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Um tempo sem medida, de Carlos Mensil

A exposição Um tempo sem medida, de Carlos Mensil está em exibição até 07 de novembro na NO·NO, em Lisboa. Apresentando três obras, o artista explora o uso do movimento enquanto expressão plástica e, como o título evoca, questionamentos acerca da experiência do tempo.

Todas as peças possuem um elemento em comum: o motor. De um lado para o outro, em círculos ou em um caminho circunscrito – algo se move, repetidas vezes, criando diferença ou não. O expectador olha, já sabendo o resultado, porém é de certa forma hipnotizado pela possibilidade de que algo mude, que no piscar dos olhos, no instante vivido no presente, o objeto (que também nos olha) ganhe consciência e crie o seu próprio caminho. Há algo de mágico que lhe sai fora, como o texto de apresentação da Catarina Real sugere. A estrutura por detrás com certeza é máquina, pequenos instrumentos que juntos trabalham com um objetivo apenas: funcionar. Mas a obra de Carlos não está presa na operação máquina-movimento, o seu gesto de modelar o tempo, pois não há movimento sem tempo, abre, ou melhor funda-se uma experiencia eloquente de um tempo vazio.

No primeiro piso da galeria encontramos duas peças em diálogo. A obra Rotina, é composta por uma estrutura retangular e estreita de madeira suspensa e presa ao teto. No teto vemos o motor que cria um balanço, fazendo uma esfera metálica deslizar em contato com a madeira. O seu movimento é delimitado por um imã inserido na estrutura, o que a impede de extrapolar o comprimento da madeira. O título da peça comunica aquilo que vemos, um ir e vir sem fim. Na peça ao lado, No Vazio #4, três círculos são desenhados a partir do movimento de doze imãs, quatro em cada círculo, em uma superfície branca. Novamente o motor define o movimento, porém nesse caso deixa rastro, a repetição cria diferença. O desenho se modifica a cada instante que os imãs se deslocam no espaço. A coreografia em ritornelo expõe um território – o círculo agora é divisão e delimita um espaço, uma fronteira, dentro e fora. O tempo presente, e a memória do passado, coexistem em círculos – um dentro do outro.

A terceira obra, Buraco, instalada nas escadas para o piso inferior, utiliza mais uma vez o motor para produzir um movimento continuo. Nesse caso um elástico desliza entre roldanas, desenhando uma forma geométrica semelhante a balões de fala de bandas desenhadas. O elástico é revestido por tubos de borracha em preto e transparente, o que causa certa confusão no olhar pela ausência e presença de cor em movimento. É como se piscássemos os olhos de forma mais rápida que o normal. Aqui temos a velocidade do olhar do observador e a velocidade do que é observado. No texto de apresentação, Catarina escreve: “por fim, o mais relevante. Compreender os sinais. À luz :: evidências & compreender os sinais. Pelas sombras :: inteligência.” Talvez a compreensão “dos sinais” surja, eventualmente, da combinação exata entre as duas velocidades: a do observador e a da peça observada.

Uma das representações mais comuns do tempo (no ocidente) é a de um tempo cronológico. O termo “cronológico” deriva do grego Khrónos. Khrónos refere-se ao tempo sequencial que pode ser medido, associado ao movimento linear das coisas mundanas, com um princípio e um fim. Em Um tempo sem medida, Carlos utiliza da cinética como um convite a outras possibilidades de perceção do tempo. O que nos oferece é uma experiencia de um presente expandido. Em constante repetição, as obras criam um vácuo entre o passado e o futuro, e por ali – se estivermos atentos – habitamos por um momento.

*A autora escreve em português do Brasil.

Maíra Botelho (1991, Brasil) tem uma formação multidisciplinar dentro dos campos da comunicação visual, artes plásticas, filosofia e performance. Atuou profissionalmente como designer gráfica no Brasil após se licenciar na PUC-MG, tendo ainda estudado Artes Plásticas na Escola Guignard - UEMG e na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. Recentemente concluiu uma Pós-Graduação em Estética - Filosofia na Nova Universidade de Lisboa.

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