Hospes hic bene manebis, hic summum bonum voluptas est*
*Transcrição da frase de entrada para o Jardim de Epicuro, de acordo com Séneca. Da tradução inglesa: “Forasteiro, aqui farás tu bem em delongares-te; aqui o nosso maior bem é prazer” (tradução livre).
O jardim sempre ocupou um lugar importante mas discreto na cultura das civilizações e tem sido motor de trabalho de muitos pensadores, artistas e escritores. Da antiguidade clássica é conhecido o jardim de Epicuro, uma espécie de prolongamento, ou substituição, da academia. A deambulação peripatética entre as plantas e uma natureza controlada constituía não só motivo de deleite, mas também fonte de pensamento, numa busca imersiva – e radical – no cosmos. O jardim era, portanto, a concretização da filosofia epicurista, o refúgio para as coisas boas da vida, o isolamento contra qualquer tipo de alteridade.
A história dos jardins conta-nos, justamente, que para lá das qualidades estéticas, estes lugares são espaços de introspeção, solidão e cogitação. E se é certo que pode significar uma tentativa de aproximação entre homem e natureza, também, e alternativamente, não se pode deixar de entender o jardim como uma espécie de atitude tirânica do homem perante a natureza, de dominá-la e subjugá-la aos seus grandes, obscuros e interiores desígnios.
A exposição Gardens, de Luís Silveirinha, percorre vários dos caminhos, significações e significados do Jardim, focando-se principalmente no misticismo, espiritualidade e assombro destes lugares. As obras em guache preto sobre cartão conferem uma vaga semelhança a ilustrações botânicas e motivos vegetais, que se contorcem ao ponto de se abstratizarem. No final, há uma impressão, mais que uma concretização clara de formas. Está-se perante um jardim mental, de imagens sobrepostas, entre o vegetal e o animal. As pinturas são a abertura a todo um cosmos (kósmos) que os jardins comportam, uma ordem, uma harmonia em terra, “um espaço em que a interioridade se transforma em mundo, e onde o mundo se interioriza”, como referido no texto de apresentação.
Para ver na Galeria Diferença, até 27 de janeiro.