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Eco | Echo based on a true story de Luís Paulo Costa

Eco implica uma repetição sendo que o elemento repetido não é perfeitamente fiel ao que lhe deu origem. É algo ligeiramente diferente sem no entanto se tornar completamente independente. Tem sempre ressonância naquilo que foi.

Eco | Echo based on a true story é o título da exposição de Luís Paulo Costa, com curadoria de Nicolas de Oliveira e Nicola Oxley, que inaugurou a 15 de Janeiro na galeria Cristina Guerra Contemporary Art em Lisboa.

Luís Paulo Costa trabalha a pintura como eco de algo que já existe. Pinta sobre qualquer coisa que, refere, determina uma necessidade ou uma vontade de a pintar, seja uma imagem ou um objeto. A pintura como uma necessidade por um lado, e por outro lado, como uma forma de tentar compreender melhor as coisas e, no limite, de compreender o mundo.

“Como é que eu vou pintar isto?” é a questão suscitada por essas coisas a que o artista procura responder através do seu trabalho enquanto pintor. Não existe nada de extraordinário na escolha das imagens e dos objetos tomados como ponto de partida para a pintura. São sempre banais, ordinários, imbuídos de uma normalidade quotidiana.

A pintura surge assim como uma reação despoletada por aspetos meramente pictóricos, surge como uma reação àquilo que interessa ao artista pela sua qualidade pictórica. As imagens e os objetos deixam de ser imagens e objetos, e passam a ser pinturas sem no entanto serem completamente autónomas da imagem ou do objeto inicial.

Isto pressupõe um olhar a priori, um olhar de pintor sobre uma imagem, que difere de um olhar de fotografo, apesar de ser também um olhar condicionado por se tratar de um olhar pictórico. A fotografia é assim, para Luís Paulo Costa, vista como uma imagem e encarada como um meio para a pintura e não como algo finalizado.

Entrando no campo da pintura, após escolhidas, as imagens são trabalhadas no sentido em que deixam de ser um enquadramento para passarem a ser composição. O artista retira qualidade às imagens acentuando a sua crueza para depois as imprimir sobre tela e constituir um ponto de partida para a pintura, no seu sentido físico. Seguidamente, com tinta, vai progressivamente tapando a imagem inicial.

A pintura funciona assim como uma pele que procura mostrar uma coisa aparentemente nova em termos de imagem e completamente nova em termos de propriedade. Luís Paulo Costa afirma que “depois da pintura estar concluída, reconheço por memória o que estava lá antes, mas as questões que são levantadas para mim são completamente distintas daquelas que eram antes de ser pintura. Reconheço o que estava lá antes mas com uma estatura diferenciada.”

A ideia de eco é levada a outro nível especificamente nesta exposição, uma vez que pela primeira vez o artista apresenta trabalhos em que pinta sobre o plano da tela imagens que resultam de fotografias de objetos pintados por ele próprio. São portanto pinturas sobre a imagem de uma pintura. “Existe uma mesa que serve de suporte para uma série de objetos pintados, nomeadamente um conjunto de bocados de carvão que estão pintados por cima, umas luvas brancas e um molho de espargos. E estes objetos depois de terminados, depois de serem pinturas, assumindo uma realidade diferente, são usados como matriz, como referência, para fazer pinturas deles depois de serem imagens das pinturas que eles são.”

Trata-se de um processo por camadas, um constante revisitar do mesmo objeto que remete, para as narrativas mise en abysme, encontradas no cinema, na literatura ou na própria pintura. Comummente traduzidas como “narrativas em abismo”, tratam-se de narrativas que contêm outras narrativas dentro de si, como se de um espelho infinito que não sabe como parar se tratassem, parafraseando o texto que acompanha a exposição.

Para além das questões que se prendem com a ideia de eco, existem outras, também relacionadas com o domínio da disciplina da pintura e presentes no trabalho de Luís Paulo Costa, que se prendem com o subtítulo da exposição based on a true story. O artista apropria-se de imagens que não são completamente esclarecedoras e que são portanto indicadoras de algo que não está lá. Manifesta assim um interesse por um princípio de representação.

