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Encontros da Imagem 2022: Lugares Comuns

A 32ª edição do Encontros da Imagem: Festival Internacional de Fotografia e Artes Visuais, sob o mote Lugares Comuns, conta com um total de cinquenta exposições, em vinte e seis espaços, entre Braga, Porto, Guimarães, Barcelos e Avintes, mas também conferências, sessões de cinema, projeções, ações de serviço educativo e leituras de portfólio. Através do convite a fotógrafos e a duas chamadas públicas, os projetos expositivos, abrangem noventa e seis artistas nacionais e internacionais, consagrados e emergentes. Permitindo instigar a contemporaneidade com registos fotográficos distintos, ora de teor mais conceptual ou plástico, ora documental, com abordagens que partem desde noções sociopolíticas, até a olhares mais intimistas, em formatos e suportes diversificados, desde os mais convencionais, à imagem em movimento, ao livro de artista, ou aos mupis. Acresce a atribuição de três prémios: o Discovery Awards, com o escopo de premiar segundo o tema da edição; o Emergentes, galardoando os melhores portfólios em fotografia contemporânea; e o Photobook Award EI, premiando livros de autor, de produção relativamente manual e independente.

João Acciaiuoli Catalão, em Lugares Comuns Importam, no catálogo do Encontros da Imagem, assenta: «Lugares comuns importam. Porque são passagens para a perceção de elos ancestrais sagrados. De ritmos individuais e coletivos que constroem lugares de si na paisagem». O artista, curador e programador cultural, evoca a temática do Festival, permitindo questionar o papel da imagem, enquanto meio instigador de noções, por vezes contraditórias, que nos conferem sentidos de pertença, proximidade e comunidade. Através dos projetos expositivos da 32ª edição do Encontros da Imagem, sentimos as diferenças, fricções e reverberações, mas também enlaces, analogias e conexões de olhares. As narrativas, formas e fragmentos, por entre lugares públicos e privados, edificados e naturais, de pensamento e sonho, de corpo e paisagem, potenciam um entendimento das imagens, como lugares comuns, potenciadoras de ligações no nosso tempo.

Na Galeria do Paço-UMINHO, primeiramente, temos a oportunidade de ver a exposição de livros de fotografia dos finalistas a concurso ao Photobook Award 2022. Cada um com uma visão diferente na forma, conteúdo e estética, produzidos de maneira mais ou menos artesanal, demonstrando como este meio é importante para a exibição de um projeto fotográfico. Destacamos os vencedores deste ano: Hiroshima Graph Everlasting Flow de Yoshikatsu Fujii, 4 a.m. de Paul Cupido e Two Thousand Words de Roberto Aguirrezabala.

Ainda no mesmo local é nos apresentado várias exposições, demonstrando o ecletismo do Encontros. Cada artista tem o seu próprio espaço, com uma curadoria de acordo com as intenções, desígnios e perspetivas de cada projeto. Iniciamos o nosso percurso com a série de Sonia Hamza, Bangkok’s Chinatown beats to its own drum, vencedora do 2º Prémio do Discovery Awards 2022. Projeto produzido no contexto de uma estadia de dois meses em Bangkok, onde a artista ficou curiosa com as lojas-casa na área de Chinatown, um microcosmo da humanidade, apresentado através de imagens de uma grande horizontalidade, enquadradas com padrões coloridos, como janelas para um universo particular, onde a vida pública e privada, trabalho e lazer se unem.

De seguida, fazemos uma paragem por um projeto de grande impacto e atualidade, I Peri N’Tera, de Daniel Castro Garcia, um dos fotógrafos convidados, que nos demonstra pelo meio de fotografias, textos e imagens em movimento, os efeitos da migração para Itália desde África, a partir do testemunho dos imigrantes.

Noutra sala deste edifício histórico de Braga, é possível vermos o projeto vencedor do 1º Prémio do Discovery Awards 2022, Unutursan Darilmam [I Won’t Be Upset If You Forget Me] de Ci Demi. O fotógrafo turco, confinado durante meses, devido à pandemia da covid-19, saiu para o exterior captando as imagens possíveis neste contexto, para mais tarde as estudar, editar e classificar, mas também escrever sobre elas, num olhar contemplativo, em que o tempo e a poesia é nos revelado a cada tomada.

No seguimento, The Good Life de Elizabeth Pedinotti Haynes, vencedor do 3º lugar do Discovery Awards 2022, é uma série intimista, em que a artista norte-americana reflete acerca das suas dúvidas, em relação à educação dos filhos, sobretudo num contexto de parentalidade suburbana branca, onde existe a noção de que os rapazes devem ser agressivos e estoicos. Imagens tiradas no espaço doméstico, numa junção entre fotografia e colagem, em que realçamos um autorretrato em que está vestida com múltiplas camisolas, demonstrando de modo perturbador e particular as suas questões.

Por último, Las Flores mueren dos veces de Cristóbal Ascencio, destaca-se pela forma como somos envolvidos no espaço expositivo, em formato blackbox, onde o artista recria uma espécie de altar com fotografias em homenagem ao seu pai, Margarito, jardineiro que faleceu duas vezes. A primeira quando o fotógrafo tinha quinze anos e a segunda com trinta, quando lhe foi dito que o pai se tinha suicidado.

