presentes na exposição artistas do Leste Europeu que participaram dos movimentos antiarte da antiga Iugoslávia, saindo da narrativa e do habitual eixo Europa-Estados Unidos, e trazendo novas histórias.

A Apertura Madrid Gallery Weekend propõe uma imersão cultural a céu aberto que possibilita descobrir, pelas ruas e edifícios da cidade, as múltiplas práticas – entre tendências e relações – que coexistem na arte contemporânea.

Ana Grebler (Belo Horizonte - Brasil) é artista, curadora e escritora. Graduada em Artes Plásticas pela Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG - Escola Guignard) e pós-graduada em Curadoria de Arte na Universidade Nova de Lisboa (FCSH). Participou de exposições coletivas no Brasil e organizou as exposições Canil (2024), Deslize (2023) e O horizonte é o meio (2022), em Lisboa. Colabora com a Umbigo Magazine com ensaios, críticas e entrevistas, e atua nas parcerias internacionais da plataforma. Na intersecção de práticas, reflete sobre a cultura visual contemporânea criando diálogos e imaginários entre espaços e processos artísticos em cruzamento. Atualmente vive e trabalha em Lisboa.

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