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Resposta Aberta: Coco Fusco

Resposta Aberta é uma série especial de entrevistas com artistas, curadores, escritores, compositores, mediadores e “fazedores de espaços” internacionais. Atendendo aos temas que rapidamente emergiram como consequência da pandemia de Covid-19, oferecemos, aqui, uma perspetiva diferenciada e honesta de compreensão. Semanalmente, várias serão as portas abertas à vida dos colaboradores e às suas experiências de prazer, produtividade, metafísica e mudanças de paradigmas. Idealmente estas conversas poderão servir de caixas postais e conduzir a uma maior empatia, unidade e cocriação. Resposta Aberta vai ao encontro da necessidade de tecer a autonomia de uma rede de comunicações consciente, em tempos de extrema perplexidade.

Coco Fusco é uma artista e escritora interdisciplinar sediada em Nova Iorque. Recebeu o Prémio Rabkin 2018 na categoria Crítica de Arte, o Prémio Greenfield em 2016, uma Bolsa Cintas 2014, uma Bolsa Guggenheim 2013, o Prémio Absolut Art Writing em 2013, uma Bolsa Fulbright 2013, uma Bolsa US Artists 2012 e o Prémio Herb Alpert 2003 na categoria Artes.

As atuações e vídeos de Fusco estiveram presentes na 56ª Bienal de Veneza, Basel Unlimited, Frieze Special Projects, nas duas Bienais de Whitney (2008 e 1993), no Next Wave Festival da BAM, The Liverpool Biennial, The Sydney Biennale, The Johannesburg Biennale, The Kwangju Biennale, The Shanghai Biennale, Mercosul, VideoBrasil e Performa05. As suas obras foram também expostas no The Musem of Modern Art, The Walker Art Center, KW Institute of Contemporary Art e no Museu de Arte Contemporânea em Barcelona. É representada pela Alexander Gray Associates, em Nova Iorque.

Fusco é autora de English is Broken Here: Notes on Cultural Fusion in the Americas (1995) e The Bodies that Were Not Ours and Other Writings (2001), e A Field Guide for Female Interrogators (2008). É também a editora de Corpus Delecti: Performance Art of the Americas (1999) e Only Skin Deep: Changing Visions of the American Self (2003). O seu último livro Dangerous Moves: Performance and Politics in Cuba foi publicado pela Tate Publications em 2015, e uma tradução espanhola foi editada pela Turner Libros em 2017.

Fusco obteve o seu B.A. em Semiótica pela Universidade de Brown (1982), o seu M.A. em Pensamento e Literatura Moderna pela Universidade de Stanford (1985) e o seu Ph.D. em Arte e Cultura Visual pela Universidade de Middlesex (2007).

 

Josseline Black – Ao refletir sobre este recente período de isolamento forçado, como articula a sua resposta no discurso público? Qual é o seu papel nesta conversa mais ampla?

Coco Fusco – Só fiquei isolada em casa na Primavera. Dei aulas a partir de casa e ocupei-me com a escrita. Passeio muito tempo a escrever e a ver filmes. Também fiz alguma pesquisa de arquivo sobre epidemias e doenças infeciosas ao longo da história, algo bastante interessante. Não mudámos muito na forma como respondemos aos receios sobre mortalidade e morte.

JB – A sua prática artística mudou com o isolamento?

CF – Na verdade, não, embora algumas atividades estejam agora suspensas. Não posso atuar em frente ao público, a menos que isso seja feito através de um computador, obviamente.

JB – Como é que a sua capacidade prática para produzir trabalho foi afetada pela pandemia?

CF – Bom, nos primeiros meses não pude trabalhar presencialmente com algumas pessoas. Desde o verão, tenho conseguido trabalhar com outras.

JB – Qual é a sua abordagem à colaboração neste momento?

CF – Não posso fazer colaborações em larga escala, pois os grandes grupos estão proibidos. Mas fiz algumas pequenas gravações em vídeo e editei outras tantas, tendo cuidado, é claro, com máscaras e afins.

JB – Como definiria o momento presente, metafisicamente/literalmente/simbolicamente?