No Museu Nogueira da Silva[1]  somos presenteados com as exposições de dois artistas convidados. Rita Lino, com Replica, onde nos é dada uma nova compreensão do corpo e do modelo, através de imagens, que apesar de nelas constar a artista, apresenta-se enquanto identidade representativa, como escultura, sombra ou movimento. E Lois Cid, com Estruturas de fusión, que recorrendo a técnicas da fotografia documental, torna-as abstratas e poéticas, isolando fragmentos de paisagem, juntamente com as suas esculturas, na tentativa de investigar sobre o modo como a humanidade modifica o território com os materiais que extrai, utiliza e transforma.

No GNRATION[2]  avistamos a exposição de duas artistas do concurso Emergentes 2021. Lena Holzer com A Shadow in the Shape of a House, um retrato em que transparece um ambiente familiar, pelas fotografias captadas numa casa desabitada em frente à habitação de infância da artista, em que vemos objetos de um lugar que outrora teve vida, e que por isso apela à imaginação e às recordações do nosso próprio passado. E Rosa Lacavalla, com Sana Sana, que nos impressiona pela montagem das fotografias impressas em grande escala, no exterior do pátio principal do edifício. Este projeto mostra a jornada e a reflexão da artista acerca da auto cura, pelo meio de autorrepresentações da sua dor física. Sendo que importa ressalvar, que já foram anunciados os vencedores do prémio Emergentes 2022, nomeadamente M’hammed Kilito com Before it’s gone, Victoria Jung com Birds Of Passage e Madelaine Ekserciyan com Mayrig.

Em Braga, ainda é de salientar as exposições: Todos os sítios: braga centro de André Castanho na Galeria da Estação – Encontros da Imagem; We’re not in hell, but very far from heaven de Renato Chorão no Museu dos Biscainhos; Berlin de Diane Meyer no Theatro Circo, e por último as exposições do prémio Emergentes do ano passado no Mosteiro de Tibães.

No Porto, destacamos Roma (La casa grande) de Bernadita Morello na galeria Salut au Monde![3], onde a artista foca-se na relação com a sua mãe, mas também com a sua filha, através de viagens ao lar materno, na cidade de Esquel, na Patagónia argentina. Vemos fragmentos de paisagens e da vida quotidiana familiar, em vários formatos de exibição, em imagens extremamente delicadas, quer pelo conteúdo, como pela forma e enquadramento, nem que seja pelas várias flores e motivos vegetalistas, que povoam a exposição, em homenagem à sua mãe, recordando-nos as nossas próprias memórias de infância. Igualmente, realçamos Blinded de Rico Schwartzberg na Adorna Galeria[4], em que o artista confinado no seu apartamento em Nova Iorque, devido à pandemia da covid-19, fotografa o exterior através das persianas, criando imagens abstratas em formato polaroid, o que lhes confere uma outra materialidade, relembrando-nos os princípios da câmara escura e da fotografia, noções de voyeurismo, ou ainda os icónicos filmes Janela Indiscreta (1954) de Alfred Hitchcock, ou A Vítima do Medo (1960) de Michael Powell. Não descorando a exposição Atlas de Baixa Altitude & Outras Espécies de João Paulo Serafim na The Cave Photography[5].

A Encontros da Imagem – Associação Cultural, entidade organizadora da mostra, com direção de Carlos Fontes, Carla Bacelar Ferreira e Tiago Dias dos Santos, prossegue para além da produção do Festival, a missão de divulgar, valorizar e conservar um espólio com cerca de quatro mil imagens, reunidas ao longo de trinta e dois anos, assim como promover jovens fotógrafos através da Galeria Estação (inaugurada este ano) e a realização de exposições itinerantes fora de Braga, cidade matriz do projeto.

A 32ª edição do Encontros da Imagem: Festival Internacional de Fotografia e Artes Visuais[6] poderá ser visitada até 30 de outubro de 2022.

 

 

 

Notas:

[1] http://www.mns.uminho.pt

[2] https://www.gnration.pt

[3] https://pt.salutaumonde.info

[4] https://www.facebook.com/galeriaadorna/

[5] https://thecavephotography.com

[6] http://encontrosdaimagem.com/2022/

Ana Martins (Porto, 1990) é investigadora doutoranda do i2ADS – Instituto de Investigação em Arte, Design e Sociedade, na qualidade de bolseira da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (2022.12105.BD). Frequenta o Doutoramento em Artes Plásticas da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, tendo concluído o Mestrado em Estudos de Arte – Estudos Museológicos e Curadoriais pela mesma instituição. Licenciada em Cinema pela ESTC do IPL e em Gestão do Património pela ESE do IPP. Foi investigadora no Projeto CHIC – Cooperative Holistic view on Internet Content apoiando na integração de filmes de artista no Plano Nacional de Cinema e na criação de conteúdos para o Catálogo Online de Filmes e Vídeos de Artistas Portugueses da FBAUP. Atualmente, desenvolve o seu projeto de investigação: Arte Cinemática: Instalação e Imagens em Movimento em Portugal (1990-2010), procedendo ao trabalho iniciado em O Cinema Exposto – Entre a Galeria e o Museu: Exposições de Realizadores Portugueses (2001-2020), propondo contribuir para o estudo da instalação com imagens em movimento em Portugal, perspetivando a transferência e incorporação específica de elementos estruturais do cinema nas artes visuais.

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