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Porto Design Biennale 2019

A primeira edição da Porto Design Biennale marca um acontecimento de grande importância na cena cultural e artística da cidade do Porto. Com curadoria-geral de José Bártolo, esta bienal pretende superar a sua condição bianual e produzir um eco indelével até à sua próxima edição.

Este primeiro momento define-se pelo projeto de mapear os trabalhos dos millennial, também conhecidos como geração Y, propondo refletir sobre a ação deste conjunto de indivíduos num mercado profissional afetado pelas inúmeras e aceleradas mudanças e tensões globais. Nesse quadro encontra-se, por um lado, o domínio do tecnológico dos novos média, das redes sociais de comunicação digital e, por outro lado, as problemáticas políticas, principalmente causadas pelos regimes protoditatoriais das principais potências mundiais e, com igual relevância, a crise ecológica.

A par deste tema tão concreto quanto amplo e multifacetado a programação também ela densa e heterogénea divide-se em três núcleos, Present Tense, Design and Democracy e Design Forum, o que constitui uma estratégia programática que enquadra a linha conceptual escolhida no campo da prática do design. O ponto de partida foi a Galeria Municipal do Porto, espaço onde se encontra Millennials – Design do Novo Milénio, exposição que funciona como preâmbulo para o que demais se desenvolve. Esta primeira mostra foi concebida pelo curador-geral da bienal, que explana ter procurado “analisar a atual configuração disciplinar do design e identificar os processos desenvolvidos pelos designers enquanto forma de reação a transformações emergentes”. Bártolo reforça a importância de explorar as formas e funções do design que foi produzido nas duas primeiras décadas do corrente milénio, bem como as ligações que se estabelecem com as dimensões cultural, social, económica, tecnológica, política e ambiental. Expõe vários projetos que, conjuntamente, resultam numa dinâmica formal, imagética e linguística que estabelece múltiplos discursos e se relaciona com diversas questões, tornando a exposição interessante e cativante para vários públicos. São tais os pontos de vista explorados e exibidos que, ao mesmo tempo, se compreende quão multidisciplinar é a própria prática do design.

Apesar desta primeira exposição ser a mais próxima do tema condutor da bienal, a maioria dos participantes que a integram pertencem, com efeito, à geração milénio. Tal é o caso dos dois jovens curadores suíços Megan Dinius e Michel Charlot que dão uma nova vida ao edifício Artes Mota Galiza, com a mostra Portugal Industrial – Ligações entre o Design e a Indústria. Explicam à Umbigo a importância que é lançar um novo olhar sobre os objetos do comum e de uso quotidiano e evidenciar o trabalho de design neles envolvido. Assim o fazem e, por meio desta mostra e de uma singular ação expositiva de ready-made, dão nova visibilidade e renovados sentidos a várias peças, todas elas concebidas em Portugal.

Um dos principais elementos diferenciadores e notáveis desta bienal portuense é o facto de ter Itália como nação convidada. A colaboração com um país estrangeiro irá repetir-se nas próximas edições, iniciativa que não só internacionaliza o projeto como o dinamiza, trazendo imagens, vozes e expressões que enriquecem as galerias, os artistas, os curadores e o público português. Esta dimensão da programação intitula-se de Território Itália e, contando com vários participantes, é conduzida por Maria Milano. A arquiteta italiana que lecciona na ESAD (Matosinhos) definiu enquanto orientação de trabalho uma geografia crítica, compreendendo o design enquanto disciplina legitimadora das lógicas de produção e consumo. Em conversa com a Umbigo contou que, em Itália, já se encontram inúmeras galerias de arte cujo trabalho exposto é exclusivamente da autoria de designers, os quais, por sua vez, têm enquanto atividade principal, a artística. Assim se relembra o lugar desta área criativa na esfera da arte.

A participação italiana da Bienal irá materializar-se na forma de três exposições e uma conferência distribuídas entre o Ateneu Comercial do Porto, o Palácio das Artes, a cargo de Paolo Deganello, e a Casa do Design de Matosinhos. Destaca-se essa última mostra, Frontiere – Expressões de Design Contemporâneo, comissariada por Lúcio Magri e a própria Maria Milano. Nesta, já não se evidencia o objeto observável mas sim a sua intenção. Como a arquiteta indica, “a mente projeta e a mão faz” e, na Casa do Design, observam-se vários objetos que os designers concebem em desenho, projetam através de novos média e entregam a artesãos para que estes, com processos manuais de produção, procedam à sua construção. A exposição apresenta histórias de designers, empresas, escolas e associações que reagem à realidade pós-milénio. É através de um belo conjunto de fotografias e de vídeos que se estabelece um caráter mais humano e emotivo a uma exposição que, de resto, em semelhança às restantes, é predominantemente material e objetual. Como Lúcio Magri esclarece, tratou-se de explorar de que modo o design se confronta com problemáticas políticas, económicas e culturais, assim o revestindo de uma certa consciência e importância social. O curador ilustra a recente prática do design italiano que, como explica, é indissociável do contexto de tensão e mudanças sociopolíticas que afetam o território e marcam a Europa.

Também em Matosinhos, na Casa da Arquitetura, o caráter social e político acentua-se. Com o título Que Força é Essa – Protesto e Participação Democrática em Portugal: Cartazes Artesanais do Arquivo Ephemere, apresenta-se uma exposição que se divide em três núcleos: Trabalho, Troika e Tudo, Feminismo e Emergência Climática, colocando os assuntos que anuncia em relação e diálogo. Como a curadora Helena Sofia Silva explicou, todos os elementos aqui apresentados foram produzidos, manualmente, em Portugal, no âmbito de diversas manifestações no país. Também é comum a todas as peças o facto de pertencerem ao arquivo do investigador de história social e política contemporânea portuguesa José Pacheco Pereira, que tem vindo a reunir um imenso espólio de sinais de protesto portugueses.

Divulgam-se, também, até dezembro, no Rivoli – Teatro Municipal do Porto, dois ciclos de oficinas, uma conferência performativa e um debate sobre cultura digital. A relação com o ensino faz-se através do Projeto Escolas e dos chamados Satélites que reforçam essa componente do programa.

Da semana inaugural e do programa geral, ficam ainda por referir outras exposições e momentos, cada um desenvolvido e materializado pelos inúmeros curadores, designers e artistas que compõem a programação e a tornam possível, completa e sólida. Cada um dos participantes merece a atenção e a visita do público, para quem a ideia e a concepção do que é o design vai, certamente, alterar-se e ganhar novas imagens, proporções e significados.

A Porto Design Biennale decorre até ao dia 8 de dezembro, em vários espaços e através de múltiplas criações, tão infindavelmente multidisciplinares quanto a própria Arte Contemporânea e os millennial que a compõem.

Constança Babo (Porto, 1992) é doutorada em Arte dos Media e Comunicação pela Universidade Lusófona. Tem como área de investigação as artes dos novos media e a curadoria. É mestre em Estudos Artísticos - Teoria e Crítica de Arte, pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, e licenciada em Artes Visuais – Fotografia, pela Escola Superior Artística do Porto. Tem publicado artigos científicos e textos críticos. Foi research fellow no projeto internacional Beyond Matter, no Zentrum für Kunst und Medien Karlsruhe, e esteve como investigadora na Tallinn University, no projeto MODINA.

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