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Acheron de Ana Izabel Miranda Rodrigues e Polpa de José Taborda

A Galeria Graça Brandão apresenta duas exposições que não têm qualquer ligação a não ser uma espécie de possível comparação entre dois artistas com grande diferença de experiência e de idade: Ana Izabel Miranda Rodrigues e José Taborda. Podemos ver Acheron de Ana Izabel Rodrigues no piso 1 e Polpa de José Taborda no piso 0. É um pouco como entrar num local calmo e contemplativo, quase meditativo, com as pinturas e os desenhos de Ana Izabel e descermos depois para a ousadia e inquietação artística de Taborda.

Acheron é o nome de um rio da Grécia, que na antiguidade se acreditava estar ligado ao mundo inferior; é também o nome do deus que comanda esse rio e o lago da dor (claro que há toda uma mitologia por trás desta crença que envolve castigos dos deuses gregos). É importante esta ligação, pois as obras de Ana Izabel remetem para um negrume que não nos transporta para tempestades ou marés-vivas, mas sim para um lugar distante e escondido, que até pode ser interior.

Nesta exposição podemos ver desenhos de pequenos formatos, e pinturas de grande dimensão. Nos desenhos, a maioria intitulados Naufrágio, pequenas linhas a tinta da china, ocupam toda a folha branca, numa mancha que tanto pode ser um mar revolto que nos puxa, como uma espécie de escrita primordial que não conseguimos decifrar. As pinturas têm a mesma lógica, mas o negrume é muito maior, pois as linhas funcionam como uma espécie de gravação em baixo-relevo negro sobre fundo da mesma cor. Em Acheron é o trabalho da mão sobre a tela ou papel e a textura da tinta que apreciamos e onde nos perdemos. As telas, sobretudo, são uma ode à pintura não-figurativa.

José Taborda tem 24 anos e o mundo pela frente. Polpa reflete uma certa inquietação artística e uma vontade de experimentação que extravasa o campo das artes plásticas. As suas obras não permitem ao visitante a contemplação conseguida em Acheron, mas exigem intervenção e curiosidade. Há ainda uma versatilidade na utilização de materiais e suportes que é muito característica da arte contemporânea.

Algumas das obras expostas exigem a nossa intervenção como: Sem Título em que um aquário redondo com um líquido, assente numa moldura em suspensão sobre um ecrã com luz branca, nos mostra uma enguia que só vemos se olharmos através do aquário; Retrovisor, tem o mesmo dispositivo, mas recorre a um espelho retrovisor para nos mostrar uma viagem de carro projetada no monitor; Realidade 2, consiste num monitor sem som que exibe um vídeo com um martelo pneumático a funcionar e uma ventoinha que tem um copo preso em vez de pás, e que a espaços se liga fazendo um som e cadência semelhante ao martelo pneumático.

Projecto 103, não exigindo do espectador o mesmo nível de interação, ainda assim, consegue surpreender: uma imagem edílica é desconstruída por uma espécie de pontilhismo até ser apenas um conjunto de pequenos pontos, para voltar a construir-se pelo mesmo sistema até uma imagem de cadáveres numa rua.

Todas estas obras de Taborda procuram surpreender-nos e entusiasmar-nos, uma vez que só existem quando as procuramos: a imagem no espelho retrovisor ou a enguia no aquário. Há uma componente quase cenográfica na forma como pega em objetos e imagens reais e os transforma como se lhes desse uma nova vida através de magia.

No piso 1 Ana Izabel Miranda Rodrigues acalma-nos e guia-nos para um outro tempo, no piso 0 José Taborda sobressalta-nos e diverte-nos. Duas formas diferentes de encarar a fruição artística, ambas essenciais na sua significação de liberdade artística.

Com uma carreira em produção de cinema com mais de 10 anos, Bárbara Valentina tem trabalhado como produtora executiva, produzindo e desenvolvendo vários documentários e filmes de ficção para diversas produtoras entre as quais David & Golias, Terratreme e Leopardo Filmes. Atualmente ocupa o cargo de coordenação de pós-produção na Walla Collective e colabora como diretora de produção e responsável pelo desenvolvimento de projectos na David & Golias, entre outros. É igualmente professora na ETIC, no curso de Cinema e Televisão do HND – Higher National Diploma. Começou a escrever artigos para diferentes revistas em 2002. Escreveu para a revista Media XXI e em 2003 começou a sua colaboração com a revista Umbigo. Além desta, escreveu também para a Time Out Lisboa e é crítica de arte na ArteCapital. Em 2010 terminou a pós-graduação em História da Arte.

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