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“O Céu é um Grande Espaço” em Serralves. Exposição de Arte Povera de Marisa Merz

Não deixem de passar por Serralves para se deliciarem com as obras do trabalho de vanguarda da artista italiana Marisa Merz (n.1926, Turim), a primeira apresentação da retrospetiva itinerante a acontecer na Europa e que seguirá para o Museu de Arte Moderna de Salzburgo, na Áustria.

Segundo a curadora, este museu com o desenho do projeto da autoria do Arquiteto Siza Vieira possui a arquitetura adequada para receber esta exposição. Existe um enquadramento belíssimo, num total despojamento quase perfeito do edifício com as suas peças.

Marisa Merz alcançou o reconhecimento internacional através do seu talento e como membro do círculo de artistas associados ao movimento da Arte Povera (que se traduz por arte pobre) no final da década de 60, numa reação às correntes artísticas da pop-americana e do minimalismo. Trata-se da única figura feminina do Grupo daquele período histórico a integrar o movimento, rompendo assim, até ao seu limite, com as convenções estipuladas.

Recorre sobretudo a materiais não tradicionais, sem qualquer regra ou cartilha, fora dos cânones do seu tempo, rejeitando a riqueza destes, atribuindo desta forma, valor aos materiais delicados mais frágeis quanto à sua consistência desprovidos de riqueza, dando por isso importância aos materiais sem valor.

Na presente mostra foi reunido um conjunto de obras em pintura, escultura e instalação, num período que cobre meio século de trabalho (1966-2016) com registos de uma linguagem profundamente pessoal. As suas instalações caracterizam-se por conciliar a intimidade com peças de uma escala forte e poderosa, ao ponto de por vezes assustar a própria filha quando era pequena.

De entre a sua vasta obra, salienta-se a escultura Living Sculpture de 1966, uma das mais antigas e emblemáticas, formada por um emaranhado de alumínio modelado suspenso no teto e nela expandido o conceito de mobile, numa acertada combinação no plano formal, entre as arestas metálicas afiadas e ásperas e os contornos suaves e biomórficos.

No final dos anos 70, realizou uma série singular que ficou conhecida por pequenas cabeças em barro não cozido, toscamente pintadas, feitas na sua cozinha da casa de Turim, a qual transformou num ateliê onde o seu lema principal permanece num diálogo entre a vida e a arte.

É de mencionar também a utilização da técnica de objetos em arame tricotado como no caso dos sapatos concebidos de fio de nylon que eram usados pela própria artista. Observa-se igualmente a criação de um baloiço em contraplacado que fez para a filha, aliando o rigor geométrico construtivista da escultura à respetiva funcionalidade.

A tridimensionalidade tornou-se mais intensamente presente nos últimos anos de produção da sua prática artística. A figuração humana, sobretudo a da mulher, passou a estar cada vez mais presente, quer seja nos registos de desenhos, quer nas esculturas.

Interseção entre a arte e a vida, tão central à prática contemporânea

A artista, com uma carreira estimulante, dizia que não existia nenhuma barreira que dividisse a sua vida do trabalho, e esse aspeto é revelador nas instalações que realizou, aproveitando ao seu limite extremo os materiais que tinha em casa para a inspiração, numa referência permanente ao seu quotidiano.

Merz posiciona-se assim no “cruzamento entre a arte e a vida que se tornou tão central à prática contemporânea”, resume em síntese Connie Butler, do Hammer Museum, em Los Angeles, uma das duas curadoras da exposição em parceria com Ian Alteveer do Metropolitan Museum of Art de Nova Iorque.

O corpus da sua obra é evocativa, desafiadora e original, debruçando-se tanto numa resposta à sua própria experiência como na área da história da arte pela vasta influência da sua obra; jogando numa atmosfera contemporânea de Turim e da Itália Pós-Guerra.

Para finalizar, João Ribas (atual Diretor do Museu de Serralves) acrescenta que “às vezes, é nas gerações mais velhas que encontramos o verdadeiro vanguardismo”.

Manuela Synek é colaboradora da revista Umbigo há mais de dez anos. À medida que os anos vão passando, identifica-se cada vez mais com este projeto consistente, em constante mudança, inovador, arrojado e coerente na sua linha editorial. É Historiadora e Crítica de Arte. Diplomada pelo Instituto Superior de Carreiras Artísticas de Paris em Crítica de Arte e Estética. Licenciada em Estética pela Universidade de Paris I - Panthéon – Sorbonne. Possui o "Curso de Pós-Graduação em História da Arte, vertente Arte Contemporânea", pela Universidade Nova de Lisboa. É autora de livros sobre autores na área das Artes Plásticas. Tem participado em Colóquios como Conferencista ligados ao Património Artístico; Pintura; Escultura e Desenho em Universidades; Escolas Superiores e Autarquias. Ultimamente especializou-se na temática da Arte Pública e Espaço Urbano, com a análise dos trabalhos artísticos onde tem feito Comunicações. Escreve para a revista Umbigo sobre a obra de artistas na área das artes visuais que figuram no campo expositivo fazendo também a divulgação de valores emergentes portugueses com novos suportes desde a instalação, à fotografia e ao vídeo, onde o corpo surge nas suas variadas vertentes, levantando questões pertinentes.

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