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Angel of Anarchy: Eileen Agar na Whitechapel Gallery

Eileen Agar (Buenos Aires, Argentina, 1899 – Londres, Reino Unido, 1991) foi uma das figuras-chave do surrealismo, movimento onde conturbadamente foi inserida. A Whitechapel Gallery traz-nos Angel of Anarchy, uma exposição retrospetiva da sua vida e obra, reunindo exemplos de pintura, escultura, fotografia, colagem e documentação de arquivo, como cartas e fotografias. A exposição vem trazer um novo olhar sobre o papel de uma artista que, no mínimo, não ocupa os primeiros lugares quando procuramos «surrealismo» nos motores de busca.

Deambulando pela galeria, confirmamos que a carreira de setenta anos de Eileen Agar sumariza os diferentes ismos da história da arte ocidental do início do século XX. Uma coreografia de movimentos artísticos, a sua obra inclui tonalidades de modernismo, visível em The Autobiography of an Embryo (1933-1934), surrealismo, na pintura Quadriga (1935), que fez parte da Exposição Internacional Surrealista de 1936, em Londres, e cubismo, nomeadamente em Movement in Space (1931). A sua obra é também informada pela poesia, pela literatura, pela mitologia e por um forte, embora prematuro, feminismo.

Eileen Agar assumiu um papel relevante no desfazer do preconceito da mulher-musa que posa para o homem-génio. Neste sentido, desenvolveu a teoria womb magic [magia do útero], que ditava a inconsciente soberania do feminino sobre o masculino na arte e na literatura. Em The Modern Muse (1934), a «criatividade» é a sua musa sem género. Muse of Construction (1939) foi pintada a partir de uma fotografia que tirou de Picasso reclinado na praia de Mougins. A última é uma homenagem retorcida ao cubismo de Picasso, geometrizada e plana. Contudo, o que nos fica na memória é a clara crítica ao papel da mulher pela subversão dos estereótipos de género na arte. Em Ladybird (1936), Eileen Agar mostra-nos uma fotografia de si própria, nua, sobre a qual desenha com guache branco, num movimento sensual e desconstrangido, uma vez mais sublinhando e criticando o double-standard de género no que respeita à sexualidade.

Já em tempo de guerra, a artista foi militante da resistência através da moda. Em Video of Agar wearing Ceremonial Hat for Eating Bouilabasse (1948)[1], vemos uma performance surrealista da artista, que caminha pelas ruas usando um chapéu largo de cortiça, amalgamado de búzios, lagostas, estrelas-do-mar e outros objetos perdidos. Agar havia já produzido outro chapéu, em 1936, a que chamou Glove Hat. Para a época, usar no topo da cabeça duas luvas de pele com unhas pintadas coladas nos dedos revela, no mínimo, um enorme sentido de humor. Este chapéu, infelizmente, não fez parte da exposição. Para nós fica, hoje, o exemplo de uma de muitas formas de resistência que ainda não se esgotaram.

Here, Now, o podcast oficial da Whitechapel Gallery, disponível no Spotify, dedicou um episódio a esta exposição, Episode 7: Eileen Agar: Angel of Anarchy, onde as curadoras Laura Smith e Grace Storey convidam a artista Lucy Stein, a poeta Daisy Lafarge e a designer Beca Lipscombe para uma conversa sobre a obra de Agar e a sua relevância para a arte contemporânea. Até 29 de julho, decorrerá também a série de eventos gratuitos online Water/Fluidity, inserida no programa Ways of Knowing: Imagining Other Futures, que se debruça sobre a relação de Eileen Agar com o elemento água.

A não perder: Angel of Anarchy, de Eileen Agar, pode ser visitada na Whitechapel Gallery, em Londres, até 29 de agosto.

 

[1] Video of Agar wearing Ceremonial Hat for Eating Bouilabasse (1948) está disponível online no canal de YouTube da British Pathé através deste link (acedido a 11 de junho de 2021).

Benedita Menezes (1996, Lisboa, Portugal) é uma curadora, investigadora e escritora freelance baseada em Londres. É licenciada em Pintura pela Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa (FBA-UL), Portugal, e Karel de Grote University College, Bélgica, e pós-graduada em Estética e Estudos Artísticos, Arte e Culturas Políticas pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade de Lisboa (FCSH-UNL), Portugal. Está no momento a acabar o Mestrado em Curadoria e Coleções pela Faculdade de Artes e Design de Chelsea da Universidade de Artes de Londres, no Reino Unido. Trabalhou em galerias comerciais, instituições culturais e coleções e é co-fundadora do projeto Broken Phone – we'll meet in objects. (beneditamenezes.com)

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