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Portugal em Flagrante

Coleção Moderna sempre à vista de todos nós

Desde março que ficou concluído o ciclo do núcleo expositivo da Coleção Moderna do Museu Gulbenkian. A nave central ficou preenchida com a Operação 3 dedicada à área da escultura, de objetos, instalações, filmes e outros suportes. A diretora utilizou um processo metodológico semelhante às restantes duas mostras inauguradas anteriormente com o mesmo título genérico (uma diz respeito à documentação arquivística e à pintura). Possuem um caráter semi-permanente onde é reduzido o aspeto temporário, não sendo assim tão dinâmica como anteriormente, verificando-se no seu conjunto a grande extensão temporal, tendo a vantagem de se poder observar a produção artística ao longo dos tempos numa abrangência alargada.

Escultura Clássica

O espaço do antigo CAM está assim muito diferente onde acolheu exposições antológicas de uma seleção de peças agrupadas por temas, adquirindo a expressão de um outro olhar, com novas valências nacionais e internacionais. Nesta exposição existem obras que foram cedidas pela ESBAL e pelo Museu do Chiado e ainda outras provenientes da Coleção do Fundador. Estamos na presença de uma abordagem cronológica e disciplinar com os momentos mais marcantes da história social e política, a começar pela estatuária oitocentista e monumentos públicos do Estado Novo dividida em capítulos com enfoque no modernismo, no surrealismo, nas ruturas dos anos 60/70; nas décadas de 80/90 e terminando no Século XXI num envolvimento do universo contemporâneo, oferecendo um discurso sobre a história da escultura. “É uma maneira de comunicar mais abertamente sobre a relação entre as estruturas políticas, a arte e o movimento dos artistas, cá e no exterior”.

Da panóplia de trabalhos surgem a título experimental, esculturas de parede, exemplares tridimensionais de artistas que os associamos à pintura. Um dos pontos a reter consiste na inserção de peças de autores internacionais estando lado a lado com os nacionais, estabelecendo ligações e afinidades artísticas entre eles porque os criadores portugueses não trabalham isoladamente. No final da exposição deparamos-nos com duas das mais recentes aquisições do museu: uma instalação em memória da bomba de Napalm de Miguel Palma e da autora brasileira Lúcia Nogueira. Penelope Curtis lembra que a grande maioria destas obras expostas do Portugal em Flagrante estavam escondidas, aparecendo raramente em exposições temporárias. A ideia é mostrar mais abertamente aquilo que se encontrava encoberto durante largos anos.

Adoro a Coleção do Fundador, foi um dos motivos porque me candidatei

Aliás, um dos objetivos principais é relevar mais intensamente o acervo da Coleção da Fundação Gulbenkian, estando sempre à vista de todos nós, mostrar os diálogos entre as duas coleções, compreender o seu alcance e a sua variedade. Ela deseja demonstrar que o espólio reunido pelo fundador permanece e permite continuar a inquietar-nos. Curtis gosta da contaminação entre a arte antiga e a contemporânea, e fala delas como uma oportunidade e um desafio, porque permite entrar na Coleção do Fundador, sem alterá-la demasiado e até poder repensá-la. Trata-se de um desafio estando consciente do risco de forçar um diálogo com o presente. “O truque é estarmos atentos às ligações que já lá estão”. Sou da opinião que as esculturas dos tempos mais recuados não convivem bem na mesma área expositiva com obras contemporâneas, sobretudo quando nos defrontamos com o trabalho específico da instalação escultórica. Parece-me tratar-se de um gesto ousado tanto no plano histórico em períodos distintos como no discurso plástico e estético. São momentos por excelência dificilmente conciliáveis, por possuírem discursos quase diria antagónicos se não mesmo contraditórios.

A escultura deu lugar a linguagens que se afastaram desta disciplina. A partir do surgimento da instalação, constata-se o total afastamento do monumento onde o conceito por si só começa a ganhar forma ao ponto de tomar conta do discurso estético e plástico. A partir do Séc. XX, a arte contemporânea enveredou por caminhos exigentes dada a complexidade das propostas que não se compadecem com leituras tradicionais. Assim, o campo da estatuária faz parte de uma iconografia de um dado período histórico onde as obras convivem mal com as peças de vanguarda; não estando em causa o critério rigoroso utilizado na seleção das peças que têm um valor indiscutivelmente qualitativo. A diretora assume essas leituras contrastantes com frontalidade ao ponto de abrir a exposição com a imagem geminada de peças existentes no jardim (a do Gulbenkian de Leopoldo de Almeida e o memorial a Azeredo Perdigão de Cabrita Reis).

Até 18 de novembro de 2017

Manuela Synek é colaboradora da revista Umbigo há mais de dez anos. À medida que os anos vão passando, identifica-se cada vez mais com este projeto consistente, em constante mudança, inovador, arrojado e coerente na sua linha editorial. É Historiadora e Crítica de Arte. Diplomada pelo Instituto Superior de Carreiras Artísticas de Paris em Crítica de Arte e Estética. Licenciada em Estética pela Universidade de Paris I - Panthéon – Sorbonne. Possui o "Curso de Pós-Graduação em História da Arte, vertente Arte Contemporânea", pela Universidade Nova de Lisboa. É autora de livros sobre autores na área das Artes Plásticas. Tem participado em Colóquios como Conferencista ligados ao Património Artístico; Pintura; Escultura e Desenho em Universidades; Escolas Superiores e Autarquias. Ultimamente especializou-se na temática da Arte Pública e Espaço Urbano, com a análise dos trabalhos artísticos onde tem feito Comunicações. Escreve para a revista Umbigo sobre a obra de artistas na área das artes visuais que figuram no campo expositivo fazendo também a divulgação de valores emergentes portugueses com novos suportes desde a instalação, à fotografia e ao vídeo, onde o corpo surge nas suas variadas vertentes, levantando questões pertinentes.

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