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Wait in Line de Ian Tweedy, na Galeria Monitor

A Galeria Monitor recebe até 22 de janeiro de 2022 a primeira exposição individual do artista Ian Tweedy em Portugal. Wait in Line reúne um conjunto de catorze obras que nascem sobretudo sobre capas de livros ou fotografias antigas.

Wait in Line evidencia o caráter arquivista de Ian Tweedy, que trabalha sempre sobre imagens com história, já vistas por alguém ou que fazem parte de uma memória coletiva. Ao nível dos nossos olhos e expostas linearmente pelas pequenas paredes da galeria Monitor, as obras são todas de caráter figurativo e obrigam a nossa aproximação. O primeiro momento da exposição é marcado pelos tons monocromáticos das obras Wait in Line (2021), Angels Skeleton (2021) e These Hills Have Folds (2021). Nestes três trabalhos é visível a mão minuciosa de Tweedy, que recorre à sobreposição de elementos e técnicas sempre dentro do pequeno formato. É evidente a história que cada imagem contém, o suporte apresenta sinais da passagem do tempo: as obras pertencem ao passado e ao presente.

Ainda na primeira sala vemos Red Head (2021), que inicia o segundo momento da exposição com a explosão de vermelho e o desenho do único rosto completamente visível que veremos em toda a exposição. Red Head (2021) mostra o retrato de uma mulher, a única protagonista de Tweedy que não opta pelo anonimato, mas que, ainda assim, não nos dá informação sobre a sua identidade. Na segunda sala da Monitor, a explosão de cor acontece. Tweedy desdobra-se entre o azul, o ocre, o vermelho e o negro para desenvolver narrativas sobrepostas que nascem sobre capas de livros antigos. Os mundos que Ian Tweedy pinta, ainda que figurativos, apresentam uma aura fantasmagórica que os liga à abstração, como se existisse apenas silêncio entre os corpos que nos mostra. Algumas figuras das suas composições são meticulosamente detalhadas nos drapeados que vestem e nos tecidos que tapam os seus rostos. Em Blue Tarp (2021) duas pessoas aparecem com o rosto coberto por tecidos e, apesar de não conhecermos a sua identidade, existe algo que os aproxima e que nos faz especular a sua relação. A extensa moldura amarela pintada em redor destas figuras transmite calor a este retrato, fazendo-nos suspeitar da possibilidade de serem familiares. Já Run (2021) mostra a silhueta de três pessoas, onde o negro e o vermelho dominam a composição. Aqui os detalhes desaparecem, as sombras tomam conta da narrativa e a identidade destas pessoas é mais uma vez oculta.

Nos vários trabalhos que Ian Tweedy apresenta, os lugares e ambientes que as suas personagens habitam parecem ser sempre anónimos, despidos de características que os identifiquem, onde as possibilidades para a imaginação são infinitas. Tweedy parece pintar não-lugares habitados por rostos anónimos e cristaliza-os em capas de livros que fizeram parte de uma narrativa com lugares e pessoas concretas. Podemos pensar que as obras de Wait in Line ilustram os não-lugares explicados por Marc Augé: “Se um lugar se pode definir como identitário, relacional e histórico, um espaço que não pode definir-se nem como identitário nem como relacional, nem como histórico definirá um não-lugar.[1]” Neste conjunto de trabalhos, o artista combina o passado com o contemporâneo, e ao sobrepor histórias, vai criar novos espaços e narrativas.

Em Wait in Line, vemos figuras que apesar de partilharem o mesmo espaço parecem estar envolvidas pela solidão. Recorrendo à pintura a óleo e ao desenho, este corpo de trabalhos salientam o interesse do artista pela história que cada imagem e objeto contém, ao mesmo tempo que resgata capas de livros envelhecidas. Mas, ao percorrer a Monitor, há uma questão que permanece: por que razão opta Ian Tweedy por esconder o rosto das pessoas que habitam os lugares e paisagens das suas obras?

Até 22 de janeiro, na Galeria Monitor, em Lisboa.

 

[1] Augé, Marc (1992) Não-Lugares – Introdução a uma antropologia da sobremodernidade. Lisboa: Letra Livre. p.69

Laurinda Branquinho (Portimão, 1996) é licenciada em Arte Multimédia - Audiovisuais pela Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa. Estagiou na Videoteca do Arquivo Municipal de Lisboa onde colaborou com o projeto TRAÇA na digitalização de filmes de família em formato de película. Recentemente terminou a Pós-graduação em Curadoria de Arte na NOVA/FCSH onde fez parte do coletivo de curadores responsáveis pela exposição "Na margem da paisagem vem o mundo" e começou a colaborar com a revista Umbigo.

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