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Music for the Weekend #006 — Highly Dub(IO)us

Odeio Reggae!

De vez em quando afirmo isto em alta voz e só tenho de esperar uns segundos pelas reações. Abomino, mesmo. Não aguento, jamais gostei. Nunca fui nem tenciono ir à Jamaica e um dia cheguei a Essaouira de onde fugi duas horas depois de perceber que estava cheio de lojinhas a vender t-ees do Bob Marley. Mas o mais incrível é que adoro Dub. E não é assim tão inacreditável, o Reggae é a música que a Jamaica decidiu tocar a caminho da Etiópia prometida enquanto o Dub é o som que ficou quando essa África, numa compacta nuvem de fumo, enganou-se no destino e aterrou na Lua.

O Dub é o domínio de dois semideuses musicais: o Delay e o Echo, da deformação do tempo através do afastamento dos seus elementos mais importantes e como fórmula foi reutilizada para muito mais do que produzir versões mais “espacióticas” dos originais em causa. É um dos casos em que o template cria um documento novo em si. E é assim que a primeira escolha da M4we desta semana são o Mute Beat, uma brass band japonesa que com toda a mestria aplica as técnicas do Dub aos naipes de sopro. Mais à frente a escolha de BudNubac (projeto de Robin Taylor-Firth, o qual fui acompanhando dos Nightmares on Wax até aos Olive) advém de idêntico critério ao aplicar estes mesmos princípios aos sons cubanos da Salsa, da Guaracha e da Pachanga.

Calcula-se que a origem da palavra está na criação de versões especiais cortadas em acetato para utilização pelos DJs dos sound systems em Kingston, dubplates únicos que mais ninguém tinha. Mas na busca de uma etimologia para a designação encontram-se pistas no uso de vernáculo mais “esquentado” e sexual como por exemplo no título Dub the Pum Pum (este pum pum cantado pelos The Silvertones é calão jamaicano para genitália feminina).

Admirado por punks ao mesmo tempo que por produtores de disco-sound, o Dub não se fica no entanto por esses tempos longínquos, continuando a suscitar legiões de seguidores, como a “escola de Viena” que tanto gozo nos deu a todos pelas mãos habilidosas dos Kruder & Dorfmeister ou dos Tosca. Mesmo por cá houve afiliação ao Dub Club com alguns dos seus sócios honorários incluídos nesta minha escolha, kudos ao Francisco Rebelo, João Gomes e Tiago Santos mas também ao Miguel Guia e Tó Ricciardi e especialmente ao Fernando Nabais pelo projeto Homem Invisível no qual me convidou para vocalizar a versão Dub do tema No Cais do Sodré. Deixo ainda pistas para o que se vai fazendo por paragens que não relacionamos normalmente com o Dub, como o Texas onde o trio Khruangbin decidiu recentemente fazer toda uma nova versão de um LP anterior convidando o produtor jamaicano Scientist.

O que se ouve nesta escolha musical são caleidoscópicas montagens que reapresentam motifs dos originais mas em constante fluxo de mudança e justaposição porque o Dub é música de drums and bass, onde secções rítmicas conjuram uma vastidão espacial onde qualquer outro elemento acaba por brilhar como se fosse uma fulgurante estrela cadente. Façamos por isso uma solene vénia a alguns dos grandes no firmamento do estilo: Lee “Scratch” Perry, Osbourne “King Tubby” Ruddock e Bunny Lee, que imersos num noturno estupor imbuído de álcool isopropílico sempre que o rum acabava, foram os grandes inventores desta verdadeira banda sonora do Afrofuturismo.

Não tenham contratempos este fim de semana.

#staysafe #musicfortheweekend

Amor, paixão, alegria. E outros estados da alma induzidos por sexo, drogas e rock 'n' roll. Dandy, bon vivant e outros anglicismos que não são para aqui chamados. Pai babado, apaixonado inveterado por tudo o que seja de "agora" mas numa profunda mas recatada admiração por tudo o que "já foi". Europeu com raízes asiáticas numa sôfrega vontade de ter, ser e ver todo o mundo. Music was my first love / and it will be my last

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