Rise and Fall de Stuart Ian Frost e Daydreamer de Will Beckers na Quinta do Pisão
Rise and Fall de Stuart Ian Frost e Daydreamer de Will Beckers são as duas intervenções escultóricas alojadas na Quinta do Pisão. Na verdade, não são propriamente novas: a primeira já lá está desde 2018 e a segunda desde 2019 – o que se acrescentou foi uma recontextualização, por exemplo em termos de legenda das obras (agora com uma versão mais inclusiva, em braille), fruto de toda uma nova ação de dinamização e divulgação operada nos últimos anos na Quinta do Pisão.
Esta recontextualização atinge, no entanto, um limite que me leva a questionar uma suposta (ou não) intencionalidade: estou a falar da primeira intervenção, Rise and Fall onde encontramos, agora, a árvore seca que Stuart Ian Frost esculpiu com formas circulares, quase xamânicas, caída no chão, de ramos e tronco cortados. Questiono a intenção, porque o artista terá realizado a obra com a árvore numa posição vertical, natural, e não há qualquer indício ou contextualização desta segunda, misteriosa, ação – talvez à parte do título como uma premonição de tudo o que ascende, cai. Este segundo ato, propositado ou não, concede à obra uma outra leitura, mais dramática, pessimista, e menos contemplativa. No entanto, é capaz de, paradoxalmente, torná-la mais viva que nunca: com a árvore no chão, crianças trepam nos ramos, pessoas sentam-se nela, a escultura torna-se interativa, engajável – de algum modo, atinge uma finalidade vital que os museus não conseguem, que é esse diálogo total, direto, com quem a visita, imperturbando o seu sentido ou conservação, porque ali tudo é natureza, o espaço é um lugar de brincadeira inconsequente, descoberta – a falta de ansiedade que permite a efervescência de ideias, uma felicidade descomprometida.
O que mais me surpreendeu nesta visita foi, sem dúvida, esta capacidade de interação que a despretensão de um espaço natural convoca, colocando as obras fora de qualquer dinâmica de importância ou valor – tornam-se ambiente, aproximam-se de nós, como amigas. Em Daydreamer de Will Beckers, instalação quase camuflada no meio do pinhal, o espaço, construído por galhos dispostos irregularmente, em quantidade, querendo fechar-se à envolvência, abrem-se aos interstícios de luz que penetram nas suas ranhuras, atingindo a sua resolução numa claraboia, como um olho que se dispõe no topo do espaço, permitindo o olhar para o céu e as árvores. Aqui, um ramo de pinheiro entra carinhosamente pela ocular, como que a convidar-nos ao sonho contemplativo idealizado pelo artista.
Voltemos à interação, aqui efetivada de modo diferente: tendo em conta ser um espaço amplo, adaptado à altura humana, que convida a estar, encontramos no chão, por ação dos visitantes, alguns troncos como bancos para sentar. Neles, dispõem-se inclusivamente algumas pedras e galhos – todo o cenário parece evocar a entrada numa caverna primitiva, de tendência recolectora, num impulso que perceciona aquele espaço quase fechado, numa floresta, como uma casa a habitar. Mais interessante ainda é o facto de verificarmos que, depois de abandonarmos o espaço, junto a árvores, encontram-se algumas pequenas cabanas, muito singelas, divertidas, também construídas com galhos, e que parecem ter sido criadas ao modelo de Daydreamer. Se tiverem sido criadas por visitantes ocasionais, frequentadores do parque – quero acreditar que sim, afinal não há legendas ou afirmações em contrário – penso que não será preciso dizer mais nada. O impulso vive, efetiva-se quando não há pressões de o controlar, quando não vemos o outro como mais importante que nós. Constrói-se um lugar utópico, coletivo, ecológico na sua prática e comunhão de saberes: às vezes basta-nos um escape, um sentimento de paz, de estar longe das pressões da cidade, ou da compulsão que nos leva a comprimir o mundo a meia dúzia de ecrãs. Não nos esqueçamos que a arte, quando apresentada e contextualizada de modo acessível, abrangente – de que são exemplo estas duas esculturas – poderá oferecer esse incentivo: ser um veículo para a criação, transformação, aqui expostas, neste dia de sol, com um sorriso infantil no rosto: vestiram-se de sonho e esperança.
Rise and Fall de Stuart Ian Frost e Daydreamer de Will Beckers estão em exposição, permanentemente, na Quinta do Pisão em Cascais.