Da Forma no Espaço ao Espaço da Forma
Em exibição no CLINK (Centro Comercial Bombarda, Porto) a exposição Daciano da Costa – Da Forma no Espaço ao Espaço da Forma[1], celebra a obra de um dos mais destacados arquitetos e designers portugueses. Prestando tributo à essência holística de Daciano da Costa (1930-2005) a mostra, cuja curadoria é assinada por Le Brimet (Curador e Diretor Criativo) e Susana Chasse (Curadora e Diretora de Arte) em estreita colaboração com o Atelier Daciano da Costa, promove uma reflexão e um reencontro do público com o mestre e a sua obra inovadora na história do design em Portugal.
Mais do que uma retrospectiva de Daciano da Costa, Da Forma no Espaço ao Espaço da Forma reafirma, mediante a rigorosa seleção e apresentação do material em exibição, a importância e o contributo de Daciano no design enquanto disciplina académica e profissional, permitindo-nos uma análise dos seus projetos. De carácter pedagógico a exposição, inédita no Porto e que ocorre vinte um anos após a última retrospectiva de Daciano da Costa na Fundação Calouste Gulbenkian em Lisboa, revela-nos pelo desenho expositivo a preocupação dos curadores em materializar a fisicalidade do pensamento do autor.
Num período de crescente afirmação e legitimação do design português contemporâneo, no qual domina a especialização dos saberes, Da Forma no Espaço ao Espaço da Forma proporciona não só um reencontro com o espírito criativo de Daciano da Costa, mas mais importante com o seu processo de trabalho, a materialização das suas ideias e ideologias criativas imortalizadas em objetos modernistas de diferentes escalas, onde processos industriais/artesanais exploram novas materialidades e funcionalidades.
Um dos aspetos pertinentes com que nos confrontamos ao longo da exposição é a importância atribuída ao processo, desde o pensamento, ao desenho e à sua materialização, trazendo-nos alguém que pensa e vai até ao fim do processo … este fazer do início ao fim que atribui a carga de intemporalidade que Daciano tem[2]. Como que nos conduzindo à génese do pensamento de Daciano da Costa e aos bastidores do seu ato criativo, destaquemos a decisão curatorial em dar-nos a conhecer o exercício quotidiano que está na origem do produto final, estabelecendo um diálogo profícuo entre a obra e a metodologia necessária à sua realização.
A par da cronologia criada para a exposição, através da qual é-nos possível localizar no percurso artístico e profissional de Daciano da Costa a criação de cada uma das peças em exibição no núcleo central, destaquemos o moodboardrevelador da complexidade do processo de cada peça – original ou reeditada – em exibição. A natureza diversa de material reunido – esboços, ilustrações e estudos, desenhos de apresentação, desenhos técnicos em vegetal, diagramas, esquissos e fotografias de época das obras concretizadas – é reveladora da identidade de Daciano, do pensador que desenhava as suas peças e cuja produção acompanhava de forma atenta, tornando visível ao espectador o processo, a procura e os diversos passos no tempo necessários para se chegar à obra final.
Em destaque no núcleo central e em diálogo com o moodboard apresentam-se algumas das icónicas peças da autoria de Daciano da Costa: da reflexão geométrica do autor sobre a forma, visível na mesa e cadeira da linha Quadratura – onde predominam as estruturas lineares metálicas -; ao minimalismo da cadeira Alvor e à modernidade e elegância da cadeira Prestígio de estrutura em aço e estofo em pele; sem esquecer a valorização do processo tradicional e manual, bem como a forte ligação com o artesanato português, de que é testemunho o empalhamento em bunho das Superligeira e a cadeira Palace de inspiração regional. Reveladoras da gramática formal multifacetada e criativa de Daciano, onde a forma segue a função, privilegiando a estética da ética, as obras em exibição revelam-nos um outro aspeto importante do trabalho do seu autor, o do domínio da escala, visível não só nas peças de mobiliário mas também nos acessórios, de que são exemplos a geometria purista das cerâmicas Palace; a irreverência do faqueiro Osaka; o sistema de utensílios de cozinha em esmalte da linha Dona; o purismo das formas nos acessórios de interiores da linha Pedra; o pragmatismo do sistema modelar de estantes Prática e as paletas das tapeçarias Penta. Design para o contexto, feito para o espaço concreto, mas simultaneamente capaz de ultrapassar as premissas iniciais, afirmando-se como obra de design em toda a sua plenitude – Design Total, Intemporal e autêntico.
À revisitação do pensamento e espírito criativo de Daciano da Costa acresce-se a valorização do trabalho pioneiro desenvolvido pelo Atelier Daciano da Costa, liderado pela filha e arquiteta Inês Cottinelli, ao apresentar-nos o Homem enquanto Marca.
Em exibição no CLINK e integrando a exposição, visionamos o documentário realizado por João Filipe Silva e Marcus Amadeus, com direção criativa dos curadores, ao longo do qual Inês Cottinelli evidencia o propósito de comunicar, divulgar, preservar e valorizar a obra de Daciano, dando-a a conhecer ao público e projetando-a a nível nacional e internacional, destacando a aposta numa estratégia de reedição como forma de o comunicar nos dias de hoje.
Organizada e apresentada no CLINK, Da Forma no Espaço ao Espaço da Forma assume-se como uma mostra inédita, em que peças originais e reedições, o documentário, desenhos do autor, fotografias e podcast, revelam-nos a genialidade do criativo que desenhou formas para o espaço arquitetónico, criando espaço na cultura para a afirmação das suas formas.
Da Forma no Espaço ao Espaço da Forma, está patente no CLINK até 28 de maio.
[1] Inaugurada a 19 de fevereiro a exposição estará patente no CLINK até 28 de maio de 2022.
[2] Citação da intervenção da curadora Susana Chasse durante a visita guiada à exposição, no dia 19 de março de 2022.