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Wanderlust: Exposição Coletiva na Artes – Mota Galiza (Porto)

Wanderlust patente na Artes – Mota Galiza, com curadoria de Carlos Magalhães Pinto e da diretora da Galeria Nave, Mercedes Cerón, apresenta trabalhos de Arturo Comas, Francisco Correia, João Motta Guedes, Jon Gorospe, Martim Brion, Susana Rocha e Teresa Murta. A primeira mostra coletiva destes sete artistas no Porto, desenvolve-se a partir da noção de desejo do artista de rumar perante o desconhecido, numa procura errante pela incerteza na criação da obra, através de um conjunto de práticas artísticas, que embora distintas, vão convergindo pela temática ao longo do espaço expositivo.

O título da exposição evoca essa ideia de desejo, ou sonho de viajar sem destino, por entre paisagens utópicas, caminhando em direção ao incógnito, como uma vontade saudosista e plena de prazer de se descobrir algo que não se conhece. Segundo a folha de sala: “A um nível mais profundo, pode ser entendido como uma busca de natureza filosófica ou religiosa, que impele o indivíduo como uma locomotiva que não pára até que tenha alcançado a sua “estação”, que pode ser um lugar geográfico, uma descoberta filosófica ou uma iluminação religiosa”. Pressuposto, em Wanderlust, cada prática artística destaca-se individualmente, quer pelo médium, linguagem, conceito, ou disposição no espaço, porém tendendo por esta noção universal de fascínio e deslumbramento pelo desconhecido, ou por uma espécie de pulsar criativo, ou questionamento latente acerca da existência, possível preceito na conceção de um trabalho artístico.

Against the odds (2013) e The wind in my hair will not take me there (2013) de Susana Rocha, apresentam-se como disrupções no espaço, quer pelos materiais contrastantes, desde o metal, ao tecido, pelas formas tanto sinuosas, como retas, pelos elementos simbólicos contraditórios, como a faca, a corda, ou o cabelo, mas também pelos enunciados de múltiplos significados e interrogações no que diz respeito à poética da condição humana. Todavia, Untitled (01B) (2022) de Arturo Comas, coloca-nos em suspenso, pelo modo como simplesmente percecionamos uma cadeira portuguesa da ARCALO, com as duas pernas dianteiras pousadas em duas latas de cerveja Sagres. A materialização do absurdo e a subversão da lógica da utilidade dos objetos, que estando associados ao descanso e ao lazer, são entendidos, como estando em movimento, ou desequilíbrio, proporcionando uma sensação diferente de duração, uma paragem no tempo. Por outro lado, Cube 5 (2018) de Martim Brion, transmite ritmo e movimento, numa ilusão visual, em que a partir de cada um dos cubos azuis com formas geométricas brancas, é possível fazer-se infinitas variações, como se fosse um jogo tanto físico, como mental. Já num dos cantos do espaço expositivo, Jon Gorospe apresenta De Magnete (black) (2018) e De Magnete (white) (2018), duas fotografias de um forte lirismo, quer pelo negro, como o branco, quer pela concretude de um céu estrelado, como pela abstração de uma paisagem, resultado de um projeto em torno da investigação On the Magnet and Magnetic Bodies, and on That Great Magnet the Earth (1600) do médico e cientista inglês William Gilbert, que descobriu que a direção para a qual as bússolas apontavam não era causada pelo seu material, mas pelo facto de a Terra ser magnética. Mesmo ao lado, se Freedom Song (2022) de João Motta Guedes, fotografia com bolas de sabão sobre um céu azul, traduz um certo onirismo, ou sensação de liberdade, Just Keep Walking (if you can) (2022), do mesmo autor, constituído por dois blocos de granito, com tiras de havaianas, dispostos no chão, questiona paradoxalmente a possibilidade, ou impossibilidade de sonharmos com outros rumos, destinos, ou de concretizarmos o imaginado. A partir de um outro ponto de vista, as pinturas de Teresa Murta, metamorfoseiam a realidade, através de objetos concretos que se descontextualizam na tela, em mundos imaginados, quimeras, ou memórias do subconsciente, possibilitando uma divagação pelas nossas imagens mais remotas. Noutra sala, Temps théorique (Météorique), Temps théorique (retrovisor rear mirror) e Temps théorique (letreiro sign) (2023) de Francisco Correia, ilustra uma espécie de viagem, através de três noções temporais e perspetivas, materializadas tridimensionalmente no espaço expositivo, pelo meio de um modelo de um carro num plinto preto com brilho, que reflete as outras obras e o observador, o desenho de um espelho retrovisor em que vemos o condutor, e uma espécie de reclamo luminoso com a inscrição Temps théorique, fitando a conceptualização do próprio trabalho em si mesmo. Por último, Untitled (How small a thought it takes – after Wittengenstein and Steve Reich) (2022) de João Motta Guedes, instalado num ambiente escuro, apenas com uma luz pontual que revela uma lápide em mármore com a descrição How small a thought it takes to fill a whole life?, com um ramo de flores prostrado, ironicamente aloca sobre o cúmulo da existência, através de uma dupla citação, primeiro escrita pelo filósofo Wittgenstein e depois pelo compositor Steve Reich, numa peça musical.

Wanderlust, termo que lembra de imediato as grandes narrativas de viagens ao longo da História, cultura e arte ocidentais, tendo como auge o pensamento Romântico oitocentista, aludindo ao espírito do Grand Tour, nesta exposição, pela temática expressa, possibilita uma reflexão no contexto da contemporaneidade, acerca deste desejo de viajar, ou de imaginarmos outros mundos e possibilidades, até mesmo sobre a necessidade de continuarmos à procura do deslumbramento através de novas experiências.

Wanderlust está patente na Artes – Mota Galiza até 29 de abril de 2023.

Ana Martins (Porto, 1990) é investigadora doutoranda do i2ADS – Instituto de Investigação em Arte, Design e Sociedade, na qualidade de bolseira da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (2022.12105.BD). Frequenta o Doutoramento em Artes Plásticas da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, tendo concluído o Mestrado em Estudos de Arte – Estudos Museológicos e Curadoriais pela mesma instituição. Licenciada em Cinema pela ESTC do IPL e em Gestão do Património pela ESE do IPP. Foi investigadora no Projeto CHIC – Cooperative Holistic view on Internet Content apoiando na integração de filmes de artista no Plano Nacional de Cinema e na criação de conteúdos para o Catálogo Online de Filmes e Vídeos de Artistas Portugueses da FBAUP. Atualmente, desenvolve o seu projeto de investigação: Arte Cinemática: Instalação e Imagens em Movimento em Portugal (1990-2010), procedendo ao trabalho iniciado em O Cinema Exposto – Entre a Galeria e o Museu: Exposições de Realizadores Portugueses (2001-2020), propondo contribuir para o estudo da instalação com imagens em movimento em Portugal, perspetivando a transferência e incorporação específica de elementos estruturais do cinema nas artes visuais.

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