Top

No tempo da instantaneidade fotográfica: as redes sociais como veículo para a construção de narrativas museológicas

A evolução da arte, da cultura e das dinâmicas sociais ao longo das últimas décadas, surge associada à disseminação das novas tecnologias. A viragem do milénio assistiu à explosão da web e o online transformou-se naquilo que hoje conhecemos como algo dinâmico, rápido, de fácil acesso, low-cost e capaz de estabelecer ligações bilaterais entre utilizadores e instituições museológicas, provocando ações, reações e comportamentos. Contrariando as previsões do início do século XX, que declaravam o carácter obsoleto dos museus face à evolução tecnológica, os museus adotaram a internet como um importante espaço de divulgação de conteúdos e um veículo essencial para a construção de narrativas museológicas.

Em tempos incertos e motivados pelas condições atípicas da pandemia de COVID-19, as instituições abriram portas a uma expansão digital massiva, encontrando novas soluções, métodos e modelos de produzir, consumir e expor arte. Hoje, começam a surgir respostas à questão: Qual o verdadeiro contributo das plataformas digitais para as instituições museológicas? Os museus foram obrigados a responder de forma reativa, direta, simples e tão eficaz quanto possível ao encerramento dos seus espaços físicos, aderindo em massa a atividades interativas partilhadas no espaço digital. Numa altura em que se viram obrigadas a encerrar portas, as instituições abriram caminho a novos meios e ferramentas, contornando os constrangimentos das visitas in situ.

Neste novo contexto social, as redes, alternativas digitais privilegiadas, admitem aos museus captar novos públicos, expandir o raio de ação, criar conteúdos heterogéneos e fundir o espaço físico e digital através da interatividade e participação. Os utilizadores passaram a ser participantes ativos, partilhando conteúdos, experiências e opiniões pessoais e as instituições encontraram nelas uma nova forma de marketing, divulgando coleções, conferências, artigos, vídeos, imagens, concursos gráficos, sondagens e uma infinidade de outros materiais que permitem a construção de significados coletivos através de significados individuais.

No tempo da instantaneidade fotográfica, a linguagem visual é anteposta nos canais digitais. A cultura da imagem desencadeia um envolvimento subjetivo e emocional, possibilitando às instituições compreender, através dos posts dos visitantes, comentários, emojis, descrições ou da própria forma de fotografar o edifício, as motivações da visita do público. É precisamente este processo de partilha que permite avaliar e resumir a forma como a obra arquitetónica é vista pelas audiências, já que em muitos casos surgem opiniões e imagens exclusivas da arquitetura do edifício. A arte liberta-se cada vez mais do espaço físico do museu, disseminando-se nas plataformas digitais e incentivando um ambiente de envolvimento e interatividade constantes. Por outro lado, as audiências digitais respondem mais facilmente a publicações com elementos visuais, adquirindo estes últimos um mediatismo que resulta em perceções distintas, dependendo do observador ou do seu estado de espírito.

Nesta perspetiva, o Instagram é o canal preferencial dos visitantes e das próprias instituições, acompanhando as novas tendências da sociedade contemporânea e reinventando-se ao longo dos anos. Longe do que era habitual, as instituições deixam progressivamente de restringir o uso de câmaras fotográficas nas galerias, passando a permitir fotografias e vídeos e a incentivar a sua divulgação nas plataformas online. Surgem os “museus do Instagram” ou “instagramáveis”, focados na experiência museológica, dando cada vez mais importância às expectativas e opiniões dos públicos através de um contacto mais direto com as audiências.

Com efeito, no panorama atual, a dimensão arquitetónica torna-se necessária na experiência museológica interativa, devendo o museu assumi-la como fator importante na captação e mobilização dos públicos. Em casos como o Museu Guggenheim de Bilbao, projetado por Frank Gehry, o caso nacional do Maat, de Amanda Levette, o edifício opera como motor para a promoção institucional, atraindo visitantes e assumindo o estatuto de obra de arte. As audiências deslocam-se ao local apenas para contemplar o exterior da obra e adquirir uma imagem como prova da visita. Nessa perspetiva, existe uma reinvenção identitária dos museus, que passam a adotar a própria imagem arquitetónica como motor na divulgação online, no próprio marketing da instituição e na construção de narrativas que relacionem a obra com a sociedade. O objetivo é cada vez mais claro: integrar a perspetiva dos públicos nos discursos institucionais, encarando o contentor como símbolo pelo seu caráter visualmente icónico.

O Instagram torna-se, assim, o novo Tamagoshi da sociedade contemporânea, permitindo aos museus expandirem-se para além das suas fronteiras físicas, disseminando a arte e a arquitetura nas plataformas digitais e incentivando um ambiente de envolvimento e interatividade constantes.

Beatriz Monteiro Gamboa nasceu em Caldas da Rainha, em 1998. Estudou Arquitetura no Instituto Superior Técnico. Em 2021 completou a sua Dissertação de Mestrado A arquitetura de museus no tempo das redes sociais: da imagem institucional à apropriação pelos públicos. Escreve sobre museus, arte e arquitetura na Era do Instagramável e do trânsito informativo online infindável.

Subscreva a nossa newsletter!


Aceito a Política de Privacidade

Assine a Umbigo

4 números > €34

(portes incluídos para Portugal)