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Esculturas entre a comédia e o drama: Kostis Velonis na Monitor

Tijolos, pedaços de madeira, gesso, formas em barro, cimento, cerâmica – tudo matérias pobres que compõem as obras do artista grego Kostis Velonis (Athena, 1968), na sua primeira exposição individual em Portugal, na Monitor, em Lisboa.

Slapstick Masonry é o titulo da mostra, desenvolvida de forma a criar uma série de “objetos-sujeitos” cuja identidade pertence ao teatro – ou melhor, àquela forma de “comédia baseada em deliberadas ações desajeitadas e eventos embaraçosos” (slapstick), também conhecida por commedia dell’arte.

Kostis inspira-se em instrumentos que produzem ruídos utilizados ao longo da história do teatro; o artista constrói itens e mecanismos que, impulsionados, simulam uma ação – por exemplo, uma bofetada. Deste modo, as obras transformam-se numa  espécie de ferramentas vivas, de objetos com alma.

Eis que esses artefactos correspondem a uma dupla identidade. Se por um lado têm a forma de esculturas, por outro entrevemos neles os mecanismos que se apresentam por detrás da usa função: os sons e os estrépitos.

Porém, na Monitor, há também uma série de “máquinas celibatárias” deitadas sob o piso da galeria. Aqui, como nas peças teatrais, nem todos os objetos servem à própria função. De facto, muitos deles são descritos por Kostis como “produtos trôpegos”, isto é, são inúteis. Esses tornam visível a frustração e os fracassos que os artistas, atores, escritores enfrentam durante a conceção da obra e durante o percurso da própria carreira.

Kostis põe perante os nossos olhos o resultado metafórico de infinitas “peças rasgadas”, como acontece com Backstage: um balde de plástico cheio até a orla de cimento, fita de papel, tinta e gesso.

A propósito de Backstage, a mostra contém uma outra referência ao mundo do teatro e abertamente declarada pelo artista: “Usei o chão da Monitor come se fosse um palco, uma cenografia”, revela Kostis. Nunca poderia ter feito escolha melhor: os quadrados brancos e vermelhos do piso térreo da Monitor são o proscénio perfeito para representar esta coletânea de objetos que parecem desejar a própria independência, isto é, procuram libertar-se do próprio papel.

Ao aproximarmo-nos das esculturas é preciso observá-las minuciosamente, emprestando tempo à imaginação para as tentar compreender: a todas pertence uma “narrativa instável, fugaz”. Elas são os resultados dum caminho percorrido por um “sonâmbulo cambaleante”.

Embora todos os materiais pareçam coesos, eis o que parece ser uma rachadura: são as esculturas de Kostis – ao mesmo tempo união e divisão; são tudo o que há de certo, tudo o que há de errado no obscuro levantamento da arte. É um antagonismo de vitórias e de derrotas da tensão humana, sempre entre a comédia e o drama.

Slapstick Masonry, de Kostis Velonis, está patente na Monitor – Lisboa, até o dia 19 de março.

Matteo Bergamini é jornalista e crítico de arte. Atualmente é Diretor Responsável da revista italiana exibart.com e colaborador para o semanário D La Repubblica. Além de jornalista, fez a edição e a curadoria de vários livros, entre os quais Un Musée après, do fotógrafo Luca Gilli, Vanilla Edizioni, 2018; Francesca Alinovi (com Veronica Santi), pela editora Postmedia books, 2019; Prisa Mata. Diario Marocchino, editado por Sartoria Editoriale, 2020. O último livro publicado foi L'involuzione del pensiero libero, 2021, também por Postmedia books. Foi curador das exposições Marcella Vanzo. To wake up the living, to wake up the dead, na Fundação Berengo, Veneza, 2019; Luca Gilli, Di-stanze, Museo Diocesano, Milão, 2018; Aldo Runfola, Galeria Michela Rizzo, Veneza, 2018, e co-curador da primeira edição de BienNoLo, a bienal das periferias, 2019, em Milão. Professor convidado em várias Academias das Belas Artes e cursos especializados. Vive e trabalha em Milão, Itália.

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