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Residência Artística Rural, na Arménia

Lilit Stepanyan foi pioneira na criação de uma residência artística rural que consiste em passar por duas pequenas localidades que contrastam com a agitação e iluminação néon de Yerevan (Capital da Arménia): Talin (com cerca de 8.000 habitantes), onde se encontra uma catedral construída no século VII; e Byurakan (com cerca de 300 habitantes), que possui o Observatório fundado por iniciativa de Victor Ambartsumian, em 1946.

Sendo um dos artistas internacionais nesta residência, tive a possibilidade de desenvolver um documentário sobre estas localidades e uma performance-instalação em Byurakan no dia 29 de setembro – um Playground Florestal intersetado num dos espaços comuns de uma escola pública.

Todos os artistas desenvolveram também o seu projeto, incluindo uma exposição a partir de fotografias de Yannick Wende (alemão), uma instalação sonora de Jeans Masimov (sueco, residente em Glasgow) e uma instalação no espaço público a partir de um mosaico pixelizado de Siranush Aghajanyan (arménia).

Em paralelo foram desenvolvidos workshops com crianças e adolescentes, com velhos e novos media: expressão dramática, expressão plástica, fotografia e captação sonora – várias formas de expressão artística que desbloqueavam os problemas de comunicação tendo em conta os constrangimentos criados por “línguas” diferentes. O desenho do alfabeto Arménio é também bastante peculiar.

Em Talin, Khachatryan Gayane, (tradutora arménio-inglês) apresentou-nos uma escola de música que contava neste momento com uma associação que pretendia ajudar e angariar fundos para a requalificação da mesma. O empenho de todos os professores, pais e motivação de cada aluno era fascinante. Nesta escola aprendiam a tocar vários instrumentos, entre os quais o Santur – típico da Arménia.

Como país que se encontra num processo de abertura de mentalidades e de valorização dos seus habitantes, desde as suas tradições artísticas a projetos de agricultura biológica, a Arménia contém resquícios do ex-regime soviético (onde em toda as localidades, mesmo as mais pequenas, existe centro um centro cultural). De notar que foi o primeiro país no mundo a adotar o cristianismo como religião oficial.

A Umbigo Magazine falou com Lilit Stepanyan (Coordenadora da Today Art Iniciative – organização sediada em Yerevan). Lilit que trabalha no ramo da arte contemporânea com projetos locais e internacionais realça a importância destes intercâmbios culturais através destas residências que até então estavam praticamente concentradas em Yerevan. Realça as diferenças pós-revolução ocorrida no ano passado.

“Sinto que há muitas diferenças: finalmente o país começou a respirar, sentimos a forma como a população começa a ter mais poder e a sociedade civil é agora quem toma as decisões. Ao mesmo tempo, sinto que a corrupção e o monopólio estão a desaparecer lentamente. O que é ainda visível no espectro cultural e artístico”, refere.

Jens Masimov, com ascendência arménia, frisa que “as oportunidades de te espores à arte e à cultura não devem depender de onde nasces ou se tens dinheiro. E acho que se inspiramos alguém a encontrar o caminho de e para a arte… é fantástico!”. Jeans Masimov é um artista que mistura vários tipos de media, trabalhando com distorção ritualística.

Yannicke Wende refere-se a estas residências como locais onde pode expandir a sua mentalidade achando, “que as áreas rurais ganham muito com estes programas, pois muitas pessoas bem conectadas das áreas rurais, especialmente da geração mais jovem, têm a oportunidade de entrar em contato comigo para discutir, refletir valores e participar em oficinas e em processos criativos comuns.”

Quase perto do final desta residência a Umbigo Magazine conversou também com Susanna Gyulamiryan, curadora deste ano do Pavilhão Arménio da Bienal de Arte de Veneza. Ativista, feminista que estabeleceu uma residência artística internacional em Yerevan (desde 2007/2008), questiona e procura perceber os problemas que a arte contemporânea tem nas relações de mercado e interessa-se questões feministas e de género na produção artística de mulheres arménias. É especialista em filologia russa e formada pela Universidade Pública de Yerevan.

Por último, Susanna Gyulamiryan relata-nos que “a noção de ‘área rural’ se refere àqueles tipos de topografias que geralmente são descritas como não-lugares com elogios ao seu statu quo menos desenvolvido, mero avançado ou atrasado. Quando falamos sobre políticas culturais da Arménia, há indubitavelmente hierarquizações e uma grande lacuna entre a capital e outras grandes ou pequenas cidades, vilas do país. Portanto, quaisquer tentativas e esforços para desconstruir e desmantelar o domínio da capital em áreas subordinadas “periféricas” são parte integrante do trabalho inovador nas políticas culturais do país. O certo zelo em desmerecer essa ordem hierárquica, o trabalho da chamada descentralização e criação de uma rede horizontal de infraestruturas artísticas nas regiões do país, mesmo que ainda não tenha sido realizado tão amplamente, são procedimentos muito importantes de melhoria dos campos culturais, especialmente quando o país se encontra em situação de contexto marginalizado de práticas artísticas experimentais não tradicionais. Só posso avaliar positivamente o trabalho e a recente iniciativa da jovem curadora Lilit Stepanyan, ansiosa por estabelecer e desenvolver o programa de residência artística em Yerevan, capital da Arménia, que ainda é o local de grandes conglomerados de eventos e iniciativas artísticas.”

 

Por Pedro Sousa Loureiro

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