Primeira Assembleia de Pensamento de Fertile Futures
Teve lugar no Palácio Sinel de Cordes em Lisboa, nos dias 28 e 29 de janeiro a primeira Assembleia de Pensamento de Fertile Futures. O evento lançou a Representação Oficial Portuguesa na 18ª Exposição Internacional de Arquitectura na Bienal de Veneza 2023, organizada e comissariada pela Direção-Geral das Artes, da qual a Umbigo é parceira editorial. Fertile Futures conta com curadoria de Andreia Garcia e Ana Neiva e Diogo Aguiar como curadores adjuntos, e dá resposta à convocatória de Lesley Lokko, curadora da 18ª Exposição Internacional de Arquitectura – La Biennale di Venezia 2023, que tem como título e tema O Laboratório do Futuro.
Centrando-se na problemática da água doce, recurso natural vital e escasso, Fertile Futures incita a uma reflexão acerca da sua gestão, reserva e transformação. Uma discussão urgente e profundamente necessária cuja abertura ao público é essencial. Andres Lepik, director do Architecture Museum da Technische Universität de Munique e antigo curador do Departamento de Arquitectura e Design do MoMA em Nova Iorque, é um dos consultores de Fertile Futures e lançou nesta primeira Assembleia de Pensamento a premissa de que “Architecture exhibitions are not a goal for itself. Based on critical curatorial process they address social, political, environmental and other challenges related to the design profession to enhance information, discourse, reflection with the audience. They aim for change.” Fertile Futures procura alcançar isso mesmo, uma mudança.
Focando-se no território português onde a escassez de água doce acarreta consequências dramáticas tais como o agravamento da aridez dos solos e o aumento exponencial de risco de incêndios ou o aumento dos efeitos de cheias e de inundações, elege sete hidrogeografias distintas e desafia jovens arquitetas e arquitetos a colaborar com especialistas de outras áreas de conhecimento e a apresentar propostas para um “futuro fértil”, “para um amanhã mais sustentável, saudável e equitativo”, lê-se na folha de sala que acompanhou o evento.
Os sete casos de estudo baseiam-se na ação humana sobre recursos hídricos, naturais e finitos: o impacto da Gigabateria na bacia do Tâmega (Space Transcribers + Álvaro Domingues); a quebra da convenção no Douro Internacional (Dulcineia Santos Studio + João Pedro Matos Fernandes); a extração mineira no Médio Tejo (Guida Marques + Érica Castanheira) ; a imposição de interesses na Albufeira do Alqueva (Oficina Pedrêz + Aurora Carapinha); a anarquia no perímetro de rega do Rio Mira (Corpo Atelier + Eglantina Monteiro); a sobrecarga das lagoas na Lagoa das Sete Cidades (Ilhéu Atelier + João Mora Porteiro) e o risco de aluviões nas Ribeiras Madeirenses (Ponto Atelier + Ana Salgueiro Rodrigues).
A primeira Assembleia de Pensamento marca o arranque deste projeto de exposição que integrará cinco eventos semelhantes, abertos ao publico e de acesso gratuito, momentos de debate, sensibilização e mediação, a decorrer em Lisboa, Veneza, Braga, Faro e Porto Santo. Contou com as intervenções de Álvaro Domingues, Ana Salgueiro Rodrigues, Ana Tostões, Andres Lepik, Eglantina Monteiro, Érica Castanheira, Francisco Ferreira, João Mora Porteiro, João Pedro Matos Fernandes, Luca Astorri, Margarida Waco, Marina Otero, Pedro Gadanho e Pedro Ignacio Alonso.
A discussão em torno do tema convocado por Fertile Futures abordou perspetivas que abraçam diferentes geografias a nível mundial não só relativas à gestão do recurso natural da água doce e de todas as questões sociais, económicas e políticas inerentes a essa gestão mas também relativas à disciplina da curadoria e à importância do papel da arquitetura para a resolução de problemas numa escala territorial.
Luca Astorri fundador do atelier AOUMM, apresentou o projeto que o atelier desenvolveu em conjunto com a ONG RISE International, Lesoto, para a vigésima terceira edição da Trienal de Arquitectura de Milão. “Lesotho Water Realms. An ongoing visual research on geopolitics, society and rituals” dá corpo ao pavilhão do Lesoto e observa o país através das massas de água que atravessam o seu solo, considerando a água como o centro da identidade da terra, visível, mas não acessível a todos. “Lesotho Water Realms: is a visual research on geopolitical scale, society and rituals” based on three dimensional aspects: the landscape, through the infrastructure of the dams; the human, seen from the perspective of access to water and the spiritual, where water is pictured in the sacred Basotho rituals, between the rainfalls and caves.”
Pedro Ignacio Alonso centrou-se na evaporação da água para a extração de lítio no deserto do Atacama refletindo acerca de uma possibilidade de vida neste tipo de território, cada vez mais abundante, num futuro próximo e de que modo é que a arquitetura poderá possibilitar essa vivência, referindo o seu projeto Deserta X. Marina Otero continuou esta reflexão em torno da falta de água que se verifica junto das populações que habitam nas imediações das piscinas de lithium onde diariamente se evaporam quantidades astronómicas de água.
Eglantina Monteiro refere-se a conflitos como “modos de existir e projetar conteúdos” a propósito da situação na faixa territorial compreendida entre Sines e Aljezur que comporta o perímetro de rega do Rio Mira. “A globalização da subtração leva a um desequilíbrio social e ecológico” que se tem vindo a verificar naquela região. Lança assim as bases para o projeto que se encontra a desenvolver em conjunto com o Corpo Atelier.
Estes são apenas algumas das problemáticas abordadas durante esta que foi a primeira Assembleia de Pensamento de Fertile Futures. Dois dias intensos de discussão e reflexão onde se enfatizou a pertinência do contributo da Arquitectura no redesenho do futuro. Foi assim lançada a primeira pedra do projeto Fertile Futurescuja exposição ocupará o Palazzo Franchetti em Veneza durante o período em que decorrerá a Bienal de Arquitectura de Veneza, de 20 de maio a 26 e novembro.