Top

Loló Soldevilla, Parisian Collages from 1953 to 1970 na galeria Rui Freire-Fine Art

Encontra-se patente, na galeria Rui Freire – Fine Art, a exposição Loló Soldevilla, Parisian Collages from 1953 to 1970.

Loló Soldevilla foi uma artista cubana, nascida em 1901, que viveu e trabalhou em Paris entre 1949 e 1956, e onde desenvolveu uma intensa actividade artística.

A exposição, agora patente na galeria Rui Freire, compreende um grupo revelador de obras da artista, unicamente de pendor abstracto, e em que a artista se recorria, como meio de expressão, à técnica de guache e à colagem.

Pode observar-se, com alguma frequência, nas obras presentes nesta exposição, o recurso, pela artista, da rotação de elementos geométricos simples sobre fundo plano, interceptados ou não, por outros elementos, ou ainda seccionados por linhas retas. O mais comum é observar-se formas simples como o quadrado, ou semicírculos, que estabelecem uma trajectória, ao longo do plano, tornada clara, pela cor manifestada.

Essas realizações, sobre a superfície plana, são evocativas de uma ideia de movimento, ou até de um efeito óptico, que pode conduzir o “leitor” a um quadro de referências ou a uma alusão a movimentos artísticos que existiram nesse período em que a artista trabalhou, como a própria Op Art, ou até a arte cinética.

A Op Art, herdeira do construtivismo, ofereceu-nos exemplos, na história das artes visuais, de imagens que testavam a possibilidade de engano dos olhos[1]. Outra particularidade deste movimento era a proximidade com as formas puras e o recurso ao abstracto, tendo em conta a precisão e o rigor absoluto[2].

As colagens de Loló Soldevilla eram precisas, e essa característica, levou a sua obra a ser comentada pelo crítico de arte Roger van Gindertael, em 1955[3], aquando da exposição em que a artista participou, em Paris, com o grupo Herta Wescher (Galeria Arnaud). Gindertael posicionou Loló na categoria dos artistas cujas obras eram dotadas de rigor. Nessa exposição, o grupo Herta Wescher, integrava, igualmente, obras de Victor Vasarely.

A precisão da artista, e o recurso a formas geométricas elementares, bem como o cuidado despendido na escolha das cores, aparentavam remontar ao período da Bauhaus, no sentido que Joseph Albers então lhes atribuía, o da cor enquanto relação, o da cor enquanto “estudo empírico”.

Segundo Rafael DiazCasas[4], em 1953, Loló Soldevilla, dois anos após juntar-se ao atelier d’Art Abstrait, toma consciência da importância da relação que existe entre a forma e a cor[5].

Neste sentido, DiazCasas estabelece comparações entre obras de Loló, como a obra Collage Vellado,1957, e as obras do artista venezuelano, Jesús Rafael Soto, que nessa altura realizava trabalhos em acrílico, como a série Double Transparency[6].

Na verdade, são impressionantes as confluências existentes entre algumas obras destes dois artistas, mesmo manifestando-se uma décalage temporal, sobretudo as obras em guache e grafite, Plástico nº 1, Noches en Caracas, e Untitled, de Loló, que apresentam um parentesco impressionante com as obras realizadas, anos mais tarde, por Soto, como Blanc et Couleur, de 1975, ou Vibration superieure, de 1998.

Loló, durante a sua estadia em Paris, quando trabalhava para a embaixada de Cuba, teve a oportunidade de conviver com artistas de diversas nacionalidades, como George Koskas, Jean Arp, ou John-Franklin Koening, entre outros. Soto foi também um desses artistas[7].

O artista Jesús Rafael Soto desenvolveu trabalhos que, em muitos casos, remeteram para a linguagem da Op Art, mas também para a experiência percetiva do movimento.

As colagens de Loló são evocativas da ideia de movimento. Muitos dos elementos presentes nas suas composições desvelam em estímulos cinéticos. Por exemplo, a obra Homenaje al 26 de Julio, 1954, que é compreendida por uma colagem de pequenos elementos geométricos sobre papel, é reveladora desse princípio. Sobre um fundo branco, quadrangular, a artista posicionou, de forma ritmada, pequenos círculos, obedecendo a uma ordem interna, a uma grelha reticulada, bem definida. O efeito cinético é produzido por via das circunferências serem atravessadas por segmentos de reta, e as mesmas não apresentarem a mesma posição, e serem seccionadas na vertical, ou horizontalmente. Os semicírculos, daí resultantes vão provocando, percetivamente, um efeito de movimento, que ora se agita para a direita, ora se declina para baixo. Não havendo espaço para um consenso, ou até repouso para a vista.

A cor e a luz reforçam essa agitação provocada pelos elementos geométricos.

Loló Soldevilla era uma apreciadora de música clássica, e segundo DiazCasas, tocava piano e violino. A artista interessou-se pela visualização da música através da cor, muito por conta dos estudos que fez de postulados teóricos transmitidos por Wassily Kandinsky[8].

Na obra Homenaje al 26 de Julio, a evidente repetição do ponto, que se traduz em pequenas circunferências, que se estendem ao longo do plano da folha – marcadas pela sua divisão em semicírculos – aludem aos “pontos sonoros”[9] de que Kandinsky faz referência na obra Ponto-Linha-Plano, 1926. Kandinsky demonstra-o traduzindo, e isolando, um excerto da sinfonia de Beethoven, em pontos gráficos.

Este comportamento sincopado, e repetitivo, algo ritmado, dos elementos utilizados pela artista, compreende, de certo modo, aquelas obras que não se pretendem representativas do movimento, mas que, por outro lado, convocam a participação do espectador. Os elementos, eles próprios, encontram-se estáticos. A impressão de movimento é assim concluída, de modo óptico, pelo observador.

A exposição Loló Soldevilla, Parisian Collages from 1953 to 1970, está patente na galeria Rui Freire – Fine Art até 27 de janeiro.

 

 

 

 

 

 

 

[1] Reichardt, J (1994)”Concepts of Modern Art, From Fauvism to Postmodernism”. World of Art. Thames and Hudson.

[2] Ibidem

[3] Segundo Rafael DiazCasas, no catálogo da presente exposição “Loló Soldevilla – Parisian Collages from 1953 to 1970”, págs 8 e 9.

[4] Responsável pelos textos sobre o catálogo da exposição, patente na Galeria Rui Freire

[5] Ibidem, pág.5

[6] Ibidem

[7] Ibidem, pág. 6

[8] Ibidem, pág. 7

[9] Kandinsky, W (2006) “Wassily Kandinsky – Ponto, Linha, Plano”. Edições 70. Pág. 49

Carla Carbone nasceu em Lisboa, 1971. Estudou Desenho no Ar.co e Design de Equipamento na Faculdade de Belas Artes de Lisboa. Completou o Mestrado em Ensino das Artes Visuais. Escreve sobre Design desde 1999, primeiro no Semanário O Independente, depois em edições como o Anuário de Design, revista arq.a, DIF, Parq. Algumas participações em edições como a FRAME, Diário Digital, Wrongwrong, e na coleção de designers portugueses, editada pelo jornal Público. Colaborou com ilustrações para o Fanzine Flanzine e revista Gerador. (fotografia: Eurico Lino Vale)

Subscreva a nossa newsletter!


Aceito a Política de Privacidade

Assine a Umbigo

4 números > €34

(portes incluídos para Portugal)