Água viva, de Hernâni Reis Baptista, na Dentro
Água viva, de Hernâni Reis Baptista, é um ensaio sobre a pele, a fisionomia e a aparência dos corpos animais e vegetais. Por essa via, é um projeto que propõe uma reflexão visual e poética sobre a fronteira que separa estes corpos do ambiente circundante, as porosidades e capilaridades que deixam o exterior escapar para o interior e vice-versa.
O tecido é o medium sobre o qual se imprimem fotografias de texturas vivas e mortas. É sobre ele que se sarapintam manchas de pigmentos como se de maquilhagem se tratasse. É sobre ele que se cravam alfinetes que compõem um atlas fluido e esvoaçante – um arquivo quase erótico de matérias várias, que pedem toque, inspeção aturada, proximidade.
É o tecido, e respetiva aplicação e extrapolação, que conecta este ensaio a uma indagação mais vasta, por ventura social, psicológica, histórica e artística, que é simultaneamente simulação ou encenação de uma psique – o panejamento de um teatro social, mas também individual, a ecdise dos insetos e dos repteis, que mudam ou deixam cair a pele como forma de adaptação ambiental. É o tecido que conecta esta experiência aos congéneres da mitologia ou da história da arte – o artifício de Atenas e de Aracne, ou as abstrações dos panejamentos e das pregas na pintura renascentista e barroca.
Sob os fios e a trama do pano, Reis Baptista fia e desfia a complexidade das relações que informam a vida e a morte, o passado e o presente, a beleza e a fealdade, o mineral e o vegetal – todos esses binómios de difícil, mas indispensável coexistência.
Água viva, de Hernâni Reis Baptista, está patente no espaço na Dentro, até 28 de maio, com texto de Susana Camanho.