Kate Newby e Anna Schachinger na galeria Madragoa
A Madragoa abriu a temporada de setembro com duas exposições individuais em simultâneo. Kate Newby e Anna Schachinger ocupam dois espaços expositivos da galeria: Loved like a sunbeam (Kate Newby, Nova Zelândia, 1979) e Desta maneira não (Anna Schachinger, Áustria, 1990) são as primeiras mostras individuais das artistas na galeria Madragoa.
As peças escultóricas de Kate Newby pendem na sua maioria do teto, como pequenos arquipélagos memoriais. Cada peça advém de uma necessidade, e até impulso, de colecionar registos, materiais e fragmentos, que transformam, numa espécie de fósseis fabricados, testemunhos de um passado experienciado em determinado local e momento no tempo. A recolha de vestígios fragmentados é seguida de uma reformulação e recaracterização dos mesmos. Cada elemento recolhido em determinado local, seja vidro, terra, amostra de barro, entre outros, é reconfigurado e modelado até atingir a espessura e forma côncava que se encontra aglomerada nos fios pendentes. A memória de um espaço-tempo é reativada pelo objeto transformado, testemunho de um momento imaterial, que corresponde a uma vivência ancorada ao local de recolha, transformação e cozedura das peças. Estes enredos de catalogação do real dispõem-se no espaço gerando um percurso faseado, aberto e cerrado pela proximidade física entre peças, simultaneamente aludindo ao seu distanciamento temporal, de achado, transformação e realização. As composições de testemunho são aqui reunidas pela primeira vez, fruto de viagens empreendidas de 2016 a 2019, por Nova York, Marfa, Portland, Lyon e Toronto.
Por contraste à memória pessoal suspensa, devices for wonderment (2019), encontra-se no chão e atesta uma ficção de um acontecimento natural, uma onda tempestuosa que depositou a composição desalinhada dos elementos no espaço expositivo. Os minuciosos detalhes de cada elemento compósito das obras, como os sulcos deixados por invólucros de medicamentos e pontuais texturas diversas, obrigam a uma proximidade acrescida com cada peça, uma visão que se torna intimista pelo perscrutar do objeto-experiência.
Desta maneira não, de Anna Schachinger, encontra-se no espaço Encima e é composta por uma série de novas pinturas da artista realizadas em 2019. Em duas salas as obras inundam o espaço com múltiplas sobreposições, cores que enunciam transparências que se transmutam para uma solidez da imagem pela sua vivacidade. Um complemento constante entre a agudez do ambiente e a estanque presença de figuras humanas. Esta série povoada pela distorção e reflexo foi realizada no estúdio da artista com vista para o Lago Millstatt e incorpora em si a presença da água, com matizes e ondulações que remontam ao movimento da mesma.
As tonalidades e formas surgem através da película da água, da fragmentação que esta impõe ao olhar, um contaminar de dois mundos, da superfície, da figura humana e do que pertence às profundezas, fauna e flora em nitidez e ficção. É como habituar os olhos em terra seca a ver como veriam debaixo de água, um primeiro caos aparente domina, seguido de habituação e reavivar por cores explosivas, como os pormenores a vermelho em I want to get to know you (2019).
As exposições estão patentes até 9 de novembro na Madragoa.