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Toad on the Moon de Hugo Brazão, na Galeria da Casa A. Molder

A exposição Toad on the Moon, do artista Hugo Brazão, patente na Galeria da Casa A. Molder, é composta por duas salas. A primeira sala, começa com a presença de uma placa retangular, feita em Jesmonite, pendurada sobre a parede. A peça alude a uma ideia de pequena paisagem. 

Sobre a superfície da placa, delimitada a meio, vislumbra-se o desenho de um horizonte, descrito, na parte superior, por um forte astro multicolor, em fundo amarelo, e na parte inferior pelo que aparenta ser as margens de um pequeno rio. Temos verdes, laranjas, amarelos, dispostos de modo cru, generoso e opaco, numa confluência que, sem inibição, evoca uma celebração da cor. 

As formas, que se posicionam nas margens, parecem igualmente aludir a animais. São definidas através de um contorno muito preciso, colorido, que o artista realiza, desenhando a linha sobre a superfície. O que fica é a sensação de cor, mas ao mesmo tempo, de materialidade das formas que se destacam da superfície em relevo, e adotam uma posição de autonomia. O que se observa também, num jogo percetivo, é a sensação de abstração dos elementos, como linha, ponto, mancha, ou ainda, como coisa, com relevo, tridimensional.

Esta paisagem é um prelúdio, uma antecâmara, de preparação, para uma sala maior.

O acesso à segunda sala é feito por meio de uma entrada encimada por um arco de volta perfeita, elemento arquitectónico que confirma o modo como os atributos e aspereza do espaço, impõem a sua marca, e são parte integrante, na instalação de Hugo Brazão.

Antes de o espectador penetrar nos enleios da instalação, ainda na primeira sala, já antevê o assombro de cor e a forma que se anuncia.

Cada canto, cada parede da sala entra na assemblage do artista, faz parte dos equilíbrios e tensões formadas na obra, mesmo as que, aparentemente, parecem não preconizar uma relação direta com os elementos deixados no espaço. Existem paredes nuas, pejadas, algumas, por pregos oxidados e tintas descarnadas. Acometidas pelo tempo, porém, formam uma moldura que contrasta com as formas macias e arredondadas que o artista desenvolveu, e colocou no solo da galeria.

Uma flor, em forma de lótus, surge posicionada sobre o chão, orlada por pétalas em tecido, de diferentes cores. Ao centro pode ver-se uma amálgama de gesso, a sugerir talvez uma lua, ou um casulo, evocativo de algo que inicia, ou está prestes a nascer.

Mas a flor não permanece isolada sobre o solo. Uma trave de madeira une-a aos vértices opostos da sala, numa longa diagonal. Desenha uma trajectória que se ergue até acabar engastada no teto, e intercetada por tábuas rectangulares de madeira, dispostas como se se tratassem de elementos de sinalética. Uma tábua aponta para a esquerda, ou, dependendo do lugar onde estiver o espectador, para a direita. Outra tábua dirige o olhar para a direita. A primeira é fixada numa posição ortogonal relativamente à trave do chão, a segunda é fixada na mesma posição acompanhando o sentido da diagonal que se encontra no solo.

Em toda a instalação de Brazão impõe-se o espaço, os seus limites, e a possibilidade de os transpor. Aponta direções, mas também constrangimentos. Impele o visitante a vivenciar o interior, ou a fazer parte dele, e a experienciar esse mundo de cheios e vazios, ou a reconhecer os aspetos hierárquicos dos elementos que compõem essa estrutura presente na exposição.

Também temos a cor, tratada nos moldes tradicionais da pintura – inscrita no plano – e instigadora de uma experiência imersiva do espectador, onde ele mesmo vai tomar consciência do espaço envolvente, no sentido do “campo alargado”, que referia Rosalind Krauss. Ou ainda no seio da multidisciplinariedade, onde, a pintura, a escultura e a arquitectura surgem trabalhadas, em simultâneo, e trespassam a obra artística.

O aspecto fantasioso do título, que acompanha a exposição Toad on the Moon, aponta para um tratamento onírico dos elementos. Temos, sobre o solo, o que nos parece uma lua, e depois ripas e traves que, pelo seu percurso, ou orientação, perpassam o lugar, e procuram conduzir o nosso olhar, primeiro para cima, e depois para os lados. Ligando-nos a um plano mais espiritual da arte ou, por outro lado, a uma dimensão engastada no divino.

O artista coloca o espectador no centro do debate: a arte como incubadora de afectos, a arte como desencadeadora de reflexões ambientais, ou, por outro lado, a arte como efeito hipnótico, que contribui para uma tentativa de evasão, no sentido de uma outra realidade, ou um outro lugar. Um lugar do sonho, a que se referia um dia Miró, quando falava do seu processo criativo e do seu atelier.

A exposição Toad on the Moon, está patente na Galeria da Casa A. Molder até 14 de outubro.

Carla Carbone nasceu em Lisboa, 1971. Estudou Desenho no Ar.co e Design de Equipamento na Faculdade de Belas Artes de Lisboa. Completou o Mestrado em Ensino das Artes Visuais. Escreve sobre Design desde 1999, primeiro no Semanário O Independente, depois em edições como o Anuário de Design, revista arq.a, DIF, Parq. Algumas participações em edições como a FRAME, Diário Digital, Wrongwrong, e na coleção de designers portugueses, editada pelo jornal Público. Colaborou com ilustrações para o Fanzine Flanzine e revista Gerador. (fotografia: Eurico Lino Vale)

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