Uma obra na ARCOlisboa 2018
Re Cordum. Voltar ao Coração 5 (2014) é uma obra do artista português Vasco Araújo, exposta na ARCOlisboa 2018, no stand da galeria Horrach Moya.
Cinco bustos africanos representam a voz coletiva de um continente esquecido, votado à insignificância pelo ocidente. No outro lado, afastada da turba negra, uma reprodução da Vénus de Milo olha de lado, altiva, na sua brancura – a arrogância do classicismo ocidental. É um diálogo que o artista propõe e o desmascaramento da cegueira antropológica europeia.
Mas esta é uma obra que se faz de esculturas e som. Aproximamo-nos e temos acesso às vozes que animam cada peça. O coro africano reza: “Nós somos a voz plural. Não há diferenças nas nossas palavras.” O olhar ocidental objetifica: “Mas as vossas peles não coincidem.” E diz ao que vem: “Estou à procura de um lugar.” Depois, o coro conclui: “O amor é uma história. Que se conta. E nós não temos história.”
Mediante esta composição essencial e o texto de José Maria Vieira Mendes, “Retrato”, Vasco Araújo coloca-nos na posição do colonizado, do indivíduo que não pode ser individual e está destinado (pelo ocidente, pelo homem, pela História) à subcondição humana.
Num país de colonizadores, cuja propriedade da palavra devia envergonhar-nos, Portugal debate agora e tardiamente a construção da sua História e revê um certo etnocentrismo imperial europeu que, por seu lado, o obriga a reposicionar-se ao lado de outras vozes globais. A história de um país opressor e violento deve ser expressa como tal, sem obliterar o outro deste discurso e, sobretudo, sem o rebaixar, apoucar, na sua existência individual e humana. Neste contexto, Re Cordum é uma obra fundamental que dá corpo à voz emudecida.