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Back to Back, Front to Front, de Toni Grilo

Pensar o design urbano é entrar no pulsar interior da cidade, as suas artérias, os seus fluxos, as relações humanas, a aspereza dos becos esconsos, o calor dos recantos, o conforto das vielas. Os ruídos e os cheiros, o movimento dos transeuntes, ou a pressa de quem se desloca para o trabalho, ou ainda de quem se esgueira agilmente para não chegar tarde ao domicílio, porque a cidade é, também ela, feita dessas horas que inspiram cuidados.

Há uma relação algo telúrica entre o mobiliário urbano e o que o envolve. O edifício defronte, ou que o circunda, com as suas particularidades, dita a funcionalidade desse mesmo produto urbano que foi estabelecido no lugar. Se for um edifício histórico, e se se tratar de um banco onde podemos sentar, para descansar ou aguardar alguém, o equipamento não se resume apenas a um elemento de repouso, mas a um instrumento que permite a contemplação, a actividade lúdica, a experiência, a reflexão.

O design urbano é um elemento agregador entre os componentes da cidade, e propõe apoiar a vida contemporânea. Na sua missão de guia e conector de espaços, ou edifícios, procura harmonizar a vida das pessoas, e conferir-lhes significados, no sentido humanizador da palavra. Numa urbanidade cada vez mais agreste e desprovida de afetos torna-se imperioso escutar as pessoas, e o modo como vivem a cidade e se relacionam com os outros.

Por vezes os habitantes são os melhores juízes, e determinam o que faz mais falta, nas ruelas, nas praças, nos recantos da cidade. Porque são eles quem mais as vive e usa.

O designer Toni Grilo, por altura da Lisbon Design Week instalou um complexo de assentos simétricos, ajustáveis entre si, em forma de meia lua, no amplo passeio em frente à fachada da estação de comboios do Cais do Sodré. Trata-se de um conjunto de bancos que, unidos entre si, configuram trajectos em liame, e cuja estrutura, composta por tubos metálicos de cor vermelha, contorce-se no espaço, até formar, desenhado no solo, um subtil coração, a evocar o símbolo icónico de Viana, e de Portugal.

A instalação de bancos depressa foi assenhoreada pelos transeuntes. Indivíduos a ler, senhoras idosas a descansar, jovens a aguardar um encontro. Rapidamente se percebeu que há muito para dar naquele lugar da cidade, e que precisava de um tempo de pausa, em contraponto às características da praça, pródiga em agitação, transitoriedade, e fluxo permanente de passageiros.

Embora existam lugares de repouso, e de recreio, como em algumas esplanadas presentes na praça, onde a música se faz sentir, na verdade o cais do Sodré presta-se a ser um lugar que quase se torna neutro, sem vestígios de permanência. E é aí que reside o encanto da peça de Toni Grilo. Além de todos os outros encantos de que se reveste.

Com as suas formas longilíneas, permite que os transeuntes recuperem o seu tempo, e a poesia dos dias.

Nesta acção estão contempladas a revitalização onírica do espaço, a revalorização da relação entre edifícios, a revigoração da relação entre edifícios e espaço público, e a conexão entre pessoas.

Back to Back, Face to Face, de Toni Grilo configura justamente essa conexão entre os indivíduos, e alarga-se a um conceito mais social do design. O designer concebeu a peça para “ser popular e para usufruto inequívoco das pessoas”.

Back to Back, uma peça inegavelmente escultórica, além de banco público, assenta também numa ideia híbrida de peça de design que se expande até causar um impacto estético. É uma peça de design, mas também pode ser uma peça para fruir, enquanto objecto artístico. Os tubos metálicos curvos, em aço inox, começam o seu percurso extrudido, primeiro pintados de vermelho, e depois culminam, num dourado subtil e leve, a evocar a mais fina filigrana portuguesa.

A peça escultórica vai permanecer no local até ao final do verão, mas é desejo do designer que aí resida permanentemente: Desde o primeiro dia tenho recebido mensagens e testemunhos para tal: os Lisboetas adoptaram mesmo a peça”.

Carla Carbone nasceu em Lisboa, 1971. Estudou Desenho no Ar.co e Design de Equipamento na Faculdade de Belas Artes de Lisboa. Completou o Mestrado em Ensino das Artes Visuais. Escreve sobre Design desde 1999, primeiro no Semanário O Independente, depois em edições como o Anuário de Design, revista arq.a, DIF, Parq. Algumas participações em edições como a FRAME, Diário Digital, Wrongwrong, e na coleção de designers portugueses, editada pelo jornal Público. Colaborou com ilustrações para o Fanzine Flanzine e revista Gerador. (fotografia: Eurico Lino Vale)

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