CF – O início da pandemia foi a parte mais assustadora para mim, enquanto nova-iorquina, já que a cidade foi duramente atingida e o confinamento foi total. Durante semanas, apenas saí de casa para comprar comida. O número de mortes foi aterrador e a sensação de puder ser infetada em qualquer lugar por qualquer pessoa era muito inquietante. Mas a fase inicial terminou em junho. Aprendemos a gerir melhor a situação e o tempo quente permitiu-nos estar muito mais ao ar livre. As restrições diminuíram, foi possível alguma socialização. Cheguei a viajar para o México em agosto, o que foi maravilhoso, apesar de os museus estarem encerrados. A mudança de ares ajudou-me a desanuviar. Passei semanas a pensar em como a cidade estava a gerir a crise e no enorme número de cadáveres. Mas não estava particularmente preocupada comigo, afinal tive o privilégio de poder manter o emprego, trabalhar a partir de casa, e conversar diariamente com o meu filho. Não estava em perigo, nem estava a enfrentar uma situação de despejo ou desemprego.

JB – Identifica potencial para um apoio renovado à produção cultural, apesar das macro e microeconomias estarem atualmente em rápida reestruturação?

CF – Sei que muitas pessoas no mundo da arte ficaram sem trabalho, estando a passar por grandes dificuldades. Sou privilegiada por ainda poder ensinar. É difícil o impacto desta situação no mercado artístico – há menos gente e as feiras foram canceladas. Contudo, as vendas online prosseguiram e algumas galerias foram atrás dos mais ricos até às suas estâncias e abriram galerias nos Hamptons e Catskills. Creio que é demasiado cedo para mensurar os danos económicos nas artes visuais ou aferir durante quanto tempo sentiremos as consequências. Julgo que as artes performativas são mais afetadas do que as artes visuais.

JB – Como é que este período está a influenciar a sua perceção da alteridade no geral?

CF – Não sei se tive a alteridade em conta. É uma ideia demasiado abstrata para me envolver nela. Tenho pensado na mortalidade. Na forma como respondemos à morte. Na história das doenças infeciosas. No fracasso do governo federal americano em gerir a pandemia de forma eficiente e com compaixão. Nas repercussões económicas e no tempo que demorará a reconstruir e a reavivar a economia.

JB – Qual é a sua posição sobre a relação entre catástrofe e solidariedade?

CF – Que catástrofe? Solidariedade em relação ao quê e entre quem? Onde? Quando? É óbvio que a abordagem à pandemia tem sido diferente dependendo do país. Uns com mais sucesso do que outros. Mas não estamos num momento global de cooperação internacional em relação à pandemia ou a qualquer outra coisa. A administração Trump não quis cooperar com país algum.

JB – Qual é agora a sua utopia?

CF – Eu não tenho uma utopia.

Josseline Black é curadora de arte contemporânea, escritora e investigadora. Tem um Mestrado em Time-Based Media da Kunst Universität Linz e uma Licenciatura em Antropologia (com especialização no Cotsen Institute of Archaeology) na University of California, Los Angeles. Desempenhou o papel de curadora residente no programa internacional de residências no Atelierhaus Salzamt (Austria), onde teve o privilégio de trabalhar próximo de artistas impressionantes. Foi responsável pela localização e a direção da presidência do Salzamt no programa artístico de mobilidade da União Europeia CreArt. Como escritora escreveu crítica de exposições e coeditou textos para o Museu Nacional de Arte Contemporânea do Chiado, Madre Museum de Nápoles, para o Museums Quartier Vienna, MUMOK, Galeria Guimarães, Galeria Michaela Stock. É colaboradora teórica habitual na revista de arte contemporânea Droste Effect. Além disso, publicou com a Interartive Malta, OnMaps Tirana, Albânia, e L.A.C.E. (Los Angeles Contemporary Exhibitions). Paralelamente à sua prática curatorial e escrita, tem usado a coreografia como ferramenta de investigação à ontologia do corpo performativo, com um foco nas cartografias tornadas corpo da memória e do espaço público. Desenvolveu investigações em residências do East Ugandan Arts Trust, no Centrum Kultury w Lublinie, na Universidade de Artes de Tirana, Albânia, e no Upper Austrian Architectural Forum. É privilégio seu poder continuar a desenvolver a sua visão enquanto curadora com uma leitura antropológica da produção artística e uma dialética etnológica no trabalho com conteúdos culturais gerados por artistas. Atualmente, está a desenvolver a metodologia que fundamenta uma plataforma transdisciplinar baseada na performance para uma crítica espectral da produção artística.

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