Pegando no exemplo das caixas de cartão pintadas à semelhança delas próprias apresentadas em Composition (Carpet) e que são novamente pintadas sobre o plano bidimensional da tela em based on a true story a partir de imagens das caixas que já constituíam pinturas em si, é visível um interesse naquilo que a própria caixa representa, quer esteja fechada e portanto concluída, finalizada ou em transito ou aberta e portanto não finalizada, que se encontra a meio de alguma coisa.

A realidade da imagem da caixa de cartão constitui-se como uma pintura e portanto como uma outra realidade indiciada pela própria representação da caixa. Uma lógica semelhante é encontrada na pintura Looking down, onde está representada uma rapariga a olhar para baixo, motivando o público a pensar que ela está a olhar para algo que está fora de campo em relação ao plano da pintura, alargando-o, ainda que não no seu sentido físico. Isto faz com que a imagem não se feche sobre ela própria.

“Quando olho para uma imagem é tão importante aquilo que eu vejo como aquilo que funciona como um indício a partir daquilo que eu vejo e que me permite, às apalpadelas, entrar num território onde o visível não é muito claro e eventualmente até a fazer conjeturas.”

Este sentido periférico descentralizador da representação da pintura que alarga o seu plano para lá dos seus limites físicos está muito presente no trabalho de Luís Paulo Costa. As suas pinturas constituem fragmentos que podem indicar hipoteticamente um todo, mas um todo que não é evidente, que é construído na mente do espetador.

Apesar das pinturas em si, enquanto objetos reais, se afirmarem como objetos pictóricos, remetem para coisas que não estão na totalidade convocadas no plano da imagem pictórica, induzem a algo que está para além desse mesmo plano. A peça Sete igual a um é um bom exemplo para o ilustrar, uma vez que uma única peça é apresentada em sete elementos.

As sete pinturas são fragmentos de uma única feita sobre um detalhe de céu fotografado pelo artista. Não satisfeito com o todo que constituiu o resultado, Luís Paulo Costa optou por cortar a tela aos bocados, sendo que desses bocados aproveitou sete. Sete fragmentos de uma totalidade que já era um fragmento de outra totalidade maior.

A sala onde são colocados estes fragmentos é intencionalmente a que se localiza no nível mais baixo da galeria e é a única em que as paredes são pintadas num tom diferente do branco. Optou-se por acentuar o carácter físico, de presença, da parede enquanto obstáculo, e não apenas como suporte.

Assim, é sugerida uma tensão entre o elemento etéreo, em limite, onírico, do céu no interior das várias molduras, e o peso das paredes cinzentas perante as quais as coisas assumem maior gravidade e o nível baixo onde as pinturas são expostas. Aquilo que poderá ser convocado a partir da representação configurada nas pinturas entra aqui em contradição.

Pinturas que são repetições de uma determinada imagem ou objeto, repetições não fidedignas mas indissociáveis do que lhes deu origem à semelhança do eco produzido a partir da emissão de um som. Pinturas baseadas em histórias verídicas mas que não constituem narrativas. Histórias que, em limite, serão as construídas por cada um a partir da experiência que advém da observação das peças de Luís Paulo Costa. Um trabalho sobre pintura, que assenta sobre um questionar acerca da disciplina e de uma experimentação sobre as várias dimensões que a constituem.

A exposição Eco | Echo based on a true story de Luís Paulo Costa poderá ser vista na galeria Cristina Guerra Contemporary Art até 16 de Fevereiro.

Joana Duarte (Lisboa, 1988), arquiteta e curadora, vive e trabalha em Lisboa. Concluiu o mestrado integrado em arquitetura na Faculdade de Arquitetura da Universidade de Lisboa em 2011, frequentou a Technical University of Eindhoven na Holanda e efetuou o estágio profissional em Xangai, China. Colaborou com vários arquitetos e artistas nacionais e internacionais desenvolvendo uma prática entre arquitetura e arte. Em 2018, funda atelier próprio, conclui a pós-graduação em curadoria de arte na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e começa a colaborar com a revista Umbigo.

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